Delfim quer política industrial para controlar déficit em conta corrente
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Cibelle Bouças
A classificação de grau de investimento concedido ao Brasil pela agência Standard & Poors na semana passada não altera as expectativas de expansão da economia doméstica em 2008, mas aumenta o risco de uma crise no balanço de pagamentos nos próximos dois anos. A avaliação é consenso entre Antonio Delfim Neto, professor emérito da Faculdade de Economia e Administração da USP e ex-ministro da Fazenda e o também ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser Pereira.
De acordo com os economistas, o novo status financeiro reduz o risco Brasil e atrai mais investimento estrangeiro ao país, o que vai contribuir para uma nova valorização do real frente ao dólar. A conseqüência, se não houver intervenção do governo para a arbitragem do câmbio, será um forte aumento do déficit em transações correntes. "A supervalorização da moeda sempre terminou de forma desagradável e vai terminar de forma desagradável de novo. Vamos colher os maus resultados da valorização do real daqui a algum tempo", afirmou Delfim.
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Bresser acrescentou que a decisão do banco central americano de reduzir sua taxa de juros em 0,25 ponto percentual na semana passada também contribuiu para tornar o Brasil mais atrativo aos investidores estrangeiros e mais sujeito à apreciação cambial. Para ele, o grau de investimento pode permitir que empresas que hoje têm dificuldades de obter crédito tenham facilidade para se financiarem.
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O efeito macroeconômico, contudo, pode ser a elevação do déficit em transações correntes. "O Brasil está voltando a se endividar e o déficit em transações correntes é um sinal disso. Se esse déficit se agravar, a situação do país pode se fragilizar externamente e gerar uma crise de balança de pagamentos, como ocorreu em 1998 e 2002", afirmou Bresser. A conseqüência de uma crise dessa natureza, observou, seria o derretimento das reservas internacionais e inflação.
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Os economistas acreditam que, para evitar a evolução desse quadro, seria necessário que o governo fizesse mais cortes nos gastos públicos e reduzisse a taxa de juros, como meio de evitar uma supervalorização do real. Para Delfim, também se faz necessário desenvolver uma política industrial que desonere as exportações, para melhorar o saldo da balança comercial. "Se for criada uma política industrial exportadora, a economia vai continuar crescendo sem problemas", afirmou.
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Para Delfim, a economia doméstica deve manter neste ano o mesmo ritmo de crescimento observado no primeiro trimestre, repetindo um aumento do PIB próximo a 5%. Para ele, a obtenção do grau de investimento não traz mudanças significativas ao mercado interno. "É apenas um selo de que estamos em uma situação melhor, mas muito dos investimentos já foram feitos e estão precificados no investment grade", disse. Para ele, a forte valorização nos papéis de construtoras e empresas de varejo na Bovespa na semana passada, é mais um efeito da expansão da economia interna do que resultado da nova classificação.
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Delfim não considera que haja excesso de demanda no país, o que causaria pressão inflacionária. Para ele, o aumento nos preços do varejo é na verdade uma mudança de preços relativos, uma acomodação dos preços em relação ao cenário internacional. "O mecanismo que promove a inflação é quando o salário real cresce mais que a produtividade e não é isso que acontece", afirmou Delfim. Os economistas participaram do seminário "Repensando o futuro", realizado ontem pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP) e pela Ordem dos Economistas do Brasil (OEB), em São Paulo, em comemoração aos 80 anos do ex-ministro da Fazenda.
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