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Executivas poderosas têm “maridos do lar”

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Por Carol Hymowitz | Da BusinessWeek

Entre os cerca de 80 clientes que se acotovelam na Bare Escentuals, é fácil identificar Leslie Blodgett. Não são apenas seu salto plataforma de 15 cm e seu vestido que a destacam no shopping de Thousand Oaks, na Califórnia, mas sua autoconfiança. No caso da mulher preocupada em ser velha demais para passar sombra cintilante, Blodgett a estimula a usar o que quiser. Com um hábil golpe de pincel, mostra um novo blush na bochecha de outra cliente. Quando não está atendendo ninguém, volta-se para suas admiradoras.

Blodgett, 49, passou os últimos 18 anos alimentando a Bare Escentuals a partir de uma empresa emergente até um império mundial de cosméticos. Ela vendeu a empresa por US$ 1,7 bilhão para a Shiseido em 2010, mas ainda promove produtos em lojas no mundo inteiro e conversa com as clientes pela internet. Muitas fãs postam mensagens na página de Blodgett no Facebook confessando detalhes sobre sua vida pessoal e sua maquiagem.

Ela apenas gostaria que seu filho de 19 anos, Trent, tivesse contato com ela com a mesma frequência com que tem com o marido dela, Keith. Em 1995, aos 38 anos, ele deixou de fazer comerciais para se dedicar à criação do garoto, liberando Leslie para montar sua empresa. Ela faria tudo outra vez, mas tem ciúmes do relacionamento do marido com o filho. Trent, estudante do segundo ano da faculdade, manda mensagens a seu pai todos os dias, mas fica até uma semana sem escrever para ela.

"Quando eu soube que meu papel era ser a provedora da família, levei isso a sério. Mas tinha ciúme de saber que não estava disponível para nosso filho durante o dia", diz Blodgett. "Keith faz tudo em casa – cozinha, faz consertos, cuida das finanças e do planejamento de férias. Assim, pude trabalhar por muitas horas e me ausentar sabendo que tudo estava bem. Adoro meu trabalho, mas gostaria de ter um pouco mais de equilíbrio."

A queixa de Blodgett está ficando mais comum, na medida em que existe uma geração de provedoras refletindo sobre os sacrifícios que fizeram para ter a carreira que queriam. A exemplo de centenas de milhares de mulheres que abocanharam cargos de direção nas últimas duas décadas, ela logo entendeu o que todo homem com papel de destaque no organograma de uma empresa já sabia: para chegar lá em cima, você precisa de uma esposa. Se essa esposa for, por acaso, um marido, que seja, então.

Quando Carly Fiorina se tornou a primeira principal executiva da Hewlett-Packard, a existência do dono de casa Frank Fiorina, que tinha se aposentado cedo da AT&T para cobrir a carreira dela, era uma minissensação. Atualmente essa distribuição de papéis não é incomum. Sete das dezoito mulheres que são atualmente as principais executivas das 500 maiores empresas do mundo, segundo a revista "Fortune" – como Ursula Burns, da Xerox, Indra Nooyi, da PepsiCo, e Angela Braly, da WellPoint – têm, ou tiveram em algum momento, um marido que ficava em casa. O mesmo acontece com uma miríade de executivas de empresas menores e com mulheres que ocupam altos cargos.

Essa troca de papéis está ocorrendo cada vez mais, em um momento em que as mulheres ultrapassam os homens no mercado de trabalho. Elas ocupam atualmente a maioria dos empregos nos Estados Unidos, inclusive 51,4% de cargos de direção e dos que demandam alta especialização, segundo dados do Departamento de Censo dos Estados Unidos. Cerca de 23% das esposas estão ganhando mais que seus maridos, segundo estudo de 2010 do Pew Research Center. E essa tendência salarial é mais drástica entre os mais jovens. Mulheres de 30 anos ou menos ganham mais, em média, do que seus colegas homens em todas as maiores cidades dos EUA, com exceção de três.

Durante a recente recessão, para cada mulher, três homens tinham perdido o emprego. Muitos pais de família desempregados, vítimas de demissões na indústria de transformação e no setor financeiro, acabaram cuidando dos filhos em horário integral enquanto suas esposas são a principal fonte de renda familiar. O número de homens americanos que cuidam regularmente dos filhos de menos de 5 anos aumentou para 32% em 2010, em relação aos 19% de 1988, segundo o Censo. Entre os pais com filhos em idade pré-escolar, um em cada cinco atuou como o principal responsável por sua criação. Mesmo com a disseminação dessa tendência, os estigmas persistem. O pai que cuida da casa é às vezes visto como um sujeito que vive às custas da mulher. Em resposta, eles lançaram uma série de grupos de apoio e blogs para se defender. "Os homens estão vendo, de repente, o que as mulheres passaram ao longo de toda a história", diz Linda R. Hirshman, advogada e autora de "Get to Work", que desafia mães que ficam em casa a conquistar empregos remunerados e a insistir que seus maridos dividam metade das tarefas de casa.

A tendência dos maridos que ficam em casa é, em parte, uma coisa boa. "Ao nadar contra a corrente, os homens têm de ampliar suas capacidades como responsáveis pelos filhos e as mulheres podem avançar", observa Stephanie Coontz, professora de estudos da família da Faculdade Estadual de Evergreen de Olympia, Washington. Mas ela chama a atenção para outro fator: uma parceria entre duas pessoas de carreira é quase impossível. "Os empregos de primeiro escalão exigem tanto tempo e são tão difíceis que não dá para ter dois cônjuges à frente deles, mantendo o casamento e a família". Isso explica por que as mulheres ainda são minoria (14%, segundo a Catalyst) a ocupar altos cargos executivos, apesar de perfazerem a maior parte da força de trabalho. Quando chegam ao nível executivo que exige presença e empenho constantes, "são as mulheres que mais frequentemente atribuem à família maior prioridade", diz Ken Matos, diretor-sênior do Families and Work Institute de Nova York.

Isso pode explicar também por que as livrarias estão cheias de lançamentos para mulheres ambiciosas. Alguns, como "Get to Work", recomendam que as mulheres se casem com homens que não se importam de ficar em casa ou com os mais velhos, que estarão preparados para se aposentar quando a carreira delas estiver em ascensão. É indiscutível que os casais estão negociando cada vez mais qual das carreiras terá prioridade antes de fundar uma família.

"Sua mulher está prestes a decolar na empresa e você precisa sair de seu caminho." É isso que Ken Gladden diz ter ouvido de seu chefe pouco antes de a mulher dele, Dawn Lepore, ter sido a primeira a ocupar o cargo de diretora de informática da Charles Schwab, em 1994. Ele era vice-presidente de sistemas de computação da Schwab. A promoção significava que ela se tornaria sua chefe. "Casei com alguém de uma classe superior à minha", brinca. Gladden mudou para um emprego na Visa e quando o filho do casal, Andrew, nasceu quatro anos depois, ele deixou de trabalhar definitivamente. Ser um pai de período integral não foi o maior ajuste que Gladden fez pela carreira de Dawn. A concessão principal ocorreu mais tarde, quando a drugstore.com, sediada em Seattle, convocou-a para comandar a companhia em 2004.

Gladden tinha morado na região conhecida como Área da Baía de São Francisco por 25 anos e não queria sair de lá. Ele recusou a sugestão de Dawn de que ela viajaria todo dia entre uma cidade e outra e, depois de longas discussões, concordou em se mudar sob a condição de manterem a casa na Área da Baía. Eles ainda voltam lá para passar os feriados. "Você tem de conseguir dizer ‘minha mulher é a provedora, é a mais poderosa’, e encarar bem isso. Mas você precisa também defender seus próprios interesses", diz ele, que abriu uma empresa em casa que desenvolve software para escolas.

Atualmente consultora de empresas iniciantes e diretora da EBay, Dawn ainda viaja frequentemente. Quando um executivo lhe disse que "ter um marido que fica em casa torna fácil para ela ser uma principal executiva", ela respondeu "Não, ele torna isso possível". Há um preço a pagar, adverte ela: "Perdi tanta coisa com meus filhos – peças de escola, recitais e, simplesmente, vê-los todo dia".

A exemplo de Gladden, Matt Schneider, 36, é um pai que fica em casa. Ex-diretor de tecnologia e professor, ele cuida de seus filhos Max e Sam, de 6 e 3 anos respectivamente, enquanto sua mulher, Priyanka, também de 36, trabalha dez horas por dia como diretora operacional de uma empresa iniciante de administração de imóveis de Manhattan. Ele se sente "privilegiado", segundo diz, de estar com as crianças em período integral, embora admita que cuidar dos filhos e fazer as tarefas de casa pode ser entediante. Ele usa todos os minutos em que Sam está na escola para expandir o Grupo NYC DADS do qual é cofundador, de 450 membros. Eles se reúnem para seus filhos brincarem juntos e para discutir os cuidados da criação, assumindo sua condição de pais que ficam em casa. "É o nome dela no contracheque. Mas ela não ganharia o que ganha se eu não estivesse fazendo o que faço", diz.

Os países escandinavos são líderes em manter as mães no emprego. "Esses países possibilitaram uma melhor divisão de trabalho por meio de políticas que estimulam tanto a participação das mulheres no mercado de trabalho quanto a dos homens na família", diz Saadia Zahidi, coautora do Relatório Mundial de Conflitos de Gênero do Fórum Econômico Mundial. "Não há motivo para as mulheres se sentirem culpadas pelo sucesso, mas deveria haver um caminho de satisfação profissional e pessoal para todos", diz Hirshman, autora de "Get to Work". Kathleen Christensen concorda. Diretora da Fundação Alfred P. Sloan, ela diz que voltamos à década de 1950, com a diferença que "em vez de Maria em casa, é João. Mas é um fazendo 100% do trabalho fora de casa e o outro dentro."

Os filhos de Dawn têm um ponto de vista diferente sobre o potencial de homens e mulheres. Quando uma amiga de sua filha disse que pai é o que vai para o escritório todos os dias, lembra a executiva, "Elizabeth respondeu: ‘Deixa de ser boba, pai é o que fica em casa’." (Tradução de Rachel Warszawski)