TSE detecta 18 mil doadores ilegais nas eleições de 2006
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Repasses feitos para candidatos por financiadores irregulares somaram R$ 328 milhões
Serão chamadas para dar explicações 13,7 mil pessoas físicas e 4.600 empresas, que podem ter de pagar multas e impostos sonegados
ALAN GRIPP
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Investigação inédita do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e da Receita Federal descobriu que 18,3 mil empresas e pessoas físicas fizeram doações de campanha ilegais aos candidatos a deputado, senador, governador e presidente da República nas eleições de 2006.
É a primeira vez que o Fisco analisa o conjunto de contribuições de uma eleição, a pedido da Justiça Eleitoral. O resultado surpreendeu os dois órgãos: os doadores flagrados cometendo irregularidades representam 13,3% do total. Esses financiadores doaram R$ 328 milhões aos candidatos. No entanto, dentro desse valor, pode haver repasses que estão de acordo com a lei.
A Receita flagrou empresas que, apesar de doarem grandes quantias, estavam desativadas ou declararam ter obtido lucro zero no ano anterior (2005). Entre as pessoas físicas, há contribuintes que se declararam isentos do pagamento de Imposto de Renda mas fizeram doações que desmentem essa situação. Outros nem sequer entregaram a declaração.
Guardada a sete chaves até agora, a investigação resultará nos próximos meses em milhares de ações de cobrança judicial de valores movimentados indevidamente. Serão chamadas para prestar explicações 13,7 mil pessoas físicas e 4.600 empresas, segundo resultado da apuração obtido pela Folha.
Além da cobrança do imposto sonegado, a Lei Eleitoral prevê multa de cinco a dez vezes o valor doado ilegalmente. O Ministério Público também pode apurar eventuais práticas de crime. As revelações reforçam a suspeita de que, em alguns casos, doações possam ter servido como um meio de "esquentar" dinheiro obtido de forma ilícita.
Entre os doadores implicados, há candidatos que fizeram doações irregulares às próprias campanhas. Os nomes, porém, são mantidos sob sigilo, sob o argumento de que dados fiscais dos contribuintes devem permanecer em segredo. Há quem discorde. "Eu entendo que tudo o que diz respeito a eleição não pode ter sigilo. As doações são públicas", diz o ex-ministro do TSE Fernando Neves.
Sob suspeita
A cooperação entre o TSE e a Receita teve início em 2005, quando o ex-presidente do tribunal Carlos Veloso propôs um convênio com o Fisco. "O resultado é surpreendente. Tenho certeza de que, daqui para frente, o assunto [doações] será tratado com mais seriedade por doadores e candidatos."
Num primeiro momento, o foco da apuração são os doadores, e não as campanhas. A Justiça Eleitoral entende que os candidatos não podem ser responsabilizados pelo desrespeito à lei cometido pelos financiadores, salvo em casos especiais, como os dos candidatos que fizeram doações a si mesmo. "Essas campanhas estão sob suspeita", diz Veloso.
Nos próximos dias, o presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto, enviará ofícios aos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) solicitando abertura de procedimentos individuais. Esses processos correrão nos Estados onde os doadores citados têm domicílio fiscal.
Depois de serem citados, os financiadores farão suas defesas. Os processos podem ser revertidos, por exemplo, nos casos em que os contribuintes apresentaram declarações retificadoras de IR. Mas se os argumentos não convencerem os juízes, eles serão processados com base na Lei Eleitoral.
Além dos doadores que fizeram repasses incompatíveis com seus rendimentos, a Receita encontrou diversos casos de financiadores que ultrapassaram os limites impostos pela lei. Pessoas jurídicas podem doar, no máximo, 2% da receita bruta do ano anterior. Já as pessoas físicas estão limitadas a doar 10% dos rendimentos do ano anterior.