Especialista defende que a Previdência não é deficitária
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O TEMPO
Denise Gentil afirma que governo deveria cobrar dos grandes devedores do INSS
Uma das maiores especialistas em seguridade social do país acaba de jogar mais lenha na fogueira da reforma da Previdência. De passagem por Belo Horizonte, a professora de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Denise Gentil defendeu sua tese de que a Previdência não é deficitária como afirma o governo federal. “A justificativa para a reforma da Previdência é um suposto déficit muito grande. Só que ele não existe”, frisa.
Ela ressalta que não é a única a negar o déficit. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) e estudiosos compartilham a mesma crença.
De acordo com Denise, o que o governo quer é ajustar os gastos da Previdência à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287, além de estimular a procura pela previdência privada, que vem crescendo desde o anúncio da reforma.
A Previdência faz parte da seguridade social, que contempla também assistência social e à saúde. A seguridade é deficitária desde 2002 e, no ano passado, teve rombo de R$ 258,7 bilhões, conforme o governo federal. Entretanto, a professora defende que existe superávit, na casa dos R$ 11,8 bilhões, em 2015.
Conforme levantamento feito pela especialista, o maior superávit que a seguridade já teve foi em 2007, quando passou R$ 120 bilhões. “E esse superávit era retirado pelo governo e gasto em outras áreas”, explica.
Na época, a Desvinculação das Receitas da União (DRU) – o limite legal que o governo pode usar da receita da contribuição social para gastar como quiser – era de 20%; hoje é de 30%. E o governo ultrapassava o percentual, porém o Tribunal de Contas da União (TCU) nunca punia por isso.
Dessa forma, de 2007 em diante o governo sempre ultrapassava esse limite, relata Denise. “O maior problema não foi a DRU, foram as desonerações, que começaram a acontecer, principalmente, depois de 2010. Afinal, elas foram subindo ano a ano”, analisa.
Hoje, as desonerações, que são as renúncias de receitas em favor das empresas, estão na casa de R$ 283 bilhões ao ano. “Nisso, 53% da renúncia de receitas são de recursos da Previdência e seguridade social”, diz. A maior parte dessas desonerações, porém, vai acabar neste ano.
Empresas devem ao INSS. A dívida ativa previdenciária soma mais R$ 350 bilhões, concentrados em 500 grandes empresas, bancos e algumas prefeituras. “No ano passado, o governo recuperou apenas 0,32% dessa dívida. O governo não vai de fato atrás desses devedores”, observa.
A especialista calcula que somando a DRU, as desonerações e mais a dívida das empresas com a seguridade social, o valor seria superior a R$ 1 trilhão. “O governo tem um discurso contraditório ao falar em déficit da seguridade, da previdência. Se existe falta de dinheiro por que desonera, aumentar o percentual da DRU, não cobrar dos devedores?”, questiona.
Ela afirma ainda que o modelo atuarial adotado pelo governo é frágil e cientificamente inviável, sem conexão com a realidade. Segundo Denise Gentil, o governo apresentou um novo modelo há 20 dias, em razão da pressão dos pesquisadores. “Para projeções para 2060, são utilizados dados da Pnad de 2014. Não se pode fazer uma projeção assim, repetindo números. Deve ser considerada a dinâmica do mercado de trabalho. A série tem que ser longa, de pelo menos, 33 anos. Isso é inviável cientificamente”, critica. Para ela, não há qualquer ponto positivo na proposta de reforma da Previdência.
Mais um rombo histórico nas contas
BRASÍLIA. O déficit primário de R$ 23,468 bilhões do setor público consolidado (Governo Central, Estados, municípios e estatais, com exceção de Petrobras e Eletrobras) em fevereiro foi o pior da história para o mês, revelou o Banco Central. O chefe-adjunto do Departamento Econômico do BC, Fernando Rocha, avaliou que, apesar da marca negativa, o número ficou próximo do resultado de fevereiro do ano passado, R$ 23,040 bilhões.
O déficit decorre do aprofundamento do déficit da Previdência, enquanto o resultado do Tesouro Nacional (mais Banco Central) foi melhor. “Isso reflete o esforço de consolidação fiscal, enquanto o déficit do INSS de fevereiro foi o pior da história para qualquer mês”, acrescentou.
Previsão. O Ministério da Fazenda projeta para este ano um rombo de R$ 143,1 bilhões, dos quais R$ 139 bi seriam correspondentes ao governo federal. Em 2016, foram R$ 154,2 bilhões.