Fiscos buscam bens dos sócios
Publicado em:
Fernando Teixeira De Brasília
A consolidação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) contrária à responsabilização de sócios-gerentes e diretores de empresas em execuções fiscais não eliminou o problema do dia-a-dia de executivos e empresários. Mesmo com o entendimento restritivo do tribunal superior, são freqüentes os casos de sócios surpreendidos por ações de cobrança e impedidos de obter certidões negativas de débito – exigidas pelas juntas comerciais na abertura de novas firmas. Desde 2004 o STJ definiu que a desconsideração da pessoa jurídica só pode ocorrer quando é comprovada existência de algum tipo de fraude – o que não é demonstrado nas ações de execução comuns. Ainda assim, diversas procuradorias, sobretudo do INSS, pedem a desconsideração corriqueiramente.
De acordo com o advogado Marcos Joaquim Gonçalves Alves, do escritório Mattos Filho, apesar de a responsabilização do sócio ser facilmente revertida com um recurso judicial, a disseminação da prática traz inconvenientes, despesas e mão-de-obra para os envolvidos. Mesmo que o juiz de primeira instância adote a posição do STJ, não tem poder para extinguir uma execução de ofício – precisa de um pedido feito pelo advogado da parte interessada. De acordo com o advogado, há muitos sócios de empresas com execuções fiscais que descobrem a pendência apenas quando vão à junta comercial constituir uma nova firma, o que prejudica ainda mais o já moroso processo de abertura de empresas.
Luiz Gustavo Bichara, sócio do escritório Bichara, Barata, Costa e Rocha Advogados, conta um caso recente em que um de seus clientes foi surpreendido por uma pendência até então desconhecida. O cliente – uma siderúrgica – incluiu em seus quadros, há mais de dois anos, um ex-sócio de uma empresa do ramo petrolífero no Rio de Janeiro. Com pendências com o INSS, a empresa de petróleo “contaminou” o ex-sócio com suas dívidas. Quando a siderúrgica foi abrir um escritório de representação na Bahia, descobriu que estava impedida, pois o novo sócio tinha um débito em aberto com a Previdência.
Segundo Bichara, a prática pode começar a trazer sérios problemas para os sócios quando o fisco começar a usar o sistema de penhora on line em ações de execução. Em empresas familiares, o sistema pode bloquear as contas de toda uma família – já que são todos sócios -, e em multinacionais, os valores da execução podem ser várias vezes superiores ao patrimônio do sócio executado.
Segundo o procurador responsável pela dívida ativa do INSS, Sérgio Corrêa, a jurisprudência do STJ sobre o tema foi revertida recentemente – há dois ou três anos – e a procuradoria continua insistindo na tese. “Não temos porque facilitar o trabalho para o devedor e se conformar com a situação”, diz. O instrumento, segundo o procurador, serve para contornar os casos corriqueiros nas execuções, que encontram empresas quebradas e sócios ricos. A saída para viabilizar a desconsideração da personalidade jurídica seria mudar a jurisprudência ou a lei. O procurador diz que em países como Portugal, Espanha e Alemanha, o ônus da prova pela responsabilização do sócio é do próprio sócio – e não do fisco. Como o sistema de fiscalização atual não é capaz de produzir provas sobre a responsabilidade do sócio, uma alteração legislativa nesse sentido seria a melhor saída.
O procurador-geral da dívida ativa do Estado do Rio de Janeiro, José Carlos Sarmento, diz usar o instrumento com sucesso – respaldado inclusive pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – mas apenas em alguns casos. A situação típica para os pedidos de desconsideração são as empresas que não foram encontradas para citação ou foram fechadas sem ter baixa na junta comercial. Nesses casos, diz, não se trata de uma inadimplência comum, mas de uma tentativa de ludibriar o fisco. O procurador também obteve recentemente o bloqueio de bens de um sócio de um laboratório carioca ao demonstrar que o patrimônio da empresa foi esvaziado enquanto se acumulavam pendências com o fisco estadual.