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Pandemia e a arrecadação dos tributos federais

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COLUNA DA ABDF










Algo em torno de 80% de toda a arrecadação brasileira depende de duas variáveis: renda e receita

A arrecadação federal de tributos deve despencar no próximo trimestre. Como mostram os números da Receita Federal1 até fevereiro vínhamos numa toada muito parecida com 2018 e 2019, com uma arrecadação dentro dos patamares de anos anteriores. Contudo, a partir de março haverá uma queda significativa no resultado das receitas tributárias o que deve complicar em muito as metas do governo. Ou seja: o governo não conseguirá atingir as metas necessárias na coleta de tributos da população para fazer frente aos gastos públicos.

Esse resultado será fruto de um declínio da atividade econômica no país, tendo em vista que a pandemia da Covid-19 provocou uma diminuição drástica das fontes de receitas tributárias disponíveis. A carga tributária mantém-se em níveis bem elevados e ao redor de 33% do PIB nacional.

Ou seja, dificilmente será possível um ajuste fiscal no campo das receitas tributárias, já que atingimos um nível de tributação sobre o PIB que não permite muitos avanços. Por outro lado, já estávamos numa fase de déficit público acentuado, o que não impedirá desse número crescer vertiginosamente, na medida em que as condições das contas públicas alteraram substancialmente.

Uma análise mais detalhada da arrecadação federal nos últimos anos, demonstra que nossa fonte de receita tributária basicamente está concentrada na renda das pessoas físicas e jurídicas e em contribuições sociais sobre receita das empresas.

Algo em torno de 60% de a nossa arrecadação federal está calcada na tributação sobre a renda. Apesar de muitas pessoas se surpreenderem com esses números, na verdade, o Brasil, nos últimos 10 anos teve um crescimento relevante na arrecadação dos tributos que incidem sobre a renda.

No ano de 2019, por exemplo, os contribuintes – pessoas físicas e jurídicas -pagaram ao fisco federal aproximadamente R$ 534 bilhões de imposto sobre a renda (IR), R$ 88 bilhões de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e R$ 435 bilhões de contribuições para a previdência social (“INSS”). Total no ano de tributação sobre a renda: algo em torno de R$ 1 trilhão. O que equivale a algo em torno de 60% do total arrecadado no ano (R$ 1,6 trilhões). A mesma realidade, com poucas diferenças em percentuais sobre a arrecadação anual total, verificou-se nos anos anteriores a 2019 e os mesmos números se repetem, proporcionalmente, no atual exercício fiscal de 2020.

Desse total aproximado 35% são pagos pelas pessoas físicas e os outros 65% são pagos pelas pessoas jurídicas (nesse cálculo consideramos que 1/3 do INSS é contribuição das pessoas físicas e 2/3 das pessoas jurídicas).

Portanto, a tributação sobre a renda no Brasil está em 1o lugar no ranking dos tributos federais e, também, não há como negar que as pessoas físicas têm uma grande repercussão nesse número. Ou seja, se computarmos os tributos das pessoas jurídicas frente aos tributos pagos pelas pessoas físicas veremos como é importante esse último número. A tributação das pessoas físicas incide, em especial, sobre o trabalho.

Num segundo plano estão os tributos que incidem sobre receita – COFINS e PIS. O total da arrecadação desses tributos em 2019 representa 20% de todo o bolo arrecadado no ano.

É importante ressaltar que esses tributos sobre a receita são pagos apenas pelas pessoas jurídicas que assumem um grande ônus no financiamento das despesas públicas. As pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real são os maiores contribuintes desses tributos sobre receita bruta e representam algo em torno de 15 mil empresas apenas. As pessoas jurídicas tributadas pelo Simples e pelo Lucro presumido tem apenas uma importância relativa sobre o volume da arrecadação. Ademais, tais tributos apresentam duas sistemáticas de incidência fiscal: cumulativa e não cumulativa, a depender da base de cálculo do IR, bem como de alguns tipos de atividades específicas.

Em suma: algo em torno de 80% de toda a arrecadação brasileira depende de duas variáveis: RENDA e RECEITA. Numa linguagem mais simples, nossas fontes de recursos para fazer frente aos gastos públicos são em pequeno número. Nosso risco está concentrado em duas variáveis sujeitas a grande volatilidade. E quando esses dois índices de riqueza caem, obviamente, a arrecadação também cai. No caso da atual pandemia, a perspectiva de arrecadação para o próximo trimestre é extremamente preocupante, pois haverá a necessidade de suprir o gasto público é isso será inviável. Além disso, o próprio governo permitiu o diferimento de alguns tributos para permitir que as empresas se organizem com o seu caixa nesse período.

Se a atividade econômica não vai bem, as pessoas jurídicas faturam menos o que, por consequência, provoca uma menor arrecadação do PIS e COFINS, uma vez que estes incidem sobre receita. No mesmo sentido, se o desemprego aumenta e a lucratividade das empresas diminui, o fisco federal não conseguirá arrecadar os tributos sobre a renda que deseja. Em outras palavras: forma-se um círculo vicioso: redução da renda e da receita na sociedade que provoca, por sua vez, redução das fontes de receita do Estado.

O problema é que o gasto não para de crescer e a receita não consegue mais subir. Além disso, um ajuste fiscal pelo lado das despesas também é de extrema dificuldade. Praticamente 92% de todo o orçamento está engessado com despesas obrigatórias, das quais há pouca margem para manobras. Sobra muito pouco para investimento o que prejudica em muito o crescimento do País.

Os restantes 20% da arrecadação em 2019 resumiu-se a R$ 57 bilhões de imposto sobre produtos industrializados (IPI – 3,0% do total); R$ 43 bilhões de Imposto de Importação (II- 3,0% do total); R$ 40 bilhões de imposto sobre operações financeiras (IOF – 2,5% do total); R$ 1,7 bilhão de imposto territorial rural (ITR) e outras receitas administradas pela receita federal e por outros órgãos (8% do total). A mesma realidade se repetiu, com pequenas diferenças, nos anos anteriores.

Em resumo: nossas fontes de receita para custear os gastos públicos federais baseiam-se, fundamentalmente, na renda auferida pelas pessoas físicas e jurídicas e no volume do faturamento das empresas. Quando tais variáveis são afetadas pela crise econômica, nossa arrecadação também sofre reduções drásticas. E, pelo jeito, poucas alternativas nos restam para aumentar a tributação no País.