Sudene volta, mas perde capacidade de financiamento
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Daniel Rittner De Brasília
A nova Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) está a poucos passos de sair do papel, mas sua capacidade financeira será inferior àquela imaginada pelo próprio governo. O Senado aprovou em dezembro a recriação da autarquia federal, mas com vários pontos que contrariam o projeto original do Ministério da Integração Nacional. Parte das alterações será corrigida agora, na última etapa de tramitação do projeto, que voltou à Câmara.
Amanhã, o deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA) apresenta, na comissão especial que analisa o assunto, um relatório com 20 emendas que mudam o texto aprovado pelo Senado. Ribeiro enxugou o projeto para “tirar a camisa-de-força” que, segundo ele, engessaria a operação da nova Sudene.
Foram retirados artigos e parágrafos que determinavam, entre outros pontos, a criação do BNB-Par – um braço do Banco Nordeste para participações acionárias em empresas – e a aplicação de recursos somente em projetos industriais e de infra-estrutura. O relator também excluiu trechos que aproveitavam o projeto para introduzir novas regulamentações nos fundos constitucionais de financiamento do Nordeste (FNE), Norte (FNO) e Centro-Oeste (FCO), alterando as taxas de administração dos agentes operadores e criando novos limites para empréstimos.
Otimista, o governo acredita que ainda dá tempo de colocar a nova Sudene de pé até o fim do ano. Será uma tentativa de cumprir, ainda que com atraso, uma das principais promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nas eleições de 2002, para o Nordeste. A demora em refundar a autarquia, idealizada nos anos 60 pelo economista Celso Furtado, é atribuída às dificuldades de negociação do projeto no Congresso. O que incomoda os técnicos responsáveis pelo projeto da nova Sudene é a redução da capacidade que ela terá para impulsionar o desenvolvimento econômico da região e diminuir suas desigualdades.
Na essência da recriação da Sudene estava o surgimento de um novo Fundo de Desenvolvimento Regional, com recursos distribuídos aos Estados de forma diretamente proporcional ao tamanho das populações e inversamente proporcional ao PIB – mais dinheiro para os mais pobres. Isso geraria recursos de quase R$ 2 bilhões por ano para o que o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, chama de “projetos estruturantes” no Nordeste. Para ele, a nova Sudene deveria alavancar grandes obras industriais e de infra-estrutura que pudessem mudar o perfil econômico da região.
Falando mais de uma vez no Congresso, Ciro chegou a dizer que recriar a Sudene sem esse fundo seria “um teatro de mau gosto” do qual ele dizia recusar-se a participar. O ministro admitia a possibilidade de recomendar ao presidente Lula que vetasse a refundação nessas condições.
Ciro queria o gerenciamento dos recursos do fundo pela Sudene; os governadores nordestinos não abriam mão de usar esse dinheiro para reforçar seus orçamentos estaduais. Com a reforma tributária colocada no limbo, a discussão morreu. O superfundo cobiçado pelo ministro deu lugar ao Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), sob gerenciamento da Sudene, que tem previsão de R$ 1,027 bilhão para 2006.
“É uma lacuna importante”, reconhece o secretário de Políticas de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional, Antônio Galvão. O FDNE, na verdade, já existe e é gerenciado pela Agência de Desenvolvimento do Nordeste (Adene), autarquia que substituiu a Sudene e não vingou.
Para o secretário, no entanto, a recriação da Sudene ainda será uma notícia de grande relevância para a região. “Em primeiro lugar, porque é preciso, em um país continental como o Brasil, mediar as visões estratégicas para o Nordeste com atores da própria região”, afirma. “Em segundo, porque a Sudene vai organizar iniciativas de desenvolvimento regional e de interação com outras políticas públicas que hoje são feitas nos gabinetes de Brasília”, acrescenta.
O principal instrumento de discussão será o Conselho Deliberativo, presidido pelo ministro da Integração Nacional. O relator do projeto na Câmara modificou o texto do Senado e voltou a colocar como conselheiros, além dos governadores da região e de ministros, três representantes dos municípios nordestinos, três dos empresários e três dos trabalhadores – mais o superintendente da Sudene e o presidente do BNB.
Zezéu Ribeiro também retirou a necessidade de sabatina dos quatro membros da diretoria colegiada da Sudene e suprimiu o trecho que limitava os financiamentos exclusivamente a obras industriais e de infra-estrutura, estendendo o crédito para projetos de comércio e de serviços, como turismo.
O deputado manteve a previsão de uso do FDNE até 2023 e a impossibilidade de o governo contingenciar os recursos do fundo. “Como é uma lei complementar, de caráter duradouro, foram aspectos mais regulatórios e normativos”, afirma Ribeiro. O secretário Galvão diz que o ministério já trabalha na regulamentação da Sudene. “Se o projeto for votado em março na Câmara, vai à sanção presidencial e a implantação pode ser rápida.”