Isenção fiscal não encoraja fabricação de chips no país
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Na última semana, o presidente mundial da fabricante de chips AMD, Hector Ruiz, se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan. Em meia hora de reunião, durante o Fórum Econômico Mundial, na Suíça, o governo brasileiro expôs a Ruiz as linhas gerais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e as isenções fiscais para companhias que fabricarem seus semicondutores no país.
Afora a habitual diplomacia, tudo indica que o governo terá de dedicar mais que 30 minutos de bate-papo com executivos para convencer gigantes dos chips a olharem para o país como um potencial destino de seus investimentos. “O Brasil deu um primeiro passo”, diz o diretor geral da AMD no Brasil, José Carlos Yazbek. “Mas é claro que ainda há muito a ser feito.”
O primeiro passo a que Yazbek se refere diz respeito à Medida Provisória 352, na qual o governo abre mão do recolhimento de Imposto de Renda (IR), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide). O pacote fiscal, porém, nem sequer chegou a sensibilizar empresas como a Intel, hoje a maior companhia do setor, com mais de vinte unidades fabris espalhadas pelo mundo, nenhuma delas no Brasil. “A ação é positiva, mas muito pontual, não muda a posição da indústria”, diz o diretor de marketing da Intel, Elber Mazaro. “Não há o que justifique uma produção local.”
De maneira geral, a postura da Intel reflete o que pensa boa parte do setor: o governo tomou uma decisão acertada, mas longe de justificar grandes investimentos. Há anos, países como China, Coréia do Sul e Malásia dão isenção total de impostos para fabricantes de chips, afirma José Ricardo Roriz Coelho, diretor do departamento de competitividade e tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Não é por luxo que o governo brasileiro quer uma indústria de chips. O semicondutor – produto básico para produção de aparelhos como telefone celular, computador e TV, e também carros – é hoje o principal fator de desajuste da balança comercial eletroeletrônica. Em 2006, o país exportou US$ 2,6 bilhões em componentes, mas importou US$ 11,8 bilhões, dos quais US$ 3,3 bilhões dizem respeito a semicondutores. “Essa conta precisa ser equilibrada”, diz o vice-diretor do grupo de componentes da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Wanderley Marzano. “Mas ninguém virá para cá só por causa da cor dos nossos olhos. As condições precisam melhorar.”
O executivo cita exemplos. “Quando a AMD foi para a Alemanha, recebeu do governo US$ 650 milhões. A única exigência era que os pesquisadores da empresa fossem alemães.” A Intel, ao escolher Israel, recebeu US$ 1 bilhão do governo, diz o membro da Abinee. “Temos que definir o que queremos. Ou jogamos pesado também, ou seguimos outro caminho.”
Marzano, que também é presidente da Aegis, uma das três companhias que hoje fabricam semicondutores no Brasil – ao lado da Smart Technologies e da Semikron -, lembra ainda que a desoneração fiscal proposta diz respeito apenas a tributos federais. Na esfera estadual, diz ele, a cobrança de ICMS ultrapassa 30%. Na americana Smart, também não se vê razões para comemorar. “A medida é tímida, praticamente não mexe em nada”, diz o presidente da companhia, Noboru Takahashi.
De seu lado, o governo acredita ter dado o recado, embora reconheça que se trate de uma ação de longo prazo, a qual envolve, principalmente, outros dois focos de investimento: formação de mão-de-obra especializada e modernização de infra-estrutura para escoamento de produção. “O Brasil entrou no radar da empresas”, diz Antônio Sérgio Martins Mello, secretário de desenvolvimento da produção do Ministério do Desenvolvimento. “Tem que acabar essa tese de que perdemos o bonde. O governo criou condições, agora depende também do mercado.”
Neste momento, a NXP, ex-braço de chips da Philips, vê espaço para discutir a ampliação das operações no país. As propostas do PAC já chegaram à matriz, na Holanda. “Os interesses não são imediatos, mas há possibilidades de investirmos mais em pesquisa e desenvolvimento”, diz o diretor da NXP para a América do Sul, Carlos Paschoal.
Com unidade em Manaus e escritório em São Paulo, hoje a NXP trabalha com a validação de chips para TVs analógicas, produzidos fora do país. Nos próximos meses, porém, a empresa passará a desenvolver protótipos de chips para TV digital. O Brasil começou a jogar, diz Paschoal. “Só não estamos no bloco da primeira divisão.”