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Perdas recordes desafiam gestão de empresas

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Aracruz teve prejuízo maior do que as vendas anuais, enquanto Braskem e Sadia valem menos em Bolsa do que têm em caixa

Para analistas, aberrações contábeis mostram que as companhias devem investir em sistemas internos de controles de risco e gestão

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Empresas brasileiras com ações em Bolsa tiveram um prejuízo recorde de R$ 11,718 bilhões no último trimestre do ano passado, que desafiam as atuais práticas de controle e gestão empresarial. Segundo estudo da consultoria Economática, tiveram prejuízo 118 de 325 empresas que divulgaram resultados financeiros do quarto trimestre de 2008.

Trata-se da pior temporada de perdas para esse período pelo menos desde 1999, ano da desvalorização do real e quando foi iniciado o levantamento. Supera prejuízos de R$ 4,934 bilhões do quarto trimestre de 2001 (11 de Setembro e o estouro da bolha da internet) e de R$ 4,873 bilhões do último trimestre de 2002 (eleição do presidente Lula). Em comum, todos tiveram forte variação cambial. A Economática corrigiu os dados históricos pelo IPCA.

A produtora de papel e celulose Aracruz, por exemplo, conseguiu ter perdas de R$ 4,213 bilhões no ano em que todas as suas vendas somaram R$ 3,696 bilhões. É como se a empresa tivesse perdido tudo o que produziu e ainda ficasse devendo.

No caso, o problema decorreu do hedge (proteção) cambial mal calculado pelo departamento financeiro e que passou também pelo crivo da controladoria interna. "O prejuízo de uma atividade não-essencial [financeira] superou todo o ganho da principal atividade da empresa. É impossível? Não, tanto que aconteceu. Mas é um resultado absolutamente anormal, é a exceção da exceção da exceção da regra", disse Alexsandro Broedel, professor de contabilidade da USP.

O mesmo aconteceu com MMX e LLX, respectivamente empresas de mineração e logística do empresário Eike Batista, além do parque de diversões Hopi Hari e a agência de turismo Invest Tur (veja quadro).

Empresas como a petroquímica Braskem, a alimentícia Sadia, a sucroalcooleira Cosan, a elétrica MPX, a têxtil Coteminas e o frigorífico Minerva, entre outros, estão com valor de mercado na Bolsa inferior ao próprio dinheiro que tinham disponível em caixa no final de 2008 -se fossem hipoteticamente compradas, o novo dono poderia pegar o dinheiro delas no banco, cobrir o valor desembolsado e ainda sobrava.

A única ressalva é quanto ao endividamento de curto prazo dessas empresas, que pode consumir grande parte desse caixa. "Quando você compra uma empresa, não leva só o caixa, mas também as dívidas. O ideal é comparar a avaliação do mercado [na Bolsa] com o patrimônio líquido, que é quanto ela vale para o seu acionista", disse Sérgio Machado, professor de contabilidade do Ibmec-SP.

No caso da Braskem, o caixa era de R$ 2,95 bilhões -acima dos R$ 2,57 bilhões do valor de mercado. Já o patrimônio líquido estava em R$ 3,68 bilhões.

Distribuição de prejuízo
Com os prejuízos registrados por essas empresas, afirmam especialistas, perdem todos os segmentos da sociedade: o governo deixa de arrecadar Imposto de Renda (para essas companhias não houve ganhos); os acionistas não embolsam dividendos (e ainda perdem com a desvalorização das ações); funcionários de diferentes escalões deixam de receber bônus e participação nos lucros e correm o risco de perder o emprego; credores têm de elevar as provisões para devedores duvidosos (aumentou o risco de inadimplência).

"O que assusta é o tamanho da destruição de riqueza. A sociedade ficou mais pobre. Todos perdem", avalia Machado.

As perdas das empresas brasileiras decorreram basicamente de três fatores: alta da dívida em moeda estrangeira (o dólar subiu 31,9% no ano), operações desastrosas de proteção cambial (só Aracruz, Sadia e Braskem tiveram perdas financeiras de R$ 9,264 bilhões) e, mais recentemente, queda nas vendas. "A variação cambial pode ser revertida; mas a queda na atividade econômica apenas começou", diz Machado.

"Chama a atenção a falta de sistemas internos de controles adequados [para impedir perdas]. Normalmente, os controles são muito bons na atividade operacional, não no financeiro. Essas empresas tiveram uma perda tão grande que podia comprometer a sua continuidade; tanto que tiveram de fazer acordo com os credores. A falta de controle interno coloca em risco a continuidade dessas companhias", disse Broedel.