Desonerar folha ajuda a combater efeito do câmbio , diz professor da FGV
Publicado em:
Portal Fenacon
Valor Econômico
Aloisio Araújo defende redução de tributos que encarecem mão de obra
Sergio Lamucci
Preocupado com a forte valorização do real, o economista Aloisio Araújo, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende a desoneração da folha salarial como arma decisiva para melhorar a competitividade das empresas. Companhias exportadoras ou expostas à concorrência dos importados no mercado interno com elevado custo de mão de obra são duplamente punidas no momento, sofrendo com o real apreciado e os pesados impostos que incidem sobre a folha de pagamentos no Brasil, diz Araújo. Aliviar a carga de tributos sobre a mão de obra, segundo ele, é uma das maneiras de enfrentar o desafio.
"A minha preocupação é que, num momento como este, o país faça opções erradas para combater o problema do câmbio, dando subsídios ou elevando tarifas de importação. Seria um retrocesso", afirma Araújo, para quem também é importante que o Brasil atue em outras frentes para tratar da questão do real forte, como trabalhar na redução dos juros reais, o que vai exigir um aperto fiscal expressivo.
Araújo diz que o câmbio valorizado pode causar uma "primarização" exagerada da economia brasileira, levando a uma ênfase excessiva na produção de commodities. Segundo ele, dada a descoberta das reservas de petróleo na camada pré-sal, já é inevitável algum movimento nessa direção nos próximos anos. Com o dólar muito barato, esse processo pode se acentuar de modo indesejado.
"A questão do câmbio é grave", diz Araújo, emitindo uma opinião rara para um economista ortodoxo. A combinação de valorização dos preços de commodities, política monetária expansionista nos EUA e controle do câmbio na China torna complicada a situação do real, num cenário em que os juros brasileiros são os mais altos do mundo.
Como o Brasil tributa muito mais a folha de salários do que os seus concorrentes, é hora de o país enfrentar a questão e diminuir os encargos com a mão de obra, defende Araújo. Para ele, reduzir a contribuição previdenciária e os encargos do chamado "sistema S" (como as contribuições para o Senai e o Sesc ) são caminhos que podem ser seguidos.
Segundo Araújo, a perda de receita previdenciária pode ser em parte compensada com o aumento da formalização que tende a ser provocada pela desoneração da folha salarial, assim como por medidas que diminuam os gastos com benefícios da Previdência, como um eventual aumento da idade mínima para a aposentadoria.
Outra possibilidade é compensar a receita mais baixa com um aumento de impostos que imponham menos distorções à economia do que os tributos sobre a folha de pagamentos, diz. É o caso de uma nova CPMF, mas desde que com uma alíquota menor que o 0,38% cobrado anteriormente. "Na média, porém, é fundamental não aumentar a carga tributária", afirma ele, observando que o melhor a fazer é cortar outros gastos correntes.
Araújo diz temer que, no calor do momento, o país opte por subsídios a setores específicos ou por aumento das tarifas de importação. "Isso introduziria distorções na economia brasileira, que podem até causar problemas com a OMC [Organização Mundial do Comércio]. Tenho medo que a situação acabe justificando a adoção de medidas muito ruins."
Araújo também vê como imperativo mudar a orientação das contas públicas, adotando uma política fiscal mais rígida, a melhor estratégia para conseguir derrubar os juros de modo consistente. Segundo ele, o país precisa insistir na redução dos juros reais (descontada a inflação), processo que vem ocorrendo ao longo dos últimos 15 anos, mas que não levou a taxa a um nível mais desejável. Hoje, a taxa real está próxima de 6%. Um nível mais razoável seria algo na casa de 2% a 3%.
Um ajuste fiscal mais forte no começo do mandato da presidente eleita, Dilma Rousseff (PT), seria um passo importante para caminhar nessa direção, a exemplo do que fez Luiz Inácio Lula da Silva no começo de seu primeiro mandato, acredita Araújo. Ele lembra que, em 2003, a elevação do superávit primário, combinada à determinação de respeitar os contratos, foi crucial para derrubar os juros. Como as taxas nos países desenvolvidos devem ficar baixos por muito tempo, o Brasil tem que diminuir os juros internos para evitar a avalanche de capital externo que contribui para agravar a valorizar o câmbio.
O ortodoxo Araújo não acha um pecado a adoção de medidas de controle de capitais, como a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as aplicações de renda fixa, mas diz que não se deve ter ilusões quanto ao seu impacto sobre a trajetória do câmbio. "É um instrumento que pode ser usado num momento mais crítico, mas é apenas um paliativo. A solução não virá daí", afirma ele, também professor do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa).
Além da desoneração da folha salarial e do esforço para reduzir os juros por meio do ajuste fiscal, Araújo acredita que o governo deve buscar medidas que aumentem a eficiência econômica do país. Um empenho por aprovar medidas de reforma no sistema tributário, com a simplificação da legislação de impostos, é um exemplo citado por ele, assim como alguma mudança na legislação trabalhista.
"O governo pode aproveitar a grande maioria que terá no Congresso", diz ele, também lembrando o que fez Lula no começo do seu primeiro mandato, quando foram aprovadas reformas como a lei de falências e as medidas que ajudaram a impulsionar o crédito imobiliário no país. "O novo governo pode copiar um pouco o que foi feito no primeiro governo Lula." Araújo também acha importante que se enfrente a questão do déficit da Previdência do setor público, muito mais grave que o do setor privado.
Abertura de vagas será menor no fim do ano
Luciana Otoni
A geração líquida de emprego apresentará diminuição nos dois últimos meses do ano, com aumento do número de demissões em dezembro em decorrência do fim dos contratos temporários. A tendência é de um início de 2011 com menos dinamismo na oferta de vagas formais em comparação ao primeiro semestre de 2010, que apresentou recordes em cinco dos seis primeiros meses do ano.
Mesmo diante desse cenário, o Ministério do Trabalho projeta um novo ano de recordes, com a oferta líquida de 3 milhões de oportunidades com carteira assinada.
A acomodação no ritmo de contratações está visível nas estatísticas do ministério e reflete a desaceleração em alguns subsetores da indústria da transformação e na construção civil. Em outubro, o número de contratações líquidas atingiu 204,8 mil, representando o segundo mês consecutivo de recuo na comparação com o mês anterior. Em setembro, o número foi 247 mil, inferior às 299 mil vagas ofertadas em agosto.
No Ministério do Trabalho a avaliação é que essa diminuição nas contratações é consequência de sazonalidades concentradas na construção civil, no setor agrícola, em indústrias têxteis, em metalúrgicas e nas indústrias alimentícias, que sofrem o impacto da retração na produção sucroalcooleira.
Em novembro, a expectativa é de geração líquida de postos de trabalho em torno de 200 mil, inferior a outubro e menor que a de igual mês do ano passado. Para dezembro, a indicação é de demissões líquidas devido ao fim dos contratos temporários de trabalho em vários segmentos, entre os quais o comércio atacadista e varejista. A probabilidade, contudo, é de desligamentos em nível inferior às 415 mil demissões líquidas ocorridas em dezembro do ano passado, conforme cálculos do Ministério do Trabalho.
Para o próximo ano, o ministro Carlos Lupi faz uma estimativa otimista de mais um ano de recorde, com meta de 3 milhões de oferta líquida de vagas de trabalho. Nessa conta, ele considera que os investimentos em infraestrutura demandarão maior contingente de mão de obra, assim como as obras do programa Minha Casa, Minha Vida, da Copa e da Olimpíada, além dos efeitos da continuidade do crescimento econômico na indústria, agropecuária e serviços.
A dificuldade, ao fixar essa meta, será ultrapassar os bons resultados de 2010, concentrados, principalmente, no primeiro semestre. Dos seis primeiros meses do ano, apenas em junho a admissão líquida de trabalhadores não foi recorde.
De janeiro a outubro, o mercado de trabalho registrou a oferta líquida de 2,4 milhões de emprego, com alta de 7,2% em comparação a igual período do ano passado. Entre 25 subsetores, em 19 houve saldos recordes. Com esse resultado, a meta informal de 2,5 milhões de admissões para 2010 deverá ser cumprida sem maiores esforços.