Paraísos fiscais: listar para proteger
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Portal Fenacon
Jonas Lopes de C. Neto
Dados divulgados pelo Banco Central mostram que o principal país a investir no Brasil em 2010 foi Luxemburgo: de lá saíram US$ 8,63 bilhões, seguido pelos Países Baixos, que investiram US$ 6,69 bilhões. Em terceiro lugar na lista de investidores brasileiros, aparece a Suíça, com US$ 6,43 bilhões investidos. Alguns chegam a dizer que o dinheiro estaria voltando de países considerados pela Receita Federal como paraísos fiscais – países com baixa tributação sobre a renda. Mas vale ressaltar que esses países não figuram como paraísos fiscais. Estes países se manifestaram contra sua inclusão na nova lista de 14 novos paraísos fiscais divulgada pela Receita em junho do ano passado e conseguiram ficar de fora da lista brasileira. Aliás, vale ressaltar que somente a Suiça chegou a figurar na lista de paraísos fiscais. Luxemburgo e Países Baixos foram considerados como países com regimes fiscais privilegiados, mas assim como Suíça e Holanda, conseguiram ser excluídos. E a lista final ficou com 64 países, 11 a mais do que na última atualização, ocorrida em 2002. Mas o interessante é que investidores que mantinham recursos aplicados nesses locais podem ter optado por investir no Brasil em 2010. O que estaria por trás deste movimento? Pela definição, paraísos fiscais são aqueles países que têm tributação de renda inferior a 20% e trabalham com sigilo societário, tendo uma legislação que não permite saber quem são os proprietários ou sócios de empresas. Deste modo, as operações realizadas do Brasil com "pessoas físicas ou jurídicas" dos países listados têm uma tributação de 25% nas remessas a título de ganho de capital e a título de prestação de serviço. Normalmente o imposto cobrado nessas operações é de 15%. Outra sanção do governo brasileiro é a aplicação da regra dos chamados preços de transferência. Essa regra visa punir operações de superfaturamento de operações de vendas entre empresas vinculadas, deixando a maior parte do lucro da holding no país de mais baixa tributação. A aplicação no caso de paraísos fiscais vale também para operações entre empresas que, por conta da regra de sigilo comercial, não têm a vinculação formal. Aumentando a lista dos países que se enquadram na categoria de "paraíso fiscal", o Brasil está protegendo sua economia. Segundo uma pesquisa feita em 2009, os paraísos fiscais recebem 70% dos investimentos brasileiros no exterior. Os investimentos diretos de empresas brasileiras em outros países chegaram a US$ 103,9 bilhões em 2007 – último ano de que se dispõe de dados consolidados pelo Banco Central. Metade desse valor foi cadastrada nas Bahamas e nas Ilhas Cayman. Pessoas físicas também têm contas correntes nesses países. Dos US$ 22 bilhões que brasileiros depositaram no exterior, 34% passaram pelos cofres de instituições com sede em paraísos fiscais. A nova listagem divulgada pela Receita Federal no ano passado mostrou também que o Brasil está se adequando à tendência mundial de cobrar maior transparência no sistema financeiro internacional – tema que foi debatido durante encontro do G-20 em Londres, em abril de 2009. Na reunião, os paraísos fiscais foram apontados como vilões da economia mundial e discutiu-se, inclusive, a aplicação de sanções contra aqueles que se negarem a reformular sua legislação bancária. Nos Estados Unidos, por exemplo, de acordo com um estudo feito no fim de 2008, há perda de arrecadação da ordem de US$ 100 bilhões por ano em função dos "abusos tributários" envolvendo os paraísos fiscais. Isso mostra que a exigência de maior transparência no que diz respeito às transações com esses países faz-se uma verdadeira necessidade. A nova instrução também inclui a lista de países que apresentam "regimes fiscais privilegiados". Eles não se enquadram na definição corrente de "paraíso fiscal", mas permitem alguns privilégios para determinados grupos de pessoas físicas ou jurídicas, com o objetivo de atrair investimentos. A Receita listou um total de nove países, incluindo Estados Unidos, Malta, Uruguai e Espanha, entre outros. As empresas que fazem remessas de lucros para companhias do mesmo grupo nesses países são incluídas no regime de preços de transferência, que cobra carga maior de Imposto de Renda. A ampliação da lista de paraísos fiscais foi considerada polêmica. Porém, além de ser uma medida que protege a arrecadação nacional de impostos, não deve impactar de maneira significativa o fluxo de capitais que chega ao país, apesar de ter potencial para reduzir a rentabilidade de fundos e títulos nacionais negociados por pessoas e empresas residentes nesses lo cais, segundo apontam especialistas. Isso porque as taxas de juros praticadas pelo Brasil ainda são muito mais vantajosas do que a de outros países. Além disso, como trata de aplicações nos mercados financeiros, a nova listagem não vai influenciar o fluxo de investimento estrangeiro direto do país, que inclui gastos com o setor produtivo. É justo que as operações nos mercados financeiros do Brasil de investidores baseados nos países que têm vantagens tributárias passem a pagar imposto. A lista de paraísos ajuda a controlar as condições fiscais do país, evitando lavagem de dinheiro e fuga de capital. Mostra também o comprometimento do Brasil com a comunidade internacional e com a defesa de seu sistema financeiro. Jonas Lopes de Carvalho Neto é advogado, sócio do Lopes de Carvalho & Pessanha Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações .
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Fonte: Valor Econômico |