Isenção a estrangeiro terá ferrolho
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Dispositivo impedirá que papéis adquiridos no País com o benefício sejam usados para especulação
Ribamar Oliveira
BRASÍLIA
O projeto de isenção do Imposto de Renda para aplicações de investidores estrangeiros em títulos públicos no Brasil, que deverá ser anunciado pelo governo nos próximos dias, terá um dispositivo para impedir que os papéis adquiridos sejam utilizados como garantia para empréstimos de curto prazo, informou ontem o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. “Vai ter um ferrolho”, disse Levy.
Com esse “ferrolho”, o governo espera evitar que a entrada dos recursos estrangeiros para aplicações em renda fixa resulte em movimentos especulativos que afetem outros mercado, como o de câmbio, por exemplo. Como a legislação já obriga o registro dessas operações lastreadas em títulos, o secretário considera que a limitação será fácil de ser posta em prática.
Em conversa com o Estado, Levy negou que o objetivo do governo seja, como acusam alguns economistas e políticos, o de incentivar por meio de renúncia fiscal a vinda de capital especulativo ao País. “Esse capital que virá não é especulativo, é capital de longo prazo”, disse. “Olhem a situação das contas externas do Brasil e vejam se estamos precisando de capital especulativo.”
O secretário informou que tem recebido várias consultas de “investidores muito sérios” sobre aplicações no País. “Há uma nova classe de investidores querendo entrar.” Ele explicou que, ao adotar a isenção para investimentos estrangeiros em títulos, o Brasil vai apenas se equiparar a outros países. Segundo ele, somente Portugal e Grécia tributam as aplicações feitas por estrangeiros.
Na avaliação de Levy, a medida não terá grande impacto na cotação do real. “Ela não deve afetar muito o câmbio, mas terá grande impacto sobre a curva de juros dos títulos públicos.” A taxa de câmbio está sendo afetada, segundo analisou, pela excepcional cotação das commodities exportadas pelo Brasil, que estão em nível recorde.
Para o secretário, a medida terá três efeitos principais. Em primeiro lugar, segundo ele, ela “alimenta a certeza” do mercado de que o governo vai promover o alongamento do perfil da dívida pública, com a emissão de papéis de prazo mais longo e em melhores condições.
Em segundo lugar, observou Levy, ela retira uma “volatilidade adicional” dos papéis brasileiros, dando ao investidor estrangeiro uma perspectiva mais estável de longo prazo. Mas ele não espera que ocorra uma enxurrada de recursos estrangeiros. “Não vai entrar tanto dinheiro assim”, acredita.
Em terceiro lugar, explicou o secretário, com a maior oferta de recursos para os títulos públicos brasileiros, abre-se espaço para que o governo continue o processo de recompra da dívida externa de curto prazo.
Levy considera que a isenção do investidor estrangeiro faz parte de um conjunto de medidas para tornar o Brasil “mais organizado” em termos de finanças públicas. “Uma medida como essa implica compromissos fiscais muito claros; a adoção dessa medida sinaliza que essa será a direção.”
O secretário rebateu também a tese de que a medida tornará o Brasil mais vulnerável à “doença holandesa”, ou “dutch disease”. A tese é que a valorização excessiva do real provocada por um “boom” das exportações de produtos primários, aliada à isenção para investidores estrangeiros, leve à desindustrialização do País. “Quando eu ainda era estudante, ouvi o ex-ministro Mário Henrique Simonsen (da Fazenda) explicar que a “dutch disease” não resultou de política monetária rigorosa, mas de uma política fiscal ruim e de uma política monetária frouxa.”