Cipoal de impostos aumenta custos de empresas no Brasil
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Portal Fenacon
Valor Econômico
Por Marta Watanabe | De São Paulo
A percepção de instabilidade das normas tributárias e de seu impacto no custo parece generalizada. Há pouco mais de um mês, Tarek Farahat, vice-presidente da Procter & Gamble e chefe das operações no Brasil, disse em seminário na França que as empresas gastam entre 2% e 6% da receita bruta para gerenciar a complexidade fiscal brasileira. A cada dia, disse ele, surgem 40 mudanças na regulamentação fiscal.
A pesquisa da PricewaterhouseCoopers mostra que o ICMS, PIS e Cofins consomem 1.370 horas das 2.600 necessárias para o cumprimento das obrigações tributárias. Carlos Iacia, diretor da PricewaterhouseCoopers, conta que o Brasil manteve o número de horas necessárias para o tema já apontado pela mesma pesquisa em 2006. Não houve piora, mas também não houve nenhum avanço, apesar de todas as discussões de reforma tributária dos últimos anos. Para ele, o problema não se resume apenas ao custo sobre lucro ou faturamento no cumprimento das obrigações tributárias. Há ainda a questão da insegurança jurídica, principalmente em relação ao ICMS que, além de alvo de constantes alterações, tem sido instrumento de guerra fiscal entre os Estados. As empresas, diz, aproveitam benefícios oferecidos legalmente e correm o risco de ter o incentivo invalidado pelo Judiciário.
Pesquisa mostra que país tem uma das maiores cargas tributárias sobre lucro
Uma pesquisa realizada pela Grant Thornton com 19 países mostra que o Brasil é um dos países com maior carga tributária sobre o lucro. Segundo o levantamento, o Brasil tem a terceira maior cobrança sobre o lucro contábil, com carga de 32,5%, perdendo somente para o Japão e os Estados Unidos. O país asiático tem carga de 42,1% e os EUA, 34,2%.
A ideia da pesquisa foi comparar a carga tributária utilizando não apenas as alíquotas nominais de impostos, mas seu impacto efetivo sobre os ganhos. Para isso calculou-se em cada país o cálculo sobre lucro numa companhia hipotética com 1.050 empregados e US$ 20 milhões em lucro contábil antes dos impostos. A análise levou em consideração a tributação sobre lucro, incluindo taxas e cobranças de todas as esferas de governo. Considerou-se que a indústria não tem operações fora de seu país e não foram levados em conta impacto de ganhos ou perdas cambiais ou mesmo de valores cobrados no comércio intracompanhia.
No caso do Japão, o levantamento ainda não contabiliza a redução de carga tributária anunciada após o terremoto no início do ano. No cálculo dos Estados Unidos também foi desconsiderado um crédito de âmbito federal que reduz a carga tributária americana sobre lucro.
Na classificação da pesquisa, logo depois do Brasil, a França ficou com a quarta carga maior, com 31,5% e a Alemanha, com 31,1%. Os países com menor carga sobre o lucro contábil, segundo o levantamento, foram Rússia (18,9%), Cingapura (16,8%) e Irlanda (12,6%).
A pesquisa leva em consideração que a redução de carga tributária sobre lucro é uma forma utilizada pelos diversos países como forma de atração de investimentos diretos.
Fernando Lima, sócio da área tributária da Grant Thornton Brasil, lembra que no caso brasileiro levou-se em consideração não só o Imposto de Renda (IR) como também a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Juntos, os dois tributos somam 34% sobre o lucro.
Lima argumenta, porém, que a carga de 32,5% sobre lucro indicada no levantamento é uma média. Na verdade, diz, essa carga pode ser reduzida consideravelmente com o uso de incentivos fiscais. Ele exemplifica com a Zona Franca de Manaus e outras áreas incentivadas, que utilizam uma base diferenciada para o Imposto de Renda e permite uma alíquota efetiva menor. O consultor lembra também que há outros incentivos, como o da inovação, no qual ao menos parte dos valores aplicados em inovação, pesquisa e desenvolvimento podem ser abatidos de tributos devidos ao governo federal. O investidor, diz, deve analisar a carga tributária e os benefícios oferecidos a cada setor ou atividade industrial. (MW)
De cada R$ 100 que a indústria de copos e utensílios de vidro Nadir Figueiredo fatura, pouco mais de R$ 40 são para pagar tributos. E de cada R$ 100 recolhidos em impostos e contribuições, outros R$ 2,50 são gastos com a estrutura necessária para cumprir obrigações tributárias, como o envio de declarações, acompanhamento de mudanças de legislação e controle de tributos devidos e já recolhidos.
"Gastamos cerca de 1% do faturamento para manter essa estrutura", diz Raul Antonio de Paula e Silva, primeiro secretário do conselho de administração da Nadir Figueiredo. "Isso é muito alto", avalia. "Na Argentina o custo tributário não chega à metade do que representa no Brasil. Na Bélgica, é menos de 20%", completa.
A Nadir Figueiredo é só um exemplo de empresa que perde parte importante de sua margem com gastos para conseguir cumprir todas as obrigações tributárias. Pesquisa da PricewaterhouseCoopers feita em 183 países mostra que o Brasil é disparado o local onde mais horas são gastas para o cumprimento de obrigações tributárias. São 2.600 horas, diante de uma média de 282 horas. Na Bolívia, segundo lugar na classificação, é preciso 1.080 horas.
O frigorífico JBS mantém cerca de 150 pessoas para conseguir cumprir as obrigações tributárias. "Não são pessoas que dão prejuízo, mas elas não agregam valor à empresa", diz Francisco de Assis e Silva, diretor-executivo de relações institucionais da companhia.
Cerca de 150 pessoas num total de 45 mil funcionários do grupo JBS parece pouco, diz o diretor. Mas o custo de manutenção dessa estrutura tributária representa 1% do lucro da empresa. O custo, diz, é considerado pesado dentro de um mercado altamente competitivo.
O diretor da JBS lembra ainda que o cálculo leva em consideração as 35 unidades de negócios que o frigorífico mantém espalhadas em 11 Estados. Em cada uma das unidades há pelo menos duas pessoas para controlar principalmente as mudanças de legislação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e manter a documentação em ordem. A conta estima apenas os profissionais diretamente ligados à área técnica de impostos. Considerando também a equipe de suporte que permite o controle informatizado de dados e as emissões de certidões, notas e outros documentos, o número, diz o diretor, sobe para dez pessoas por unidade de negócio.
Mais do que o sobrenome em comum, Silva, da Nadir, e Silva, da JBS, têm opinião semelhante sobre quais impostos são mais problemáticos: os chamados tributos indiretos. O primeiro tributo que demanda maior controle é quase sempre o ICMS, legislado de forma diversa pelos 26 Estados mais o Distrito Federal. Além do ICMS há também o PIS e a Cofins, duas contribuições que, alvo de alterações na última década, são cobradas sob diversas alíquotas, a despeito de terem um só ente arrecadador: o governo federal.
Silva, da Nadir, diz que mantém seis pessoas somente para cuidar dos indiretos ICMS, PIS e Cofins. A fabricante de copos lida com várias alíquotas de ICMS, que variam de 4% a 18% conforme o Estado e o tipo de operação. A substituição tributária, forma de cobrança pela qual o imposto devido pelo varejo é antecipado pela indústria, acabou trazendo mais complexidade ao sistema. Segundo o executivo da Nadir a nova sistemática passou a repercutir no preço de negociação com os grandes varejistas.
O sistema hoje, diz, faz as empresas suportarem custos de fiscalização que seriam do Estado e o desenvolvimento tecnológico não diminuiu a burocracia.
Atualmente, lembra Silva, da Nadir, as exportações representam menos de 10% da receita da empresa. Quando as vendas ao exterior aumentam, a empresa desloca mais pessoas para os tributos indiretos. Isso é necessário porque aumenta a necessidade de controlar a contabilização dos créditos de ICMS, PIS e Cofins.
Como as exportações são livres dos três tributos, as empresas podem acumular os créditos dos tributos pagos na compra de insumos. Outras dez pessoas, diz o executivo da indústria de copos, dedicam cerca de 40% de seu tempo para outros tributos, como IR, INSS, FGTS, da esfera federal, e ISS cobrado pelos municípios. Silva, da Nadir, não chega a contabilizar nos seus custos a necessidade de contratação de escritórios de advocacia e auditorias.
Para Silva, da JBS, o problema não se resume ao controle de créditos, mas à diversidade e mudança nas normas. "As pessoas dormem com uma legislação e acordam com outra. É uma situação caótica, principalmente de ICMS."