Reforma tributária: o que ainda se pode esperar do governo
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Luiz Roberto Peroba
Passados mais de seis meses do início do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, novamente nos vemos às voltas com o debate em torno da necessidade de serem realizadas reformas importantes na Constituição Federal e na legislação do país, entre elas a reforma do sistema tributário. Em meio às críticas e aos comentários sobre o sistema tributário atual, existem dois pontos de consenso. O primeiro deles é a elevada carga tributária, em comparação a outros países com economias similares, agregada ao pequeno retorno propiciado em questões fundamentais como saúde, educação, infra-estrutura e saneamento. O segundo é a complexidade das atuais regras responsáveis pela sensação generalizada de insegurança aos investimentos no país.
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Ocorre que, muito embora o próprio governo federal reconheça a necessidade de resolver as questões mencionadas acima com urgência, até mesmo para permitir ao país um maior acesso à economia globalizada, teme em concordar com mudanças que possam pôr em risco o atual patamar de arrecadação de tributos. Os representantes da área econômica do governo advogam que tais receitas são imprescindíveis, neste momento, para a manutenção do funcionamento da máquina governamental e para a saúde financeira do país. Entretanto, também não se vê um esforço claramente organizado para alterar o cenário atual e reduzir gastos.
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O principal objetivo da reforma pretendida pelo governo federal é a alteração da legislação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e, se possível, do Imposto Sobre Serviços (ISS). A idéia seria "federalizá-los" com o objetivo de criar um imposto nacional, com legislação uniforme e poucas alíquotas – no máximo cinco. O propósito seria a simplificação do sistema, além de propiciar o fim da guerra fiscal travada pelos Estados e municípios, questão que nem mesmo o Poder Judiciário conseguiu resolver.
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Os últimos governantes sofreram duras críticas por não terem promovido as reformas necessárias para que o país pudesse definitivamente encontrar o caminho de um desenvolvimento mais acelerado. Estes se justificam ao dizer que fizeram o que foi possível com a prorrogação da cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e da desvinculação de receitas da União. O discurso da reforma possível reflete a falta de uma verdadeira intenção do governo de mudar o sistema atual, ficando na confortável posição de preservar os altos níveis de arrecadação federal.
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É preciso uma mudança comportamental para que o governo consiga levar à frente uma verdadeira reforma tributária |
Por outro lado, vemos que a Secretaria da Receita Federal segue cada vez mais agressiva no que tange à elevação do nível de arrecadação tributária, buscando editar regras sem qualquer fundamento, para desconstituir atos jurídicos praticados de maneira legítima, cobrar tributos por declarações e lançamentos automáticos, pressionar os tribunais administrativos a proferirem decisões de acordo com atos da administração e questioná-las quando proferidas a favor dos contribuintes e editar anistias e programas de recuperação fiscal com regras tão complexas que não permitem a qualquer contribuinte acompanhá-las e cumpri-las. Não se verifica, no entanto, qualquer tentativa de oferecer ao cidadão um tratamento com atenção e respeito. Não existe, atualmente, uma forma organizada e eficaz de atendimento ao contribuinte, situação que os obriga a acionar a já emperrada máquina do Judiciário para resolver questões simples.
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Além disso, o governo federal, pelo menos nos últimos 20 anos, passou a concentrar a arrecadação tributária do país por meio da infeliz descoberta das contribuições sociais que, por regra constitucional, não precisam ser repartidas com os Estados e os municípios, como ocorre com os impostos. O governo tem se mostrado inflexível com relação aos pleitos dos Estados e dos municípios, como, por exemplo, a repartição de receitas adicionais de tributos federais e a desvinculação de receitas como ocorre em nível federal.
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Assim, há um efetivo receio de que qualquer outra mudança vá agravar ainda mais tal situação. Por isso, tanto Estados como municípios têm se posicionado de maneira contrária a qualquer alteração substancial, como a reforma pretendida pelo governo federal. Eles temem abrir mão da atual competência para legislar e cobrar seus impostos com receio de verem violados a sua autonomia e o pacto federativo.
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Como se viu, o cenário de confiança é muito adverso. O governo não conta, para promover a reforma pretendida, com o apoio da maioria dos governadores de Estado, prefeitos e nem da sociedade. Várias foram as propostas encaminhadas ao Congresso Nacional nos últimos 12 anos para a realização da reforma do sistema tributário. Entretanto, o alto nível de arrecadação que o sistema atual produz, combinado com as várias visões acima, impede o avanço de uma reforma estrutural.
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Hoje, o discurso da reforma possível se repete. O presidente Lula, no início do ano, mais uma vez se reuniu com prefeitos e governadores sem alcançar soluções e propostas concretas. Muito embora o governo tenha consciência que são necessárias reformas no atual sistema constitucional brasileiro, teme apoiar mudanças que, de alguma forma, possam por em risco o atual nível de arrecadação dos tributos federais. É necessária uma mudança comportamental para que o governo efetivamente consiga levar à frente uma verdadeira reforma tributária. Há que se ampliar a transparência nas relações com os contribuintes e com os demais entes federativos. Antes disso, pensar em uma efetiva reforma tributária que reduza a carga e simplifique o sistema é uma utopia.
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Luiz Roberto Peroba é advogado e sócio da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados |
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