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Analistas veem alta mais forte de juros para tentar conter inflação

Publicado em:

Correio Braziliense

Aperto maior que o esperado na política monetária mantém crescimento baixo e deve elevar custo dos financiamentos

O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, fará a primeira reunião do ano amanhã e quarta-feira. O consenso entre analistas é de que a elevação de 1,5 ponto percentual, da taxa básica de juros sinalizada na última reunião de 2021, que levaria a Selic para 10,25%, está contratada. A expectativa, no entanto, é de que, ao longo do ano, será necessário um aperto monetário maior do que o esperado no fim de 2021, diante da persistência inflacionária e de um cenário externo mais desfavorável para os países emergentes, com desaceleração global e alta de juros nos países desenvolvidos.

Conforme as novas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) global passará de 5,9%, em 2021, para 4,4%, em 2022. O organismo multilateral demonstrou preocupação com a alta da inflação global e dos juros e reduziu de 1,5% para 0,3% a estimativa de alta do PIB brasileiro neste ano, em linha com a mediana da estimativa do mercado, de 0,29%. Porém, vários bancos preveem queda de até 0,5% do PIB do Brasil, devido, justamente, à perspectiva de juros cada vez mais elevados para combater a inflação.

As estimativas para o custo de vida continuam em alta após a prévia da inflação de janeiro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo — 15 (IPCA-15), subir 0,58%, acima da taxa esperada pelo mercado, de 0,44%. Apesar da desaceleração em relação ao 0,78% de dezembro de 2021, analistas destacam que a carestia continua elevada e disseminada. Nesse cenário, as previsões para a Selic no fim deste ano — cuja mediana do boletim Focus está em 11,75% — estão com viés de alta, ultrapassando 12%.

Efeitos

Para a população, os custos dos juros mais altos são claros: crédito mais escasso e mais caro, o que contribuiu para o endividamento das famílias, que já está em nível recorde na série histórica do BC, iniciada em janeiro de 2005. Em outubro, as dívidas dos brasileiros comprometiam 51,2% da renda disponível, bem acima dos 30% recomendados pelos bancos para os padrões do Brasil, que tem juros bem acima da média global.

Especialistas reforçam que os efeitos da política monetária mais contracionista começaram a ser sentidos na segunda metade de 2021 e podem se estender até 2023, pois o impacto de uma alta nos juros pode levar de seis a nove meses para bater na atividade. O PIB dos segundo e terceiro trimestre de 2021 foram negativos — o que caracteriza uma recessão técnica —, embora as variações ainda tenham sido baixas, de 0,2% e 0,1%, respectivamente.

O cenário externo não deverá contribuir positivamente para a economia brasileira. O conflito entre Rússia e Ucrânia está inflando os preços do barril do petróleo, que chegou a US$ 90 na sexta-feira passada e caminha para os US$ 100, pressionando ainda mais os preços dos combustíveis. E o fato de o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) ter confirmado alta nas taxas de juros a partir de março contribuirá para a desvalorização das moedas dos mercados emergentes, reforçando pressões inflacionárias.

Analistas lembram, ainda, que a esperada descompressão dos preços das commodities no início deste ano não está ocorrendo, e, com isso, os custos no atacado não diminuem. O Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), acelerou de 0,87%, em dezembro, para 1,82%, em janeiro, conforme dados da Fundação Getulio Vargas (FGV) da semana passada.

“A inflação continua persistente e bastante disseminada na economia. O Banco Central vai ter um trabalhão para conseguir cumprir a meta de inflação neste ano”, alerta a economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria. Ela mantém a previsão de alta de 1,5 ponto na Selic na reunião do Copom, mas admite que a previsão de 11,50% para março, que seria mantida até o fim do ano, está “com viés de alta” e deverá ser revisada em breve.

Incertezas

“Há algumas novidades no cenário, como o discurso mais duro do Fed, indicando, pelo menos, quatro altas de juros neste ano. É um quadro diferente e ruim para os países emergentes, principalmente para o Brasil, que vai atravessar um ano eleitoral, cheio de incertezas domésticas”, explica.

Alessandra Ribeiro conta que deve revisar para cima a previsão de 4,6% para a inflação deste ano. “Nessa projeção, não estávamos prevendo novos aumentos na gasolina. Mas com a recente alta nos preços do petróleo e o conflito entre a Rússia e a Ucrânia, há o risco de os combustíveis pressionarem a inflação de forma mais forte do que imaginávamos”, afirma.

Marcos Ross, economista chefe do banco chinês Haitong no Brasil, diz que, depois da alta de 1,5 ponto na Selic em fevereiro, previa um aumento mais brando, de 0,75 ponto, em março. Mas diz que a previsão pode mudar.

“Há quatro desafios que se intensificaram nesse começo de ano: inflação mais alta que o esperado e mais disseminada; deterioração nas contas públicas por conta da PEC dos Combustíveis; ciclo de aperto monetário em outras economias um pouco mais cedo do que o mercado esperava; e aumento da desancoragem das expectativas de inflação para 2022”, afirma. “Com base nisso, a probabilidade do Copom encerrar o ciclo de alta dos juros em março diminuiu.”

“Com juros elevados, em um ambiente de crescimento baixo e a economia andando de lado, o desemprego não cai, os riscos de crédito aumentam e vamos ver a inadimplência crescer”, diz o economista Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). “E, com a Selic cada vez mais alta, a Taxa Referencial (TR) atrelada a inúmeros financiamentos, principalmente o imobiliário, não está mais zerada e o valor das parcelas deve aumentar”, alerta.

A economista Juliana Inhasz, professora e coordenadora da graduação em economia do Insper, reforça que a Selic em dois dígitos tende a elevar os custos de financiamento, principalmente, para quem pretende financiar a casa própria. “O custo efetivo total que, no fim do ano passado estava na casa de 7% a 8% ao ano, hoje, já está entre 9,5% e 10% e pode subir ainda mais. Parece pouco, mas 1,5% a 2% ao mês a mais para quem vai por 30 anos, não é um valor baixo e isso poderá desestimular bastante o mercado imobiliário daqui para frente”, alerta.