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Receita Federal em marcha lenta

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Órgão responsável pela arrecadação de tributos perde eficiência após reformulação feita pela secretária Lina Viera, que vem sendo apontada como a responsável por aparelhamento político do órgão

 

Ricardo Allan
Da equipe do Correio

 

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Cadu Gomes/CB/D.A Press – 31/7/08
Lina Vieira, secretária da Receita, e Mantega, ministro da Fazenda: Reestruturação do fisco federal pode ter parâmetros vinculados ao PT
 

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As mudanças nos principais cargos da Receita Federal feitas pela nova secretária, Lina Vieira, mergulharam o órgão na lentidão. Segundo funcionários graduados, a modorra que vem se instalando nos gabinetes das autoridades tributárias tem relação direta com o recente aparelhamento da instituição. Desde que tomou posse, em julho de 2008, Lina vem entregando as superintendências regionais e várias delegacias estaduais a sindicalistas estreitamente ligados ao PT. De acordo com diversos ex-dirigentes e atuais ocupantes de postos-chave ouvidos pelo Correio, o resultado tem sido catastrófico. Eles garantem que, no ano passado, o volume de autuações a empresas e pessoas físicas suspeitas de sonegação não foi muito além da metade dos R$ 108 bilhões obtidos em 2007.

Esses mesmos privilegiados membros da estrutura asseguram que, por pressão do grupo sindicalista que subiu ao poder, Lina suspendeu o planejamento central para as ações de fiscalização, sob o argumento velado de que os fiscais não precisam de diretrizes de Brasília para saber o que devem fazer. Sem metas a cumprir, os fiscais teriam afrouxado os nós das gravatas. “O planejamento gerou sucessivos recordes na recuperação de créditos tributários, o que ajudou a arrecadação a crescer nos últimos anos. Toda organização precisa de comando. A falta de diretrizes, deixando as coisas correrem soltas, só favorece a quem sonega”, afirma um importante membro da cúpula.

Plano abandonado
Todos os anos, por volta de outubro, a Receita anunciava suas prioridades para a fiscalização no ano seguinte. Quando Lina tomou posse, o plano de 2008 foi abandonado no meio do caminho. Além disso, uma proposta de programação para este ano, que já estava pronta, foi arquivada. Procurada pelo Correio, a Receita designou o coordenador de Fiscalização, Marcelo Fisch, para tratar oficialmente do assunto. Segundo ele, a elaboração do planejamento foi suspensa por causa de mudanças legislativas, como a súmula vinculante editada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em junho reduzindo o prazo de prescrição para a cobrança de contribuições sociais e a medida provisória das filantrópicas.

“O novo planejamento deve estar pronto no fim do mês”, prevê. Segundo ele, a secretaria ainda não decidiu se a programação será divulgada, como nos anos anteriores, ou se será de conhecimento apenas dos auditores. O coordenador alegou que os números da fiscalização no ano passado ainda estão sendo consolidados. Por isso, não seria possível falar em volume de autuações no momento. Pessoas importantes dentro da Receita dizem, entretanto, que os dados estão prontos e não foram divulgados até agora por receio da repercussão negativa. “Os fiscais estão trabalhando normalmente”, assegura Fisch, que será substituído no cargo ainda neste mês.

O auditor Pedro Delarue, atual presidente do sindicato da categoria (Unafisco), tem suas dúvidas. “Não dá para fazer uma avaliação mais acurada sem ver os números. Mas, se o volume de autuações caiu mesmo, isso é um forte indicativo de que a eficiência do trabalho está diminuindo”, afirma. Defendendo a categoria, Delarue garante que os fiscais continuam a fazer operações diárias, apesar da falta de planejamento central. Segundo ele, a Receita divulgou um comunicado pedindo sugestões dos fiscais para as prioridades neste ano. Além disso, editou a Portaria 2.521, no dia 31 de dezembro, com parâmetros de faturamento para as empresas que serão acompanhadas mais de perto.

Impacto no cofre
Segundo um ocupante de cargo estratégico na gestão passada, o recolhimento mensal de impostos também já começou a sofrer. Sem titubear, ele conta que a arrecadação de novembro foi R$ 3,6 bilhões menor do que as estimativas internas apontavam. O auditor afirma que essa queda não tem nada a ver com a redução de 2,13% nas receitas divulgada pelo secretário-adjunto Otacílio Cartaxo na entrevista mensal sobre o assunto. “A Receita só anuncia o resultado em relação ao mês anterior ou ao mesmo mês do ano anterior, não em relação ao que o Tesouro Nacional esperava que entrasse nos cofres públicos no mês. Em novembro, houve queda em todos esses parâmetros”, diz.

Cartaxo atribuiu a retração em relação a novembro de 2007 ao alto nível de recolhimento naquele mês, quando houve a abertura de capital de companhias e a lucratividade de importantes setores da economia estava em alta. Além disso, na explicação oficial, as receitas já começaram a sofrer com o desaquecimento provocado pela crise internacional. Para um outro graduado funcionário da Receita, entretanto, a explicação não serve. Por um motivo: o apurado com a Cofins e o PIS, contribuições sociais que medem melhor o nível de atividade, cresceu 3,77% e 4,18% respectivamente. Esse destacado funcionário da Receita relaciona a diferença de R$ 3,6 bilhões às mudanças na estrutura.

Fiscalização frouxa
“As grandes empresas ficam atentas a qualquer mínimo sinal da Receita. Elas já perceberam que a fiscalização está mais frouxa. Por isso, estão diminuindo os recolhimentos”, diz. Para provar sua tese, ele saca os números do pagamento do IR da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), tributos que dependem da declaração dos contribuintes. Enquanto PIS e Cofins subiram, o IRPJ caiu 28,05% e a CSLL, 9,70% em novembro. O fiscal adverte que este ano será mesmo mais difícil por causa da crise. Se a Receita não der um sinal duro de que a fiscalização será intensificada, os prejuízos para os cofres da União serão ainda maiores, alerta.
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–>Loteamento de cargos
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Escolhida pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para substituir Jorge Rachid, Lina Vieira tem dado preferência a sindicalistas ligados ao PT no momento de preencher os principais cargos (veja quadro). Dos 10 atuais superintendentes regionais, apenas dois são remanescentes da equipe antiga, mas um deles deve ser trocado em breve.

Dos oito indicados pela secretária, sete tiveram cargos ou são fortemente ligados à administração anterior do Unafisco, adversária da atual, que a derrotou nas eleições sindicais de 2007. Todos são ou militantes de carteirinha do PT ou fortes entusiastas do partido. O outro superintendente foi uma indicação da Associação Nacional dos Auditores Fiscais (Anfip).

Além das superintendências, as delegacias estaduais e as inspetorias estão sendo ocupadas — a crucial Delegacia Especial de Instituições Financeiras, em São Paulo, está nas mãos de um membro da administração anterior do Unafisco, a ex-diretora Clair Maria Hickman. “A Receita está passando pelo maior aparelhamento político de sua história. O árduo trabalho feito nos últimos 15 anos para despolitizar o órgão e ocupar os cargos por méritos técnicos foi por água abaixo”, diz um dos nomes que mais possuíam poder na Receita na gestão de Rachid. Segundo ele, quem mais manda no órgão hoje é o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Machado, militante do PT.

O funcionário afirma que, pouco a pouco, o ministério está fazendo o que os sindicatos pediram e não levaram. Como exemplo, ele cita a recente portaria estabelecendo uma espécie de eleição para o cargo de delegado. Na sua avaliação, a medida aumenta a possibilidade de atuação partidária dentro de um órgão.

Critérios
O presidente do Unafisco, Pedro Delarue, acredita que as eleições vão legitimar as escolhas feitas pelo grupo político que dominou as superintendências. “É uma mostra da pseudodemocracia que tomou conta da Receita”, diz.

O subsecretário de Gestão Corporativa da Receita, Odilon Neves Júnior, garante que se trata de uma interpretação errônea da nova política de ocupação dos cargos. Segundo ele, as vagas serão preenchidas de acordo com um processo de seleção que levará em conta três critérios: o histórico profissional, a formação acadêmica e uma avaliação cruzada dos auditores. Nessa avaliação, cada auditor poderá apontar cinco nomes de destaque. Os cinco interessados mais bem avaliados e com melhor pontuação nos outros quesitos apresentarão um plano de trabalho para Lina Vieira. Dessa lista quíntupla, a secretária escolherá o nome vencedor.

“Isso não é eleição. É um processo objetivo de seleção de talentos privilegiando o mérito”, diz Neves. As explicações não convencem alguns servidores. Tampouco tranquilizam os partidos de oposição, que se preocupam com um eventual uso político. “É claro que a Receita vai tomar decisões políticas, o que pode dar ensejo à perseguição e à chantagem. Estaremos alertas”, afirma o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA). Lina está de férias e Cartaxo se recusou a responder as acusações de aparelhamento. (RA)