Há muito a ser feito antes de pensar em volta da CPMF
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Por Sergio André Rocha
Uma antiga conhecida do contribuinte brasileiro, a qual se encontraausente há muito pouco tempo para ter sido esquecida, voltou ao centrodos debates político-fiscais: a CPMF.
Embora governo e oposição travem uma batalha a respeito do retornodessa impopular contribuição, não se pode deixar de suspeitar que talantagonismo seja apenas de ocasião. De fato, uma parte provavelmentesignificativa da atual oposição estaria com os punhos em riste,brigando pela CPMF, se (ainda) fosse governo. Da mesma forma, seria dese esperar que aqueles que hoje são situação fossem contrários àcontribuição em sendo oposição.
Não parece equívoco, portanto, dizer que entre os partidos que dominama cena política brasileira não se identifica uma verdadeirabipolarização a respeito da matéria fiscal como a que acompanhamosentres os Partidos Republicano e Democrata nos Estados Unidos (aquelepró redução do tamanho do Estado e, conseqüentemente, diminuição dacarga fiscal e o último defensor de uma maior participação estatal, aqual depende de uma maior arrecadação de tributos). Por aqui, a defesada redução ou do aumento da carga fiscal costuma depender apenas de seser governo ou oposição.
No meio do fogo cruzado da retórica política, encontra-se ocontribuinte, que simplesmente está “cansado de contribuir”.Se é possível falar em uma psicologia tributária, como dizia oprofessor alemão Günter Schmölders, não é descabido dizer que o FiscoBrasileiro tratou tão mal seus pacientes que eles estão a ponto de
cometer um suicídio coletivo.
Há várias razões que levam os contribuintes a não se sentiremmotivados a contribuírem com cofres públicos, sendo que quatro podemser apontadas como principais: a má-gestão da coisa pública, o desviode destinação dos recursos públicos, a corrupção e a própriacomplexidade do mundo contemporâneo, que muitas vezes impossibilitaque o cidadão acompanhe todas as destinações legítimas dadas àsreceitas advindas dos tributos.
A demonstração por parte das instituições públicas de que a má-gestão,em suas diversas modalidades, assim como a corrupção, não serão demaneira nenhuma toleradas, é um passo essencial para que a Fazenda aospoucos vá reparando a tão arranhada imagem de sua legitimidadearrecadatória.
Além da correção das patologias, o governo, nas diversas esferas, temo desafio e a obrigação de buscar otimizar a arrecadação sem que sejanecessária a criação de novos tributos. Em outras palavras, o focodeveria estar em temas como a reforma tributária e não no retorno daCPMF.
À pergunta, deve a CPMF voltar?, parece que apenas uma resposta seriapossível: depende. Isso porque, o retorno da contribuição, assim comoqualquer aumento ou diminuição de carga tributária, estaria vinculadoà tomada de posição a respeito de uma questão de ordempolítico-constitucional que o antecede: qual o tamanho que se esperaque o Estado Brasileiro tenha.
Se for grande o papel definido para o Estado, as necessidadesfinanceiras vão sempre ser maiores do que a arrecadação de tributos,não importa o quanto esta continue a crescer. Ou seja, a questãoinicial não é quanto se deve arrecadar, mas sim definir qual é otamanho do papel do Estado.
Outra pergunta pertinente é: faz sentido a CPMF voltar agora? Emrelação a este questionamento também nos parece que apenas umaresposta seria possível: não. Antes de se pensar em discutir umretorno da CPMF há muito trabalho. Há que se averiguar até onde vai odesvio de recursos. Há que se punir os culpados nos diversosescândalos de corrupção, passados e recentes. Há que se realizar,finalmente, a tão falada reforma tributária. Há que se buscar coibir a
evasão fiscal.
Vê-se, assim, que há muito que se fazer antes de se cogitar um aumentona carga tributária. Não parece razoável que, ao invés de trilhar omais árduo caminho das reformas orgânicas que se fazem necessárias,transfira-se para o contribuinte, uma vez mais, o custo daineficiência estatal.