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Aspectos negativos e positivos das alterações da Lei das S.A.

Publicado em:

por Ernesto Dias de Souza*

Novos critérios de avaliação de ativos poderão proporcionar transtornos; e não somente pela adequação técnica e operacional

Toda alteração legal no âmbito contábil gera alguma polêmica que normalmente é desencadeada por seus reflexos fiscais e tributários. É o caso da Lei nº 11.638/2007, que alterou a Lei nº 6.404/1976, cujo teor tem sido bastante criticado por analistas que alardeiam o aumento da carga tributária decorrente das alterações da lei societária, principalmente diante da não manifestação da Receita Federal do Brasil sobre o episódio.

Não se questiona que a mudança de tratamento se deve à adequação técnica aos padrões internacionais, muito embora seus objetivos sejam a adaptação do padrão contábil brasileiro às normas internacionais de contabilidade, a eliminação da reserva de capital proveniente dos prêmios recebidos na emissão de debêntures, assim como da reserva de doações e subvenções para investimentos, cujos benefícios passam necessariamente a ser reconhecidos como receita, com trânsito pelo grupo de resultados de exercícios futuros no caso dos prêmios na emissão de debêntures.

Outro aspecto que vem recebendo críticas é o prazo para que as sociedades se adaptem às novas regras. Anteriormente à aprovação da Lei nº 11.638/2007, a CVM e o Banco Central do Brasil previam em seus atos normativos que a convergência para o padrão contábil internacional ocorreria até 2010.

Após a aprovação da Lei e de sua entrada em vigor a partir de 1º de janeiro deste ano, alguns procedimentos já estão sendo exigidos inclusive para a elaboração das informações trimestrais que as companhias abertas enviam à CVM (Instrução CVM nº 469/2008). O prazo escasso para a adaptação das contabilidades e para a apuração e avaliação dos reflexos nas demonstrações contábeis é contestado tanto por contadores quanto por auditores.

Os novos critérios de avaliação de ativos também poderão proporcionar algum transtorno, não somente pelo aspecto da adequação técnica e operacional, mas também pela não previsão na lei da aplicação do conceito de custo original corrigido, uma vez que a correção monetária de balanços continua extinta. Os ativos, como regra geral, serão avaliados pelo custo de aquisição e nos casos específicos pelo valor de mercado, sendo necessários ajustes quando pairar risco ou for constatada perda de capacidade de realização.

Todavia não poderá ser aplicado nenhum índice de correção monetária para neutralizar efeitos inflacionários, mesmo na hipótese de retorno da inflação. Não a desejamos, mas não poderíamos deixar de nos proteger dela, principalmente por não ser mais permitida a reavaliação espontânea de ativos e termos ficado sem nenhuma possibilidade de ajuste do custo para mais.

Por outro lado, não se pode negar o avanço proporcionado pelas alterações da Lei das S.A. No Brasil, vamos adotar o mesmo conjunto de demonstrações previsto na Europa e nos Estados Unidos e, ainda, utilizar padrões contábeis harmônicos.

Muito embora eu discorde com as críticas à DOAR quanto às dificuldades de elaboração e ao baixo poder informativo, a substituição dessa demonstração pela Demonstração dos Fluxos de Caixa, além de padronizar o conjunto de demonstrações, elimina o trabalho de elaboração de ambas para as sociedades que divulgavam a DFC para atendimento de informações em mercados que já a exigiam.

A convergência do padrão contábil brasileiro para o padrão contábil do International Accounting Standard Board (IASB), na medida em que os procedimentos sejam regulamentados e assimilados pelos contadores e auditores brasileiros, proporcionará maior facilidade em negociações. Pode, inclusive, ser vista como fator de atratividade de investimentos, uma vez que facilitará o entendimento e a análise das demonstrações contábeis de empresas brasileiras.

Contabilidade não deve ser apenas fruto de imposição legal e de engessamento fiscal. É comum ouvirmos que a empresa não está sujeita a esse ou aquele procedimento contábil porque não há lei que a obrigue. Ou então se questionar sobre qual seja o procedimento mais rentável do ponto de vista fiscal.

Devemos lembrar que muito embora a justificativa da globalização para a tomada de certas decisões tenha sido banalizada, ela é uma realidade que não pode ser desprezada. O concorrente de uma empresa brasileira não está mais circunscrito às nossas fronteiras. A contabilidade deve ser elemento facilitador da gestão interna das empresas e, também, de agilização de transações comerciais. Adotar um padrão de avaliação patrimonial transparente transcende o aspecto normativo e fiscal e pode se tornar uma questão de sobrevivência no mercado.

Imagine seu concorrente ganhando uma licitação ou um contrato, ou até mesmo sendo mais ágil na liberação de financiamentos e de linhas de crédito em função de as demonstrações contábeis dele estarem num grau maior de transparência e qualidade do que as da sua empresa. Isso pode ainda não ser uma realidade no Brasil, mas caminhamos para isso. Portanto, a mentalidade do empresário e do profissional de contabilidade também deve mudar.

*Ernesto Dias de Souza é contador e consultor da VerbaNet – Legislação Empresarial Informatizada, especializado em contabilidade, análise de balanços e legislação societária

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