Os meses de março e abril representam o momento de prestação de contas para as empresas. Nesse período, as Sociedades Anônimas (S.A.) e companhias abertas são obrigadas a publicar seus balanços patrimoniais e a realizar as assembléias de acionistas. Balanço patrimonial é o conjunto de demonstrações contábeis referentes ao encerramento do exercício do ano anterior. Representa a riqueza da empresa dividida em vários itens, entre os quais o quanto possui em dinheiro, estoque, contas a receber e outros.
A apresentação das demonstrações contábeis conta ainda com os dados de obrigações de uma empresa. "Essas informações são importantes uma vez que ajudam no processo de captação de recursos do grupo", explica o chefe de departamento de Ciências Contábeis da Ufrgs, professor João Marcos Leão da Rocha. O balanço patrimonial vê o conjunto de bens e direitos, a riqueza da empresa e a capacidade de saldar compromissos de curto e longo prazo. "Isso é relevante inclusive para os acionistas que querem colocar dinheiro na empresa. Através de profissionais qualificados, as demonstrações serão analisadas, indicando situações de potencial progresso ou pré-falimentar nas corporações", diz Rocha.
É constituído pelo ativo, que compreende os bens, os direitos e as demais aplicações de recursos controlados pela entidade, capazes de gerar benefícios econômicos futuros, originados de eventos ocorridos; passivo, que engloba as origens de recursos representados pelas obrigações para com terceiros, resultantes de eventos ocorridos, que exigirão ativos para a sua liquidação, e o patrimônio líquido, onde estão os recursos próprios da empresa.
Rocha lembra que a organização das informações e divulgação por meio do balanço patrimonial é o coroamento da atividade de um contador.
Mensalmente, o profissional contábil reporta os dados à administração através de balanços intermediários, os chamados balancetes. "O contador tem acompanhamento de como está a empresa, as vendas, os custos e a uniformidade em relação a períodos anteriores, percebendo se melhorou ou piorou. Se as despesas da empresa se mantêm no mesmo patamar ou teve alterações, ele saberá."
Com os resultados mensais, o contador tem condições de alertar o empresário nos casos em que os negócios enfrentam dificuldades. "Ao detectar que o lucro da empresa baixou, é possível apurar o que está ocasionando a mudança. O empresário só saberá isso por meio do contador. O balanço é um raio-x da empresa no último ano", compara o professor.
Aquelas empresas que são obrigadas por lei a divulgar seu balanço patrimonial e não o publicarem poderão sofrer sanções por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). "A punição pode variar de multa ou até proibição de continuar operando no mercado acionário", explica Rocha.
Mercado tem carência de auditores habilitados A divulgação do balanço patrimonial deve ser submetida à análise de auditores. Hoje, esse mercado sofre com a escassez de profissionais habilitados para aturarem no segmento. A afirmação é do auditor da BDO Trevisan e diretor de Desenvolvimento Profissional do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), Paulo Ricardo Alaniz. "Nos últimos anos, tivemos um crescimento de demanda muito forte por auditores. As empresas precisam investir em treinamento para suprir essa carência."
O setor de auditoria no mundo está em expansão devido às mudanças registradas nos últimos tempos. No Brasil, as alterações na lei societária abre um campo amplo para o profissional que quiser se habilitar. A auditoria deve ser executada por contadores habilitados nos CRCs, no Ibracon ou Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Para obter o cadastro da CVM, o profissional deve se submeter a uma prova.
Segundo Alaniz, o crescimento econômico mundial e do Brasil tem reflexos positivos para o setor de auditoria. "O País está se inserindo num contexto de economia com muito mais força, o mesmo acontece com as empresas. O mercado de capitais funciona através da credibilidade, que é dada com a transparência na informação e a verificação das informações", compara.
Enquanto cabe ao contador preparar as demonstrações contábeis e divulgá-las de forma transparente, o papel dos auditores é verificar se os dados estão corretos e dentro dos princípios. Durante anos, poucos eram os setores da economia nacional que enfrentavam concorrência forte no mercado. "Existia um certo protecionismo. Tirando as grandes estatais, subsidiadas pelos governos, as demais empresas viviam com incentivos fiscais. Com a abertura do mercado, isso não é mais possível."
Um exemplo de empresa com o capital pulverizado é as Lojas Renner. Possuía um acionista americano que tornou-se o controlador do negócio.
Em um segundo momento, esse acionista decidiu vender sua participação para várias outras pessoas na Bolsa. Segundo Alaniz, a maioria das empresas brasileiras ainda não está nesse nível, tem um pequeno grupo de acionistas que possui a maioria das ações.
Nova legislação ainda gera dúvidas A entrada em vigor da Lei 11.638, sancionada em 28 de dezembro de 2007, provocou alterações na Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) e continua a gerar dúvidas quanto à publicação dos balanços por algumas companhias. Desde então, as empresas limitadas passaram a ter a obrigatoriedade também de se submeter à auditoria e de divulgar as suas demonstrações contábeis. Pela nova legislação, as companhias limitadas que possuem ativos acima de R$ 240 milhões ou receitas acima de R$ 300 milhões estão obrigadas a preparar demonstrações contábeis nos mesmos moldes das sociedades anônimas.
O auditor da BDO Trevisan e diretor de Desenvolvimento Profissional do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) Paulo Ricardo Alaniz diz que a discussão da obrigatoriedade de publicação segue dividindo opiniões. De um lado, há os que entendem que o balanço deve ser publicado, enquanto para outros não é uma exigência. "O que está escrito na lei não especifica a obrigatoriedade de publicação. Levando em conta o caráter formal, a lei não estabelece essa medida", pondera.
Alaniz defende a elaboração do balanço e sua verificação por meio de auditoria. Ele reconhece, entretanto, que a divulgação dos dados atende à busca pela melhora na transparência. "Mesmo não estando implícito na lei a exigência da publicação, para alguns seria desejável fazê-la. As empresas limitadas de grande porte informam aos bancos, clientes e fornecedores eventualmente suas informações contábeis, o que não fazem é publicar nos veículos de comunicação, como são obrigadas a fazer as companhias abertas e as S.A. em geral", diz.
Mesmo sem a exigência da lei, Alaniz acredita que algumas companhias seguiriam divulgando suas demonstrações como uma forma de prestação de contas para o mercado. "Para a empresa, quanto mais informações ela repassar ao mercado mais transparência demonstrará ter, o que pode voltar ao empresário em forma de financiamentos ou outras vantagens. Um dos objetivos de tornar públicos os números é se relacionar melhor com o mercado." Empresas mais fechadas, que recebem financiamentos exclusivamente de pessoas físicas e dos próprios acionistas são, muitas vezes, avessas a publicar as informações. "Conforme vão crescendo, acabam tendo que acessar o mercado de capitais, pois chegará uma hora em que os acionistas, sozinhos, não terão condições de financiar a empresa. Nesse momento ela precisará divulgar seus dados para todos," diz o auditor.
As alterações propostas trazem um novo aspecto à contabilidade. Há alguns anos, poucas mudanças ocorriam na contabilidade, a maioria na parte área fiscal. "Estamos vivenciando um momento diferente nesse sentido. As mudanças propostas são de conceito. Até o ano passado, fazíamos contabilidade seguindo normas. A partir de agora, temos que trabalhar a questão de princípios que precisam ser atendidos."
Norma divide patrimônio A Lei 11.638 de 28 de dezembro de 2007, ao alterar a Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas), passou a dividir o Patrimônio Líquido em capital social, reserva de capital, ajustes de avaliação patrimonial, reservas de lucros, ações em tesouraria e prejuízos acumulados.
Segundo o presidente do Sindicato dos Contadores do Estado do Rio Grande do Sul (Sindiconta) e professor do Unilasalle, Salézio Dagostim, o problema com essa nova divisão está na inexistência da conta de lucros ou prejuízos acumulados, e na inclusão, em seu lugar, tão somente da conta de prejuízos acumulados. "Em virtude disso, somos questionados a responder se é adequado ou não ter a conta de prejuízos acumulados no Patrimônio Líquido."
O Parágrafo Único do art. 189 da Lei 6.404/76 determina que o prejuízo do exercício será obrigatoriamente absorvido pelos lucros acumulados, pelas reservas de lucros e pela reserva legal, nessa ordem. Também as pessoas jurídicas são obrigadas, por força do art. 176 da Lei 6.404/76, a elaborar a demonstração dos lucros ou prejuízos acumulados.
Dagostim diz que se o prejuízo é obrigatoriamente absorvido pelos lucros acumulados, e, sendo a pessoa jurídica obrigada a elaborar o demonstrativo de lucros ou prejuízos acumulados, e que ambos os artigos 176 e 189 da Lei 6.404/76 não foram modificados pela Lei 11.638/07, é possível que a conta de lucros ou prejuízos acumulados continue existindo na contabilidade da pessoa jurídica. "O que aconteceu foi uma omissão da palavra lucros quando da publicação da lei."
O presidente do Sindiconta diz que também não se pode considerar reserva de lucros como conta substitutiva para a de lucros acumulados, porque reserva de lucros se encontra definida no § 4º do art. 182 da Lei 6.404/76, segundo o qual, serão classificadas como reservas de lucros as contas constituídas pela apropriação de lucros da companhia. "Apropriar alguma coisa é, na literatura contábil, dar a ela um destino para que aí permaneça. Como ao lucro acumulado ainda não foi dado um destino pelos seus donos, não será nesta conta que se registrará esse lucro pendente de destinação. Portanto, salvo melhor juízo, a conta de lucros ou prejuízos acumulados deve continuar sendo informada nas demonstrações contábeis das pessoas jurídicas de fins lucrativos, em cumprimento aos artigos 176 e 189 da Lei 6.404/76", ressalta.
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