Governo já vê estouro da bolha cambial como subprime brasileiro
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Empresas movimentavam US$ 40 bi com venda futura do dólar e foram surpreendidas pela disparada da moeda
O estouro da bolha cambial, a exemplo do crédito imobiliário nos Estados Unidos, já é considerado pelos economistas do Ministério da Fazenda como o tempero amargo do Brasil na crise global – o subprime brasileiro. A subida repentina do dólar nas últimas semanas surpreendeu governo, mercado e, principalmente, empresas que especulavam com a moeda americana e, do dia para a noite, amargaram brutais prejuízos com a desvalorização do real.
Em pouco mais de dois meses, o dólar disparou de R$ 1,56 para os R$ 2,32 da última sexta-feira. Além da queda do real surpreender pela magnitude, o que mais chama a atenção é o fato de grandes exportadores estarem no olho do furacão – como Aracruz, Sadia e Votorantim.
Teoricamente, essas empresas deveriam ganhar com a desvalorização, pois suas vendas em dólar rendem mais reais, mas está ocorrendo o contrário: essas empresas captaram mais dólar do que precisavam no exterior, trocaram em reais no Brasil e apostaram no mercado futuro que a taxa não passaria de R$ 1,80, com a expectativa de lucrar com o juro alto. Essa aposta é feita por meio de "venda de opção de compra", operação altamente especulativa, na qual o investidor assume uma taxa futura para a venda de dólares e, em troca, recebe a rentabilidade da taxa de juros. Quem apostou que o dólar não passaria de R$ 1,80 está ameaçado de vender a moeda americana por esse preço, quando ela já está custando 28,8% mais.
A operação não seria um problema tão grave se as empresas tivessem dólar estocado – o que não é o caso desse tipo de aposta financeira, que é virtual. Segundo analistas do mercado, a estratégia vinha dando certo até recentemente, e era uma forma de as empresas compensarem a queda de receita que tinham com suas transações mercantis, em decorrência da valorização cambial. O problema é que essas operações inundaram o mercado brasileiro de dólares e agravaram a espiral de supervalorização do real.
Alguns empresários alegam que entraram no mercado futuro de derivativos por "pressão e imposição" dos bancos que concederam as operações de Adiantamento de Contrato de Câmbio (ACC). Porta-vozes do setor financeiro admitem que esse era um produto largamente oferecido pelas instituições bancárias, mas contestam a alegação de imposição. "Ficaram de olho grande mesmo", diz um economista do mercado.
O governo ainda não concluiu o levantamento da extensão do estrago nas exportadoras, mas o mercado calcula que as operações com derivativos somariam pelo menos US$ 40 bilhões e também atingiriam empresas médias, com menos caixa para enfrentar o prejuízo.
"Para o ambiente de previsibilidade que predominava antes da crise, eram operações aparentemente seguras, mas assumiram valores excessivos", diz o economista Flávio Castelo Branco, da Confederação Nacional da Indústria (CNI). "Acho que vamos ver alguns casos de insolvência", prevê o economista José Roberto Mendonça de Barros, da consultoria MB Associados.
A queda do Ibovespa também reflete a bolha especulativa, pois o mesmo capital exterior que inundava o País atrás dos juros altos foi diversificado em aplicações na bolsa, resultando em valorização das ações muito superior ao que realmente ocorria na economia real. Com a saída do capital externo, a bolha se esvaziou, mas agora abaixo do que realmente vale o patrimônio das empresas.