Empregado custa até o dobro para patrão
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Portal Fenacon
Folha de Londrina / PR
Além do salário, funcionário no modelo mensalista fica 67,2% mais caro para o empregador; valor pode chegar até a 110%
Muito se fala sobre os altos índices de impostos que o trabalhador brasileiro paga ao Governo. Exemplo disso é que o contribuinte teve de trabalhar o correspondente a 148 dias em 2010, quase cinco meses, somente para bancar esta conta. Mas e o outro lado da ”corda”, como fica? A frase: ”Pouco para quem ganha, muito para quem paga”, retrata a contratação brasileira. Além do salário do funcionário, o empregador tem uma tributação que eleva sua despesa em, no mínimo, 67,2%, podendo chegar até em 110%, dependendo da categoria em que se enquadra seu funcionário.
O motivo desses valores no regime mensalista, por exemplo, é que, além da contribuição previdenciária, por meio do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a contratação com carteira assinada é onerada pelos encargos trabalhistas como o salário-educação, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e as contribuições para entidades como Sesi, Senai, Sesc e Senac. Tudo isso tem que sair do bolso do patrão, o que reflete diretamente na capacidade de investimentos da empresa. Lembrando que nem tudo vai para o Governo. Boa parte, são encargos que beneficiam o próprio empregado.
Os altos índices de impostos e encargos alimenta a informalidade no País e prejudica, negativamente, a economia. E, justamente tentando reverter esse quadro, uma das discussões que voltou à tona com a posse da presidente Dilma Rousseff foi a proposta de uma redução escalonada sobre a tributação na folha de pagamento. O corte gradual na alíquota de contribuição previdenciária das empresas, hoje em 20%, chegaria aos 14%, já com diminuição de dois pontos no primeiro ano.
O que tem de ficar claro é que apenas a contribuição patronal referente ao INSS seria reduzida. Todos os outros percentuais continuariam inalterados. Diferente do regime do Simples Nacional – modelo que benefia empresários de microempresas -, que extingue todas as taxas do Governo e baixa o índice da folha de pagamento para 34%. Com essa redução nos encargos trabalhistas, o Governo Federal pretende ampliar o mercado formal de trabalho – estimado em 52% – com o consequente aumento de trabalhadores com carteira assinada. A expectativa é que o índice suba aos 60% no primeiro ano da nova alíquota.
À pedido da FOLHA, o diretor financeiro do Sindicato das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações, Pesquisas e de Serviços Contábeis de Londrina (Sescap), Euclides Nandes Correia, fez uma simulação de quanto pagaria o empregador com o INSS em 20% e também em 14%. ”Pegando como base um salário de mensalista no valor de R$ 1 mil, os 67,2% de tributos dão hoje um custo total na folha de R$ 1.672,00. Com a queda, o encargos iriam para 60,03%, o que vai representar um custo na folha de R$ 1.600,30. Uma redução de R$ 71,70 ou 4,29% no custo final”, explica.
A primeira vista não parece ser expressivo, mas quando analisado em valores maiores, pode representar investimentos. ”Um empresa que tem um faturamento de R$ 100 mil mensais, terá uma economia de R$ 4.290,00. Isso pode ser a contratação de mais duas pessoas com o mesmo salário de R$ 1 mil, acrescentando os tributos”, exemplifica Correia. Ainda que o empresário não faça nenhuma contratação, o dinheiro extra possibilita uma melhor saúde financeira ao negócio. ”A diminuição dos custos reflete no aumento dos lucros, que consequentemente gera mais arrecadação de Imposto de Renda. Tudo isso gera crescimento da economia.”
Simples Nacional
A Câmara dos Deputados desarquivou o Projeto de Lei Complementar (PLP) 591/10 que amplia o teto do Simples Nacional. Entre as alterações previstas no texto está o aumento do limite da receita bruta anual para inclusão no Simples Nacional das microempresas, de R$ 240 mil para R$ 360 mil; das pequenas empresas, de R$ 2,4 milhões para R$ 3,6 milhões; e a do Empreendedor Individual, de R$ 36 mil para R$ 48 mil.
Empresários não suportam carga e demitem
Proprietário de um restaurante há 15 anos, Miguel Hiroshi Masuda chegou a ter vinte funcionários sob seu comando. Quadro que hoje está reduzido para menos da metade. ”Já temos a dificuldade em encontrar mão de obra qualificada. Mas manter um empregado é muito caro. São vários impostos que temos que pagar. Isso fez com que eu mudasse várias coisas no restaurante, como o sistema à la carte que agora é buffet”, diz ele, que conta atualmente com nove funcionários.
Além da redução, o empresário tomou outras medidas como o aumento do número de fornos e micro-ondas para reduzir o número de cozinheiros. ”Penso ainda em colocar uma máquina de refrigerantes para que as pessoas se sirvam”, revela. ”Não é que eu queira reduzir ainda mais o quadro ou deixar de contratar. Mas nossa faturamento fica muito comprometido com a folha de pagamento, pois temos um custo operacional que não tem como mexer”, referindo-se às taxas de luz, água, aluguel e manutenção.
O anúncio da proposta de diminuição de encargos na previdência, entretanto, não traz muitas expectativas a Masuda. ”A questão vai muito além do INSS. Os tributos que pagamos sobre as mercadorias, impostos sobre serviço, são muito pesados”, enumera. Sua empresa está classificada no Simples Nacional e, com isso, ele diz que consegue manter-se na ativa. ”Se fosse o regime normal, provavelmente já teria fechado o negócio e ido trabalhar no Japão.”
Outro empresário que enxurgou radicalmente o quadro de funcionários foi Luiz Santos, dono de uma floricultura há 26 anos. ”Cheguei a ter 13 funcionários, porém, nos últimos dez anos tive de dispensar quase todos. Hoje, além da minha esposa e filho, tenho apenas dois empregados, quando precisaria de, no mínimo, mais dois ou três. Todos têm de trabalhar dobrado, mas foi uma despesa que não consegui manter”, lamenta, reforçando que sua história não é pontual: ”Vários amigos estão na mesma situação. Desonerar a folha nos dará forças para continuar trabalhando”, calcula.(M.T.)
Registro é sinônimo de segurança
Na fila da Delegacia Regional do Trabalho não é difícil encontrar quem esteja buscando a carteira de trabalho, sobretudo jovens atrás do primeiro emprego formal. Cursando a faculdade de Farmácia, Igor Yukio, de 18 anos, apesar de nunca ter trabalhado, pensa em conseguir algo o quanto antes para ajudar na mensalidade da graduação. ”Escolhi estudar à noite justamente para poder trabalhar. Mesmo ainda não tendo nada em vista, quando conseguir algo, já estarei com a carteira nas mãos. Pretendo um emprego com registro, que dá mais segurança e garante meus direitos.”
Mais jovem ainda, porém, não menos esperançoso, Edson Ribeiro da Silva, de 14 anos, já vislumbra um emprego com carteira assinada. ”Comecei um curso de auxiliar administrativo para me qualificar. Um amigo de lá já conseguiu um emprego. Já vim garantir minha carteira também, caso eu tenha a mesma sorte”, conta ele, que costuma ajudar o pai com caminhão de mudanças. ”Agora quero um emprego fixo, com carteira assinada. Sei que vou conseguir logo”, diz confiante.
Quem já trabalhou informalmente sabe o quanto a situação é prejudicial. Fernanda Carvalho Bacinello de Campos, 29 anos, vai começar num emprego novo em março e se apressou em tirar a segunda via do documento. ”Já trabalhei sem registro e na rescisão acabei perdendo parte dos meus direitos”, apontou. A auxiliar Vanessa dos Santos Ferreira, de 26 anos, teve o documento furtado e também não perdeu tempo. ”Já trabalhei sem carteira assinada e só eu sei o quanto perdi. O registro é um direito e uma garantia de todo trabalhador.” (M.T.)
Impacto nos cofres da Previdência |
Só a simples mensão de mexer na tributação da folha de pagamento repercutiu fortemente entre defensores e oposionistas. Um dos pontos críticos é o temor sobre os efeitos diretos no financiamento das aposentadorias, pensões e auxílios, já que haveria uma perda de arrecadação para os cofres do INSS na ordem de R$ 9,2 bilhões apenas no primeiro ano. Somente com este tributo arrecada-se o equivalente a mais de 8% da renda nacional. A compensação deveria ser feita com o corte de despesas permanentes, elevação ou até mesmo criação de um novo imposto ou contribuição, como a temida Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Ricardo Barros, secretário estadual da Indústria, Comércio e Assunto do Mercosul (Seim), concorda que desonerar a folha favoreceria a formalização de empregos, embora alerta sobre a necessidade de haver compensações. ”Além da redução dos encargos, o que devemos discutir é para que haja uma transferência desses tributos. Hoje, estes são vinculados ao número de empregados, quando poderiam ser ao faturamento”, defende. Ele argumenta que empresas que exigem grande quantidade de mão de obra, compromente grande parte do que faturam com a folha. ”Ao contrário de empresas de alta tecnologia, por exemplo, que usam apenas de 10% a 20% de mão de obra e, em grande parte, têm faturamento alto.” Neste ponto, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) concorda, embora não acredite em ampliação da formalização. Conforme o presidente da CUT no Paraná, Roni Barbosa, as empresas que mais faturam, na maioria das vezes, são as que menos contribuem com tributos. ”O atual modelo de tributação onera as empresas que mais empregam. Não acredito, entretanto, que a diminuição dos encargos tenha impacto relevante na formalização. Mas sempre vemos com bons olhos a diminuição da carga tributária”, comenta Barbosa, advertindo também sobre a necessidade de haver outra fonte para auxiliar a Previdência. O mesmo acredita o economista do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), Cid Cordeiro. Para ele, há uma crença no País de que a redução dos encargos sociais aumentaria a formalização de empregos. ”Exemplo disso é que nos últimos anos não houve redução de encargos nem da carga tributária e o País bateu recordes de carteiras assinadas. O crescimento econômico teve ligação com o aumento das linhas de crédito, aumento do salário mínimo e vários programas do Governo Federal.” (M.T.)
Marian Trigueiros |