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Aonde vai o dinheiro do contribuinte?

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por Lara Ely

No dia 15 de março comemorou-se o Dia do Consumidor, um público que está cada dia mais exigente em relação aos seus objetivos. Justo em época de crise, onde a maioria dos consumidores brasileiros estão enxugando o orçamento e fugindo dos gastos excessivos, o governo brasileiro está aumentando seu consumo, conforme indicou pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada na semana passada.
O estudo mostrou que, entre os diversos setores da economia, apenas os gastos da administração pública demonstram crescimento no Produto Interno Bruto (PIB), com um percentual de 0,5%, em relação aos três meses anteriores. Em função da crise, que se agravou a partir de setembro passado, houve queda nas taxas de todos os setores que compõem o PIB, no quarto trimestre de 2008.
A reportagem procurou diversos órgãos representantes do governo federal para explicar o que representa essa alta. Entre eles, a Receita Federal, a Controladoria-Geral da União, a Presidência da República, o Ministério do Planejamento, além de institutos de pesquisas como o próprio IBGE, o Dieese e o Departamento de Pesquisa da Faculdade de Economia da Ufrgs. Nenhum deles, no entanto, esclarece a situação, demonstrando desconhecimento dos dados ou justificando, por meio de assessorias, que não há posição oficial a respeito do assunto.
No Ministério do Planejamento, a informação é de que o ministro Paulo Bernardo Silva não irá se pronunciar sobre o aumento dos gastos até o final do mês, quando se reunirá com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para analisar os dados referentes ao tema. Foi informado ainda que a Secretaria de Orçamento e Finanças está trabalhando para definir dados que irão subsidiar o encontro.
Segundo o contador e vice-presidente técnico do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRC-RS), Antônio Carlos de Castro Palácios, essa questão envolve um componente político muito forte. "O governo faz questão de manter a população tranquila e, muitas vezes, não tem base concreta das informações." Para ele, o próprio governo foi pego de surpresa com esses dados, e as perdas ocorrem em várias áreas de arrecadação. "Temos um problema de falta de acesso a informações confiáveis", afirmou Palácios.
Além da inexistência de informações, a administração pública é permeada de contradições que dificultam o entendimento acerca de sua transparência. Ao comparar notícias recentes sobre o governo, essa contradição fica evidente. Ao contrário da maioria dos cidadãos brasileiros, os deputados federais têm gerência sobre os próprios salários e quiseram aumentá-los de R$ 16,5 mil para R$ 24,5 mil, suspendendo o repasse da verba indenizatória, no valor de R$ 15 mil mensais. Votado na semana passada, o projeto não foi aprovado por falta de consenso entre os componentes da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Enquanto isso, o investimento em educação representa apenas 4% do PIB nacional.

País deveria investir mais em energia e educação

O economista Leandro Antônio de Lemos, coordenador do curso de Ciências Econômicas da Pucrs, afirmou que o aumento do consumo da administração pública é resultado das iniciativas do governo em tentar conter o avanço da crise. Segundo ele, os gastos são para estimular a economia. "Neste momento, a maior parte dos países estão aumentando os seus orçamentos para compensar a queda de consumo privado e a baixa no comércio internacional", afirmou ele.
Na visão de Lemos, examinar a qualidade desses custos é essencial. Caso o destino dessa verba seja com o custeio da máquina pública, então ele não traz impacto positivo para a economia. "Deveria investir menos em processos internos e direcionar mais para áreas como infraestrutura, energia e educação", explicou.
Nesse sentido, os altos juros para os consumidores e investidores representam um dos piores problemas do sistema econômico atual. "O governo deve baixar o custo do crédito rapidamente, senão estaremos em um ciclo de recessão", afirmou. Se continuar nesse ritmo, apresentando políticas ineficazes que deixam a situação ainda mais dramática, é possível que esse primeiro trimestre de 2009 também tenha o PIB negativo, sendo o segundo trimestre seguido com baixo crescimento. Nesse caso, explica Lemos, o Brasil entra em estado de recessão econômica.
Lemos argumenta que o diagnóstico equivocado do governo em relação à crise deve-se a uma visão ortodoxa do modelo keynesiano. "Entende-se que há um desaquecimento da economia, e em relação a isso, é equivocado pensar que, ao gastar mais, o Estado fará a reversão desses resultados. O governo está atuando com medidas clássicas, quando na verdade o problema está no sistema produtivo e monetário do País", critica.

Mecanismos de transparência e controle social trazem benefícios à população

O gerenciamento das contas públicas é um desafio que toma maiores proporções em tempos de crise. Dois especialistas em contabilidade pública foram consultados para diagnosticar qual a forma mais eficiente de gerir as finanças da administração brasileira e de que maneira o cidadão brasileiro pode estar mais atento à fiscalização dessas contas.
Os contadores Manuel Salgueiro Rodrigues Júnior e Adriana Oliveira Nogueira, ambos auditores internos na Controladoria-Geral do Estado do Ceará e professores universitários, defendem que, além da atenção máxima à questão ética, é fundamental manter alguns princípios básicos. Entre eles, identificar as necessidades prioritárias junto à população, dar transparência aos atos realizados e propiciar condições para a população acompanhar se as ações do governo estão de acordo com suas ansiedades podem ajudar a tornar uma gestão eficiente.
Com a rede mundial de computadores, os dados sobre as finanças do País ficam mais visíveis devido à implantação do Portal da Transparência em várias esferas governamentais. Para os entrevistados, a população deve solicitar que o governo crie esses mecanismos de transparência e controle social para efetivar tal cobrança. Eles ressaltam que é necessário um processo de conscientização e educação da população, para tornar o controle social um hábito.
O benefício que a transparência pode acarretar para os cidadãos é identificar se as ações planejadas para sanar as necessidades priorizadas pela população foram executadas. "Os mecanismos de transparência e controle devem possibilitar que a população saiba, por exemplo, se a ação de revitalização de um determinado rio foi contemplada no orçamento, se foi executada, e, se não foi, qual o motivo", afirma Rodrigues Junior.

Porto Alegre dá exemplo de contenção de despesas

Na contramão do governo federal, a prefeitura municipal de Porto Alegre buscou equilibrar suas finanças com programas de controle de gastos. De 2005 a 2008, a otimização das despesas assegurou à prefeitura uma economia superior a R$ 75 milhões.
O trabalho recorreu a ferramentas de boas práticas e mudanças de atividades e rotinas para eliminar o desperdício do dia-a-dia. A iniciativa transcendeu o enfoque nos tributos e atuou na qualificação da gestão na área da Fazenda, estendendo-se a órgãos de grande repercussão nos serviços e nas finanças, como os departamentos municipais de Habitação (Demhab), de Água e Esgotos (Dmae) e de Limpeza Urbana (DMLU), a Proguradoria-Geral do Município (PGM) e o Gabinete de Programação Orçamentária (GPO).
Perseguida nas despesas públicas, a redução de gastos é gerida por meio do programa Mais Recursos, Mais Serviços, do Modelo de Gestão da prefeitura. Para realizá-lo, a equipe da Secretaria Municipal da Fazenda conduz ações de aprimoramento da arrecadação tributária, otimização dos gastos, atualização e modernização cadastrais, melhoria da cobrança da dívida ativa e aperfeiçoamento do atendimento ao público.
A intensa mobilização teve como principal conquista a retomada e a consequente consolidação do equilíbrio fiscal nas contas municipais, resultando em quatro anos consecutivos de números positivos.
Exemplos de otimização dos gastos podem ser identificados em aspectos como a telefonia fixa, consumo de água, energia elétrica ou locação de carros, por exemplo. Na telefonia, o gasto em um ano reduziu em 13%, resultado da padronização do controle das contas e da migração da rede analógica para a digital. No consumo de água dos órgãos da prefeitura, houve redução de 253 mil metros cúbicos equivalente ao consumo de 1.473 famílias de quatro pessoas, e diminuição de 20,8% nos gastos. Além disso, foram implantados ramais de controle e treinadas equipes operacionais das secretarias para identificarem vazamentos.
Já em relação à energia elétrica, entre 2005 e 2008 a despesa foi reduzida em 7,3% sobre 2004, representando ganho de R$ 2,7 milhões. Para tanto, foram criados grupos permanentes no Dmae e nas secretarias da Saúde e de Educação, responsáveis por analisar o consumo de energia das unidades de cada órgão e adequar a demanda contratada e a melhor tarifa para o tipo de serviço realizado.
Entre as medidas adotadas pela prefeitura, houve limitação contratual de 200 horas mensais, desenvolvimento de licitação com lote individual, exigência no edital de veículos do ano (renovação da frota) e melhoria dos controles operacionais. Ações na Fasc permitiram a redução de 34,5% dos valores gastos, comparados ao período anterior ao projeto.

Otimização de recursos atingiu 150% da meta

Com o objetivo de otimizar R$ 50 milhões, a prefeitura bateu em 150% a meta estabelecida ao início do programa Mais Recursos, Mais Serviços. Tendo ultrapassado em R$ 25 milhões o objetivo inicial, os números obtidos foram bastante significativos como resultado de conscientização de uma metodologia de trabalho, afirmou a gerente do programa, Maria Alice Michelucci. Ela explicou que as metas do gerenciamento matricial da despesa foram renegociadas por fases e que o trabalho foi acompanhado pela equipe do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG).
Foram feitos diagnósticos dos maiores gastos dentro de cada área, e grupos de trabalho específicos avaliaram periodicamente, a partir de experiências pontuais, a evolução do orçamento em diversos segmentos. As ações foram desenvolvidas a partir de experiências já existentes nas secretarias. "A partir daí, as iniciativas foram ampliadas, divididas e divulgadas para que as boas ideias não ficassem restritas apenas a uma área", explicou Maria Alice. Para os próximos quatros anos, a prefeitura de Porto Alegre pretende estabelecer novas estratégias.