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O split payment é a nova substituição tributária?

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Crédito: Roque de Sá/Agência Senado

JOTA

 

Texto em discussão no Congresso não assegura que a metodologia será benéfica para os contribuintes

Gustavo Verch, Cristian Scheuer

Crédito: Roque de Sá/Agência Senado

A proposta de regulamentação da reforma tributária contida no PLP 68/2024 busca instrumentalizar os preceitos contidos na EC 132/2023, garantindo um sistema tributário mais moderno, simples e eficiente. Entre os mecanismos previstos no projeto para assegurar tais objetivos é a implementação do split payment como forma de pagamento dos tributos.

Previsto a partir do art. 51 do PLP 68, esse sistema propõe o recolhimento do imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) no momento da liquidação financeira de transações comerciais, quando realizadas por meios eletrônicos de pagamento, como cartão de crédito e pix.

A sistemática não é uma inteira novidade, uma vez que já experimentada em outros países e no setor privado, especialmente em plataformas de e-commerce. Trata-se de um mecanismo promissor no combate à sonegação e fraudes, mas a sua implementação no Brasil desperta diversas dúvidas, entre elas: seria o split payment uma nova forma de substituição tributária?

No modelo proposto, os meios de pagamento digitais deverão ser adaptados para vincular as informações da transação aos documentos fiscais emitidos. Com isso, ao realizar uma compra, os prestadores de serviços de pagamento, como operadoras de cartões, serão responsáveis por segregar e recolher o valor correspondente ao IBS e à CBS diretamente para os cofres públicos no momento da transação.

Essa automatização garante que os tributos sejam recolhidos de forma imediata e precisa, eliminando a dependência de o fornecedor ou comerciante realizar a apuração e o pagamento posterior.

Caso o pagamento seja feito por um método que não permita essa separação automática dos tributos, o art. 56 estabelece que o próprio adquirente de bens ou serviços deverá recolher os valores do IBS e da CBS. Isso cria uma nova dinâmica no controle tributário e na maneira como as empresas lidam com suas obrigações fiscais.

A substituição tributária foi introduzida em setores de difícil fiscalização, impondo a responsabilidade de recolhimento do ICMS a um único contribuinte da cadeia produtiva, geralmente o fabricante ou importador. Nesse sistema, o governo presume um preço final de venda e antecipa o imposto, gerando, muitas vezes, distorções, já que o valor presumido nem sempre corresponde ao preço efetivamente praticado.

Isso resulta na cobrança de um imposto maior do que o devido e no acúmulo de créditos difíceis de serem recuperados, uma vez que não são automaticamente restituídos pela Fazenda, impondo aos contribuintes a árdua tarefa de buscar compensações, muitas vezes sem sucesso.

Nesse sentido, verifica-se que o split payment guarda semelhanças claras com a substituição tributária, pois ambos buscam antecipar o recolhimento do tributo. Contudo, uma diferença crucial está na base de cálculo.

Enquanto a substituição tributária se baseia em uma presunção de preço, o split payment calcula o imposto com base no valor real da transação, eliminando as distorções que ocorrem quando o valor presumido diverge do preço efetivo da venda ao consumidor final. Além disso, o split payment também calculará automaticamente os créditos tributários, cobrando apenas o valor líquido devido, o que reduz a chance de formação de créditos que seriam difíceis de recuperar.

Do ponto de vista teórico, o split payment pode trazer maior eficiência e justiça ao sistema tributário, ao garantir que todos os envolvidos nas transações comerciais paguem o imposto devido, além de ter o potencial de maior simplificação no cumprimento de obrigações acessórias. Contudo, sua implementação exigirá uma infraestrutura robusta, além da adaptação de todos os meios de pagamento digitais para atender às exigências da nova legislação.

Na prática, a antecipação imediata dos tributos pode impactar o fluxo de caixa das empresas, especialmente as pequenas e médias, que dependem do montante integral das vendas para manter suas operações. A adaptação ao novo modelo também pode ser um desafio para essas empresas, que terão que lidar com as novas exigências fiscais e tecnológicas.

Em conclusão, o split payment representa uma mudança significativa em relação a sistemática atual da substituição tributária, prometendo maior precisão e eficiência ao recolhimento de tributos, mas ainda não há uma clareza quanto aos seus impactos e quanto à sua operacionalização, considerando as diferentes nuances das operações.

O texto em discussão no Congresso Nacional não assegura que a metodologia do split payment será benéfica para os contribuintes. Pelo contrário, muitos questionamentos surgirão com a implementação desse mecanismo de apuração e arrecadação.

Gustavo Verch

Sócio das áreas de Inovação e de Revisão Fiscal do escritório Rafael Pandolfo Advogados Associados. Graduado em Direito pela PUC-RS. Especialista em Direito Tributário pelo IBET-RS. Foi professor da Faculdade Brasileira de Tributação (FBT) e da Faculdade IDC. Professor seminarista do IBET-RS

Cristian Scheuer

Sócio da área de entidades do escritório Rafael Pandolfo Advogados Associados. Graduado na Universidade Regional do Noroeste do Estado do RS (Unijuí), MBA em Recuperação de Créditos Tributários e Previdenciários (BSSP Centro Educacional). Pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto de Brasileiro de Estudos Tributário (IBET-RS), é membro da comissão especial de direito tributário da OAB-RS