Queda na receita com IR foi menor no Brasil
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Conjuntura: Alta na arrecadação do imposto superou a de outros sete países no período da crise econômica
A crise econômica e as medidas que reduziram a carga tributária para alguns setores produtivos derrubaram a arrecadação no Brasil desde novembro de 2008, mas uma comparação com o que ocorreu em outros oito países revela, segundo avaliação do governo, que a situação foi muito mais amena por aqui.
Relatório da Coordenação de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal, elaborado a partir de dados consolidados pelo Centro Interamericano de Administrações Tributárias (Ciat), mostra que os valores obtidos com o Imposto de Renda (IR) de pessoas e empresas tiveram quedas mais suaves no Brasil. Chile, México, Canadá, Estados Unidos, França, Espanha e Itália sofreram muito mais com a redução dos ganhos pessoais e dos lucros das empresas. Nesse grupo, os dados da Argentina foram melhores que os do Brasil.
No segundo trimestre de 2009, a arrecadação do IR, no Brasil, teve queda real de 8,5% se for comparada com a do mesmo trimestre de 2008. Nesse período, o Produto Interno Bruto (PIB) recuou 1,2%. Outros dois países tiveram reduções parecidas. Na Espanha, o PIB caiu 3,9%, mas a receita com IR baixou 9,9%. No Canadá, o PIB foi 3% menor que o do segundo trimestre de 2008, mas o IR ficou 9,2% abaixo do arrecadado no mesmo período do ano passado.
França e México sofreram mais. Na França a arrecadação do IR teve queda real de 18,5% no segundo trimestre deste ano e o PIB sofreu redução de 3,2%. No México, a receita com esse tributo foi 19,2% menor e o produto recuou 10,5%.
No grupo de nove países analisado pelo Ciat, as maiores reduções das receitas de IR, no segundo trimestre, foram de 54,6% no Chile e 36,6% nos Estados Unidos. Nesses países, o PIB caiu 4,5% e 3,9%, respectivamente.
Os dados oficiais da Argentina apontam aumento de 0,7% na arrecadação do IR no segundo trimestre deste ano se comparada à do mesmo período do ano passado. Na mesma comparação, segundo o governo argentino, o PIB cresceu 1,4%.
Há muito tempo o governo adota o discurso de que o Brasil foi o país com melhor desempenho durante a crise. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, gosta de repetir que o Brasil tem o segundo melhor resultado fiscal no G20 financeiro. Criado em 1999, esse grupo é integrado por África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia. A revelação do estudo do Ciat mostra o que realmente aconteceu com a arrecadação de um dos tributos mais importantes para a economia.
Raimundo Eloi de Carvalho, coordenador-geral de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal comenta que a crise econômica mundial atingiu os países de maneira diferente e as reações dos governos também não foram iguais. Ele afirma que, no Brasil, o lucro das empresas caiu bastante, mas a renda das pessoas não acompanhou esse movimento com a mesma intensidade. O emprego teve um momento de depressão no período compreendido entre dezembro de 2008 e fevereiro de 2009, mas o consumo interno foi razoavelmente preservado.
Carvalho também explica que os ganhos de capital das pessoas físicas caíram porque, antes da crise, estavam impulsionados pelas vendas de participação acionária de empresas e, com menor peso, pelos ganhos na Bolsa de Valores.
Apesar da crise e das desonerações, a queda na arrecadação do IR das empresas levou a Receita a iniciar uma fiscalização especial. De janeiro a setembro, os dois tributos sobre o lucro – IRPJ e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) – levaram R$ 93,71 bilhões aos cofres federais. O valor é 11,2% menor, em termos reais, ao arrecadado no mesmo período de 2008.
Isolando as 20 empresas responsáveis pelas maiores diferenças de pagamento desses dois tributos, a Receita apurou que elas recolheram R$ 9,53 bilhões nesses nove meses, o que significa queda real de 57,36% sobre igual período do ano passado. Essas 20 empresas serão fiscalizadas com muito mais rigor pelos auditores fiscais.
Os registros da Receita Federal mostram que, de janeiro a setembro, a arrecadação de IRPJ e CSLL teve a maior queda, R$ 2,79 bilhões, no setor financeiro. Em ordem decrescente, vieram as reduções em fabricação de veículos automotores (R$ 2,3 bilhões), combustíveis (R$ 2,16 bilhões), extração de minerais metálicos (R$ 1,91 bilhão), atividades auxiliares do setor financeiro (R$ 1,21 bilhão), metalurgia (R$ 1,07 bilhão), comércio atacadista (R$ 716 milhões), comércio e reparação de veículos (R$ 547 milhões), fabricação de produtos químicos (R$ 500 milhões) e consultoria para empresas (R$ 426 milhões).
O relatório da Receita também informa que o IR das pessoas físicas teve arrecadação de R$ 11,6 bilhões de janeiro a setembro. Na comparação com o mesmo período do ano passado, a queda real foi de 11,68%.
Se os dados colhidos pelo Ciat mostram que o Brasil teve desempenho arrecadatório relativamente melhor na crise, também é preciso reconhecer as peculiaridades que os países têm. No Brasil, os instrumentos escolhidos pelo governo para enfrentar a crise concentraram-se nas desonerações dos tributos sobre o consumo como, por exemplo, Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), as contribuições PIS e Cofins, o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). A tributação sobre a renda respondeu por apenas 28% dessas desonerações.
Países como Chile, França, Estados Unidos e Canadá concentraram desonerações nos impostos sobre a renda. Por isso, há grande diferença nas quedas. Na França, permitiram o uso dos créditos do tributo sobre o consumo (IVA) para abater o imposto de renda das empresas e isso reduziu brutalmente a arrecadação desse imposto.
No caso do Chile, o gigantesco tombo que a arrecadação do IR teve no segundo trimestre deve estar relacionado ao adiamento de pagamentos. Além disso, para incentivar o consumo, o governo chileno deu crédito de IR como antecipação das restituições do ano que vem.
Para enfrentar a crise que deprimiu o consumo, o governo americano também diminuiu fortemente as retenções de IR para empresas e trabalhadores, além de oferecer um programa de aumento da depreciação acelerada para incentivar a aquisição de bens de capital.
Espanha e Chile reduziram drasticamente os recolhimentos na fonte para ajudar o caixa das empresas, mas a partir do terceiro trimestre, os pagamentos voltaram ao normal.