Para reforçar o caixa, capitais miram IPTU e nota eletrônica
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Finanças públicas: Crescimento do setor imobiliário leva prefeituras a efetuar o reajuste do valor dos imóveis
Após o aperto no orçamento municipal de 2009 – decorrente da queda da atividade e do menor repasse de recursos federais e estaduais -, as prefeituras das maiores capitais do país planejam um 2010 mais folgado e buscam alternativas para reforçar o caixa. São Paulo e Belo Horizonte estudam uma recomposição do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), enquanto outras capitais, como Rio e Curitiba, se espelham em experiências bem-sucedidas e pretendem incrementar as receitas com o Imposto sobre Serviços (ISS) pela adoção da nota fiscal eletrônica.
O forte crescimento do mercado imobiliário nos últimos anos (movimento pouco afetado pela crise) levou as administrações de São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre a promover um recálculo do valor dos imóveis. Belo Horizonte já decidiu incluir essa recomposição nos valores de IPTU a serem cobrados em 2010. A expectativa é que São Paulo faça o mesmo, corrigindo a Planta Genérica de Valores (PGV) para entrar em vigor em 2010, ainda que o projeto de lei orçamentária enviada à Câmara Municipal determine o aumento do IPTU pela variação da inflação acumulada em 2009. Porto Alegre, por sua vez, planeja a mudança para depois de 2010.
No fim de setembro, o prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB), encaminhou projeto de lei à Câmara dos Vereadores, que corrige os valores genéricos da planta da cidade a valores de mercado de 2007. A medida fará com que, a depender da localização do imóvel, haja reajustes de até 150% no valor do IPTU. O impacto médio sobre imóveis residenciais está avaliado em 19%.
Segundo a prefeitura, a capital mineira teve uma frustração de receita de R$ 370 milhões nos primeiros oito meses do ano, e não deve realizar a meta inicial de R$ 6,316 bilhões. A receita tributária em Belo Horizonte prevista para este ano é de R$ 1,516 bilhão, cerca de 25% da receita total. Deste total, R$ 460 milhões devem vir do IPTU e R$ 578,9 milhões do ISS.
O prefeito minimiza o impacto social da majoração da cobrança. "É importante lembrar que não estamos lidando com a renda das pessoas, mas com o patrimônio, em um momento em que houve grande valorização de imóveis", afirmou Lacerda. Segundo o presidente do sindicato da habitação em Belo Horizonte (Secovi-BH), Ariano Cavalcanti, o valor médio de compra de imóveis residenciais na capital mineira aumentou 94% entre 2004 e 2009, passando de R$ 94 mil para R$ 183 mil por apartamento. Os apartamentos residenciais representam 66% das transações que recolhem o ITBI.
"Este é um movimento que ocorre no Brasil inteiro. Há uma demanda reprimida com mais acesso a financiamentos e há a recuperação de investidores que haviam ido para o mercado financeiro e hoje compram para alugar", disse Cavalcanti, que prevê valorização média dos imóveis de 1% ao mês, nos próximos três a quatro anos. "O aumento do IPTU afeta o proprietário que deseja locar imóveis. Como o inquilino leva em conta uma composição entre aluguel, condomínio e IPTU, é natural que haja uma redução no valor médio das locações", afirmou Ariano. Para diminuir o custo político do aumento do imposto, Lacerda incluiu várias medidas mitigadoras. Pela proposta da prefeitura , a correção da avaliação dos imóveis residenciais a valores de mercado de 2007 seria atenuada pela criação de novas alíquotas.
Atualmente , as residências avaliadas em até R$ 558 mil pagam 0,8% ; as que se situam entre este valor e R$ 798 mil recolhem 0,9% e acima deste valor, 1%. A partir de 2010, imóveis até R$ 80 mil recolheriam 0,6%; entre R$ 80 mil e R$ 200 mil, 0,7%; e entre R$ 200 mil a R$ 560 mil, 0,8%. Imóveis avaliados em menos de R$ 40 mil, desde que não tenham garagem, estarão isentos. Lacerda também determinou o parcelamento do aumento em duas vezes, entre 2010 e 2011.
O prefeito estima que o aumento do IPTU termine por representar menos do que a revisão das isenções tributárias concedidas durante a gestão de Célio de Castro (1997-2001). Dos R$ 335 milhões de acréscimo pretendido na arrecadação até o fim do governo, apenas R$ 65 milhões, ou cerca de 14% sobre a previsão de arrecadação deste ano, viria do aumento.
Na proposta de lei orçamentária para 2010, a prefeitura de São Paulo estima que as receitas totais vão atingir R$ 28,1 bilhões, 11,96% a mais do que a previsão atual para a arrecadação neste ano, de R$ 25,1 bilhões. O orçamento para 2009 apostava em receitas de R$ 27,5 bilhões, que não deverão ser atingidas. De janeiro a agosto, houve queda de 2% em relação ao mesmo período do ano passado, já descontada a inflação.
No projeto enviado à Câmara, o reajuste previsto para o IPTU se limita à variação da inflação, "como determina a legislação vigente", informa a Secretaria de Finanças do município. Mas a existe a possibilidade de que a alteração dos valores já entre em vigor em 2010. Segundo a secretaria, "a última revisão da PGV foi realizada em 2001 e, desde então, sofreu apenas atualizações lineares com base no índice de inflação, o IPCA. Logo, em regra, os valores venais dos imóveis estão defasados". Caso haja alguma correção da PGV, prossegue a secretaria, isso "acarretará revisão do PL do orçamento que se encontra na Câmara Municipal."
No Rio de Janeiro, o plano da Secretaria de Fazenda para aumentar a arrecadação será implementar até o fim do primeiro trimestre de 2010 a nota fiscal eletrônica do ISS. O contribuinte que apresentar as notas terá descontos progressivos, limitados a 50% do pagamento do IPTU. A expectativa é aumentar a arrecadação do ISS em 5%, o equivalente a R$ 120 milhões ao ano. A prefeitura carioca prevê arrecadação de R$ 13,6 bilhões em 2010, alta de 17,2% em relação à receita projetada para 2009.
O ISS é a principal fonte de arrecadação tributária do município e deve render R$ 3,3 bilhões no ano que vem, expansão de 16,7% sobre a receita de 2009. Apenas a receita com tributos deve subir 11,6% em 2010 e alcançar R$ 5,7 bilhões. A Fazenda do Rio também aposta nas transferências federais como fonte de arrecadação. Os recursos são convênios com o governo federal, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Programa Nacional de Segurança e Cidadania (Pronasci), e devem engordar o caixa em R$ 390 milhões.
A prefeitura de Porto Alegre pretende encaminhar em março de 2010 à Câmara de Vereadores um projeto de lei que prevê a atualização da planta de valores do IPTU. O objetivo principal, segundo a Secretaria da Fazenda, não é aumentar a arrecadação, mas eliminar distorções na cobrança do tributo entre regiões da cidade que apresentaram valorização ou desvalorização imobiliária nos últimos 17 anos.
Segundo o secretário Cristiano Tatsch, o impacto fiscal da medida será praticamente neutro e a aplicação da nova base de cálculo será diluída ao longo de cinco anos, a contar de 2011. A coleta dos dados para a elaboração do projeto, com a utilização de fotografias aéreas dos imóveis, começou a ser feita em junho. "Desde 1992 a prefeitura não atualiza a planta de valores em Porto Alegre", disse Tatsch.
Ilmo Wilger, coordenador do gabinete de planejamento orçamentário da Secretaria de Finanças do município, acredita que o total das receitas em 2009 ficará abaixo dos R$ 3,247 bilhões orçados. Mesmo assim, graças aos cortes de gastos, incluindo o contingenciamento de 20% das despesas correntes, a prefeitura deve encerrar o exercício no mínimo com equilíbrio orçamentário, disse Wilger.
Para 2010, o orçamento da capital gaúcha prevê receitas e despesas de R$ 3,6 bilhões. Conforme o coordenador, a alta sobre a projeção original de 2009 considera um IPCA de 4,31%, mais 4,2% de crescimento real da economia e novas operações de crédito, parte delas vinculada ao PAC do governo federal e parte do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para o projeto de despoluição do rio Guaíba. A previsão de investimentos para o ano que vem atinge R$ 543 milhões, valor que inclui R$ 216 milhões em obras de habitação e saneamento enquadradas no PAC (sendo R$ 49 milhões em contrapartida da prefeitura). Em 2009, os aportes deverão ficar em torno de R$ 150 milhões, um pouco acima dos R$ 147 milhões em 2008.
A prefeitura de Curitiba informou que o IPTU será reajustado pelo IPCA, que deve ficar entre 4% e 4,5%. A decisão deve ser anunciada na primeira quinzena de dezembro, e está sendo estudado desconto de 7% para pagamento à vista. Historicamente, cerca de 70% dos contribuintes optam pelo parcelamento.
Além do IPTU, a secretaria de Finanças planeja a reposição da inflação nos demais impostos. No momento, a prefeitura está em fase final de implantação do ISS Eletrônico, um modelo parecido com o de São Paulo. O tomador de serviços poderá solicitar a nota fiscal eletrônica do prestador de serviços e acumular créditos que podem ser abatidos no IPTU, até o limite de 50% do imposto devido. A expectativa é que haja aumento da arrecadação do ISS e consequente redução na arrecadação de IPTU. O projeto de lei está na Câmara.
O orçamento de 2010 encaminhado à Câmara Municipal é de R$ 4,056 bilhões, com crescimento de cerca de 9% da previsão inicial para 2009, que era de R$ 3,730 bilhões. A previsão de recursos para investimentos deve seguir a média de aplicação do município – 8,3% em relação ao total do orçamento.
Florianópolis renegocia contratos e corta despesas de custeio
Vanessa Jurgenfeld, de Florianópolis
Apesar de registrar queda na arrecadação proveniente do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e dos repasses do ICMS, a prefeitura de Florianópolis não programa compensar essa situação em 2010 com aumento do ISS e do IPTU, mas tem adotado outras ações para equilibrar o caixa.
O secretário municipal da Receita, Sandro Fernandes, informou que além de reduzir as despesas de custeio, com a diminuição das horas extras dos funcionários, a prefeitura iniciou dia 1º um Programa de Parcelamento Incentivado (PPI) para os devedores, está renegociando contratos com fornecedores, adiando prazos de reajustes de preços, e prevê aumento da fiscalização no recolhimento de tributos e na área de multas de trânsito para 2010. No IPTU, somente haverá o reajuste tradicional de todo ano, feito pelo IPCA do período, e não haverá alterações nas alíquotas de ISS hoje praticadas.
Nas contas da prefeitura, somente o PPI poderá adicionar ao município R$ 30 milhões de recuperação de um total de R$ 600 milhões em dívidas, sendo R$ 10 milhões ainda neste ano. O PPI ficará em vigor até 31 de dezembro. Na área de fiscalização, há a previsão de reforço com a abertura de concurso público para 14 novos fiscais. Hoje, a prefeitura conta com uma equipe de 25.
Em relação à fiscalização de multas de trânsito, o município enviou um projeto para a Câmara de Vereadores que prevê a concessão dos serviços de Zona Azul para a iniciativa privada. Hoje, o sistema é administrado pela Aflov, entidade privada sem fins lucrativos, e não estaria dando lucro. Em parte isso ocorre, segundo a prefeitura, porque hoje as pessoas que registram os carros estacionados irregularmente não têm poder de multá-los, sendo necessário o trabalho posterior de um guarda municipal para isso, um processo mais moroso. O novo modelo, segundo a prefeitura, daria poder de multa aos agentes, e permitiria a expansão do sistema para bairros mais afastados do centro.
A movimentação para conseguir mais recursos para o ano que vem ocorre por causa da queda de repasses em 2009. Somente no FPM, a redução esperada para o fechamento deste ano é de R$ 21 milhões, ficando em R$ 64 milhões. No início do ano, a projeção era de R$ 85 milhões com FPM. Em ICMS, a expectativa era de receber R$ 97,6 milhões no ano, mas a receita deve ficar em R$ 85 milhões.
O reforço de caixa tem como alvo obras de infraestrutura previstas no orçamento de 2010, como a construção do elevado do Trevo da Seta (obra de R$ 18,5 milhões já iniciada, mas com execução até outubro do próximo ano) e a conclusão da avenida Beira-mar Continental, com mais R$ 6 milhões.
No orçamento do ano que vem, enviado à Câmara de Vereadores no dia 15 deste mês, Florianópolis prevê receitas 14% maiores do que em 2009, chegando a R$ 1,25 bilhão. Deste total, R$ 663 milhões serão de receitas próprias e R$ 587 milhões de repasses estadual e federal. Os investimentos deverão corresponder a 32% do total, ou seja, cerca de R$ 400 milhões, volume bem maior do que a média dos últimos quatro anos, que ficou em torno de 10% da receita orçada.
Para a oposição, justamente pelo alto volume de recursos para investimentos e pela previsão de crescimento expressivo de 14% o orçamento estaria relacionado a objetivos políticos, como uma possível candidatura do prefeito Dário Berger (PMDB) ao governo do Estado, o que ainda não está definido.
"Esse orçamento é uma peça fictícia e eleitoreira, porque não prevê formas de o município aumentar as receitas. Como Florianópolis pode crescer tanto, 14%, enquanto há previsão para o PIB do país crescer em torno de 3%?", questiona João Amin, vereador do PP.