Geração eólica já gira bilhões de reais
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Valor Online
Leilões de 2009 e 2010 ajudaram a consolidar o setor no Brasil, atraindo fabricantes de equipamentos
Os ventos trouxeram uma nova leva de investimentos ao país. De executivos novatos ingressos no mercado de geração de energia a uma sequência de multinacionais à frente de construções de fábricas de equipamentos, o mercado da energia eólica é uma realidade no Brasil, uma indústria que só começou a girar agora, mas que já movimenta dezenas de bilhões de reais por ano. E ainda traz a vantagem dos ventos soprarem forte na época de seca, quando as hidrelétricas tendem a reduzir a produção.
Essencialmente novo, esse mercado tem sido formado por histórias como a de Ricardo Delneri, executivo que tinha apenas 29 anos de idade quando, em 2000, decidiu abandonar o mercado financeiro para montar, com o amigo Renato Amaral, a Renova Energia. A motivação inicial dos sócios era explorar as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), usinas com capacidade de até 30 megawatts (MW). Fizeram isso até 2006, quando as eólicas chamaram a atenção. O interesse redundou na criação de um portfólio de projetos e na disputa do primeiro leilão exclusivo de eólicas, realizado em dezembro de 2009, quando a Renova Energia ganhou a disputa para instalar 14 parques de aerogeradores na Bahia. "Aquilo foi decisivo, alí vimos que algo tinha mudado nos nossos planos", conta Delneri, hoje com 40 anos e diretor co-presidente da Renova Energia. A instalação das 184 turbinas com capacidade de 294 MW contratados em 2009 começa a ser entregue em agosto. O investimento total é de R$ 1,2 bilhão. No leilão de 2010, a companhia voltou a concorrer e levou mais seis parques com potência total de 163 MW. Vai desembolsar mais R$ 620 milhões. "A força das eólicas nos levou a congelar os projetos de PCHs para os próximos dois anos."
Por trás da aposta dos empresários do setor está a inclinação do governo em manter na pauta a realização regular de leilões específicos para as eólicas. Em 2009, quando o mercado surpreendeu o governo com a realização de projetos na casa de R$ 150 o MW/hora – era esperada uma média de R$ 200 -, foram arrematados 1.800 MW. No ano passado, com um preço ainda mais competitivo, na casa dos R$ 135 o MW/hora, foram contratados mais 2.050 MW. Para o leilão previsto para acontecer em maio, a previsão da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica) é de que pelo menos mais 2 mil MW sejam contratados. Nesta semana, em evento que acontece em São Paulo, empresários do setor, associações e governo se reúnem na mesma mesa para discutir o futuro da energia eólica no país. "Vamos debater diversas questões. Uma delas é essa capacidade anual de pelo menos 2 mil MW para que possamos incentivar e consolidar os investimentos no país", comenta Ricardo Simões, presidente da Abeeólica.
O mercado se prepara para a nova rodada de negociação. A Galvão Energia, empresa do grupo Galvão criada em 2007, montou um portfólio de 600 MW de projetos eólicos. No ano passado, a companhia arrematou a construção de quatro usinas no Rio Grande do Norte com potencial instalado de 94 MW, com investimento de R$ 400 milhões. Para este ano, no entanto, o plano é chegar a até 200 MW, com até oito projetos fechados. "É um ano importante para a energia eólica se firmar como alternativa importante e complementar à matriz nacional, concentrada nas hidrelétricas", diz Otávio Silveira, presidente da Galvão Energia.
Competição não vai faltar. No leilão de 2009, segundo dados da Abeeólica, foram inscritos e habilitados 3 mil MW de projetos. No ano passado foram 11 mil MW. Com a contratação de 2 MW por ano, o investimento garantido apenas na instalação das usinas é de R$ 8 bilhões. Essa conta não inclui os recursos decorrentes da instalação de fábricas no país, da cadeia de fornecedores de componentes que se integram a elas e da contratação de mão de obra. As estimativas internacionais dão conta de que, para cada MW contratado, são gerados 13 empregos. Isso significa que, se forem contratados 4 mil MW entre 2009 e 2013, como se prevê, o setor tem capacidade de gerar cerca de 50 mil empregos.
"O país saiu um pouco atrasado nessa área em relação a outras nações, mas está recuperando o terreno rapidamente", afirma Telmo Magadan, presidente da Ventos do Sul, companhia que possui o maior parque produtor de energia eólica da América Latina, em Osório (RS), com 150 MW. O grupo dobrou sua capacidade com os leilões de 2009 e 2010, adicionando mais 100 MW em Osório e 50 MW em Palmares (PE). Os investimentos vão chegar a R$ 800 milhões e as obras devem começar neste semestre, com previsão de entrada em operação até julho de 2012. "O Brasil deveria atingir entre 8% a 10% da matriz energética vinda dos ventos até o fim da década."
Ainda está longe disso. A estimativa da Abeeólica é de que o país feche este ano com 1,4 mil MW de potência instalada, indo para 3,2 mil MW em 2012 e 5,25 mil MW, em 2013. "Isso é cinco vezes o que temos hoje, o que é um salto relevante, mas ainda é pouco se observada a participação relativa das eólicas em relação às demais fontes de energia", diz Ricardo Simões, presidente da associação. "Teremos 4,3% da potência instalada no país, ou seja, há enorme potencial de crescimento."
De fato. Os estudos mais recentes que mapearam os ventos do Brasil, elaborados em 2001, apontam que o potencial é de 143 mil MW. Isso equivale a duas vezes a potência hidrelétrica total do país gerada até 2009. Esse levantamento eólico, no entanto, está absolutamente defasado. O potencial do setor, na realidade, é muito maior. Dez anos atrás, quando os primeiros estudos foram feitos, só consideraram a captação feita por turbinas de até 50 metros de altura. Ocorre que hoje os cata-ventos chegam a 100 metros. "Não há números precisos, mas o potencial é gigantesco. No mercado já se fala numa capacidade superior a 300 mil MW", comenta Simões.