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Mais valor justo para os balanços

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Contabilidade: Comitê de Crise não só defendeu conceito, como pediu ampliação do uso.

Por Graziella Valenti, de São Paulo

A discussão sobre o valor justo não terminou. Está muito enganado quem pensa que o acalorado debate se encerrou quando o Grupo de Assessoramento para a Crise Financeira, um colegiado formado por influentes formuladores de políticas econômicas, referendou o conceito como o melhor para as práticas contábeis. Na verdade, a discussão só tende a aumentar.

O grupo de inteligência que avaliou a contabilidade à luz da crise recomendou aos reguladores da contabilidade a ampliação do uso do valor justo para a contabilização de ativos, como por exemplo créditos, já que se trata de prática comum para registro dos passivos.

"Sustentamos que é de longe a melhor métrica e que deveria ser aplicada não só no passivo, mas no ativo também", disse Nelson Carvalho, diretor de pesquisas da Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras) e que participou do seleto grupo que avaliou a crise para Iasb e Fasb, os emissores das normas contábeis dos padrões internacional (IFRS) e americano, respectivamente – que estão em processo de convergência.

A recomendação faz parte de um dos quatro itens da conclusão do estudo sobre a crise entregue aos reguladores da contabilidade no fim de julho. Iasb e Fasb terão até 10 de dezembro para mostrar que entenderam a mensagem.

Nessa data, os 18 membros e oito expectadores do Grupo de Assessoramento para a Crise Financeira (FCAG, na sigla em inglês) se reunirão pela última vez para avaliar o andamento das sugestões e emitir um último relatório.

"A principal conclusão desse trabalho foi o reconhecimento de que há espaço para melhorias, mas que isso deve ser feito com independência", enfatizou Carvalho. As definições do grupo trataram sobre a eficácia dos relatórios financeiros, suas limitações, o processo de convergência para um único padrão de contabilidade e a importância da independência dos órgãos reguladores.

Carvalho contou ainda que ao tratar da eficácia dos relatórios financeiros, também se recomendou ao Iasb e ao Fasb que determinem a utilização de um terceiro avaliador independente para calcular o valor justo para instrumentos financeiros sem liquidez.

Quando se tratar de título com mercado ativo, o valor justo nada mais é do que a marcação a mercado. Mas quando não há liquidez para os papéis, deve-se aplicar um método matemático amplamente conhecido, mas não pré-definido. Daí a importância de um terceiro, para dar independência e credibilidade ao processo.

Faz parte do mesmo item a recomendação para que se simplifiquem as regras sobre instrumentos financeiros, o IAS 39. Esse trabalho, contudo, já está em andamento e será realizado em três etapas. A primeira já foi concluída. A obrigatoriedade de aplicação dos novos conceitos, contudo, é para 2012.

O FCAG foi formado depois que, na procura pelos responsáveis pela crise internacional, surgiram vozes afirmando que a culpa era da contabilidade – mais especificamente, do valor justo. Isso porque ele acentuaria as perdas das instituições financeiras num momento delicado. Foi a partir desse momento que em toda palestra sobre contabilidade a expressão "não culpem o mensageiro" tornou-se recorrente.

O estudo encaminhando ao Iasb e ao Fasb também é um alerta aos investidores e todo o público que utiliza as demonstrações financeiras para tomada de decisões. "Eles devem entender que precisam fazer seu próprio julgamento", destacou o professor da Fipecafi.

Na opinião de Carvalho, nesta crise "em algum momento, em uma extensão não trivial todos falharam" em suas funções. A análise do especialista compreende desde os gestores dos negócios, os avaliadores de risco – de crédito e de ações, os conselhos de administração, as agências reguladoras governamentais, as auditorias e os comitês.

Do Banco Central para o fogo cruzado

Nelson Niero, de São Paulo

Edson Ruiz / Valor
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Amaro Gomes, do Iasb: convergência é essencial para viabilizar investimentos

Amaro Gomes provavelmente não pensou que a marcação a valor de mercado fosse ocupar tanto seu tempo. Há cerca de dez anos, então chefe adjunto do departamento de normas do sistema financeiro do Banco Central, ele trabalhou na adaptação das regras internacionais para os bancos brasileiros. Em abril, Gomes tornou-se membro do Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb) no momento em que o "valor justo" está sob fogo cerrado. A seguir, trechos da entrevista, por e-mail:

Valor: Quais são os desafios para o Iasb e para as normas internacionais de contabilidade ?

Amaro Gomes: O programa de trabalho do Iasb neste ano está focado nas questões associadas a crise financeira global, mas muito tem sido desenvolvido com o objetivo de reduzir assimetrias entre os pronunciamentos do Iasb e as práticas adotadas por diferentes reguladores, principalmente nos EUA, tendo em vista o memorando acordado com o Fasb [órgão responsável pelas normas contábeis nos EUA]. Temos trabalhado para apresentar respostas a questões como a aplicação do valor justo em mercados ilíquidos, itens fora do balanço e divulgação relacionada aos principais riscos. Em relação ao valor justo, em maio foi publicada uma minuta de pronunciamento, cujos comentários podem ser encaminhados até 28 de setembro. Em julho, publicamos uma minuta que trata da classificação e mensuração dos instrumentos financeiros, com comentários até 14 de setembro. Quanto aos itens fora de balanço foram publicadas propostas sobre consolidação e baixa de ativos.

Valor: Quais as consequências dessa revisão recente do pronunciamento sobre derivativos financeiros (IAS 39), principalmente com relação aos balanços de bancos?

Gomes: O principal objetivo é aprimorar a capacidade dos usuários das demonstrações financeiras para avaliar fluxos de caixa futuros associados a tais instrumentos, inclusive esclarecendo que os instrumentos que tenham caracteristicas de empréstimos e sejam administrados com base na remuneração contratada (usualmente referenciada como a curva do papel) podem ser mensurados pelo custo de amortização. As próximas fases do projeto de instrumentos financeiros envolvem a edição de propostas para imparidade e contabilidade de hedge, previstas para outubro e dezembro, respectivamente.

Valor: O que representa a sua nomeação para o Iasb?

Gomes: A nomeação é um reconhecimento ao status do Brasil no ambiente internacional. A convergência para as normas internacionais de contabilidade é essencial para viabilizar o fluxo de recursos para investimentos de longo prazo, na medida em que possibilita análise comparativa e ágil com outras alternativas disponíveis no mercado internacional. Portanto, ter um brasileiro no [Iasb] é o reconhecimento de que podemos contribuir para o aprimoramento dessas normas, oferecendo a perspectiva de um país definitivamente inserido na economia global. Tais aspectos nortearam minha decisão de aceitar o desafio, procurando enriquecer as discussões com a experiência acumulada de auditor independente e de regulador, que exerci nos últimos 17 anos no BC, interagindo com outros reguladores e supervisores, principalmente de instituições financeiras, como o Comitê de Basileia.