Lina Vieira diz que crise fará arrecadação crescer menos
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A secretária adjunta da Receita Federal diz que a crise trouxe queda nos investimentos produtivos e já está havendo retração de crédito no país
FOZ DO IGUAÇU – O governo federal já admite um novo patamar para o crescimento da arrecadação. É o que afirma a secretária adjunta da Receita Federal, Lina Viera. “A crise nos deixa em situação de alerta, porque ela trouxe queda nos investimentos produtivos e já temos a sinalização das indústrias de que está havendo retração de crédito no País. Certamente haverá o mesmo na arrecadação, porque ela é feita com base na produção e já foi estimada em um patamar diferente do que temos hoje”, explicou Lina.
A secretária não arrisca números, mas admite a interferência da crise financeira internacional na tendência de aumento de receita tributária do Brasil. “Vamos fazer uma revisão para definir efetivamente, através de números que ainda não temos, se isso vai refletir ainda este ano ou só no próximo ano”, disse durante o XI Congresso Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, em Foz do Iguaçu (PR).
Se o governo admite impacto, trabalha agora para calcular o seu tamanho. Segundo a secretária, uma decisão conjunta dos Ministérios da Fazenda e Planejamento deverá traçar as medidas necessárias para minimizar os efeitos da atual crise na economia mundial. Lina aponta que a queda da arrecadação gera, primeiro, cortes no Orçamento, mas lembra que já houve manifestação do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no sentido de preservar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “Teremos que trabalhar o corte de gastos em um novo conceito de arrecadação, com um novo patamar arrecadatório. Isso tudo terá que ser revisto”, afirmou Lina, que cita um possível adiamento de concursos públicos como exemplo de cortes a serem feitos.
Sobre a crise mundial, Lina diz também que “não estamos diante de mais uma crise. Estamos diante de uma crise sistêmica. Uma crise que obrigou o mundo desenvolvido a estatizar a maior parte do setor bancário. Algo que há pouco tempo, ninguém podia imaginar”, destacou a secretária.
Fisco em setembro
Os dados sobre a arrecadação de setembro serão anunciados hoje pela Receita Federal. Segundo projeção da Tendências Consultoria, a arrecadação federal de impostos e contribuições, além da receita previdenciária, deve chegar a R$ 56 bilhões. “Os resultados ainda mostram o desempenho da economia doméstica ao longo do ano, apesar das turbulências dos últimos meses. Mas esses resultados vão começar a desacelerar”, explica Felipe Salto, analista da Tendências.
O total em arrecadação tributária deve ficar em R$ 41,5 bilhões e a receita previdenciária em R$ 14,5 bilhões. Para setembro, o analista da Tendências diz que dois fatores sazonais contribuem: o ajuste do Imposto de Renda de pessoa física e o Imposto Territorial Rural (ITR).
Em agosto a arrecadação foi de R$ 53,9 bilhões. “No ano passado esse número foi de R$ 48,5 bilhões. Em termos nominais isso significa um crescimento de 16%”, diz o analista. A questão que leva a esse crescimento, segundo Salto, é que a arrecadação primária do governo federal está quase que unicamente baseada no desempenho da economia interna. “Mas esse efeito também é contrário. Se a arrecadação tributária cresce mais do que proporcionalmente em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o inverso – queda – também acontece”, explica. O crescimento real, comparando setembro de 2007 e o mesmo mês deste ano, foi de 8%. Para manter o equilíbrio da economia interna, Salto diz que é necessário um ajuste. “O governo tem que cortar em despesas correntes e não é provável que venha a fazer cortes em investimentos. E em relação ao PAC, o montante de recurso direcionado ao programa não traz tanta diferença em relação ao montante que sempre foi destinado ao investimento. Por isso, pode ser mantido”, afirma.
Reforma salvadora
Pegando carona na turbulência econômica, o governo aproveitou o momento para fazer campanha pró-aprovação da reforma tributária. Não faltam governistas dizendo da importância das medidas para o enfrentamento da crise. Mas segundo analistas, a ligação entre os dois temas é pouco visível em termos de respostas concretas. “A reforma tem efeito menor sobre os desafios que a economia deverá se deparar no próximo ano. E a eficiência arrecadatória pode atenuar, mas não vai neutralizar os resultados”, avalia Felipe Salto.
O especialista em contas pública, Amir Kahir, concorda. “Não vejo como a reforma tributária fazer crescer a arrecadação, fora o impacto positivo do mercado, porque boa parte do empresariado apóia a reforma.” Segundo ele, um ponto que poderia fazer alguma diferença para a receita dos estados e municípios é a aprovação do imposto sobre fortunas, que consta do projeto original da reforma. “Essa é a única oportunidade de melhorar a arrecadação, porque ele destina 50% do recolhimento para os estados e municípios. O que passa a ser bem interessante”, diz. “Mas de forma geral as ações que podem contribuir para ajudar na arrecadação não dependam da reforma.”