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Redução de peso fiscal é tendência mundial

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GAZETA MERCANTIL

São Paulo, 17 de Março de 2008 – A pesquisa sobre o panorama de fusões e aquisições Brasil 2007 da KPMG, uma das quatro maiores empresas de auditoria no mundo, indicou que as operações de empresas nacionais adquirindo outras no exterior registraram um aumento de 40% e, segundo a auditoria, a perspectiva para 2008 é que esta movimentação continue aquecida.
 Isso faz com que os escritórios de advocacia invistam, com segurança, cada vez mais na área de direito societário. Uma das causas desse fenômeno é simples. Segundo o líder global de tributação internacional da KPMG, Wilbert Kannekens, na União Européia, a alíquota média de tributação sobre a renda é de 25%. "Olhando o Brasil de fora, certamente é um país com enormes possibilidades. Sempre atrairá negócios e investimento", disse o especialista na entrevista exclusiva à Gazeta Mercantil. Por outro lado, como resultado, os outros países têm olhado cada vez mais para os países emergentes, como o Brasil, como "global players", ou seja, concorrentes e não apenas jurisdições para investir. Veja a seguir a entrevista com o executivo.

Gazeta Mercantil – Mesmo com a tributação e burocracia que existe hoje no Brasil, o País atrai investimentos estrangeiros. Qual a tendência na sua opinião?
Olhando o Brasil de fora, certamente é um país com enormes possibilidades. Sempre atrairá negócios e investimento. Mas isso não significa que o Brasil não poderia atrair mais investimentos se a carga tributária fosse menor. Não vamos esquecer que como resultado da globalização o mundo está ficando mais transparente e negócios podem mais facilmente se mover de um país para outro. Então, se a carga tributária é excessivamente alta, ou se as normas não são claras, as empresas vão considerar outras opções de investimento. É apenas uma questão de tempo para que os países da América Latina comecem a competir entre si com relação à carga tributária, assim como aconteceu na Europa.

Gazeta Mercantil – De 1 a 100, qual o peso da importância da tributação na decisão sobre investir ou não investir num determinado país?
É difícil classificar a importância do imposto, mas posso afirmar que, de fato, é um elemento importante. Não obstante, o imposto não é o único elemento que desempenha um papel importante. Há muitos outros fatores cruciais, tais como: infra-estrutura, a estabilidade política e econômica, a localização geográfica e a mão-de-obra qualificada. Antes de investir em qualquer país, as empresas fazem análises econômicas detalhadas. A carga tributária é um fator importante nessa análise, muito mais do que a própria alíquota do imposto.
 Para as empresas é imprescindível que a regulamentação seja clara, não havendo espaço para incertezas. Assim, é importante para os investidores a certeza de que a legislação será aplicada de forma correta pela administração fiscal. Eu diria que de 1 a 100, seria: 90. Mas é diferente para cada empresa.
 Tenho visto empresas que cancelaram um investimento em um país, porque a percentagem do imposto era um pouco mais elevada e outros que não deram tanta importância para este fato.

Gazeta Mercantil – É possível dizer que, no mundo, a tendência é de redução dos tributos corporativos? Como os países estrangeiros vêm agindo nesse sentido?
Sim, é verdade que as alíquotas dos tributos sobre a renda estão diminuindo. Olhe, por exemplo, as alíquotas na União Européia. A alíquota média é de 25%, mas era muito maior há alguns anos. Os países estão agora reduzindo os tributos sobre a renda tão rapidamente que nós chamamos isso de "race to the bottom" . Isso tem sido freqüentemente criticado. Os governos têm necessidades orçamentárias e há um limite para o que é possível.
 Adicionalmente, fora da União Européia há uma tendência de redução dos tributos corporativos sobre a renda. De modo geral, você vê países maiores – como Estados Unidos, Inglaterra e Japão – com alíquotas mais elevadas. Eu preciso fazer uma importante observação aqui. Uma alíquota baixa pode parecer interessante, mas isso não significa necessariamente que a carga tributária efetiva é baixa. Freqüentemente, empresas não são autorizadas a fazer certas deduções para fins fiscais. Isso significa que a base de cálculo pode ser muito alta. Nesse caso, mesmo com uma alíquota baixa, as empresas acabam pagando muito imposto.

Gazeta Mercantil – Quais os países mais atrativos em relação às cargas tributárias? Qual o peso dessas cargas?
Há alguns países que, tradicionalmente, possuem carga tributária corporativa muito baixa, ou até mesmo sem qualquer tributação. Muitos desses países são o que chamamos de "paraísos fiscais". Freqüentemente, estes são os menores países ou aqueles com uma economia local pequena. Exemplos são Chipre, Bermudas e Panamá. Entretanto, isso não significa que os paraísos fiscais são automaticamente os países mais atraentes para as empresas. Há muitos Estados que possuem carga tributária elevada mas devido ao modo como a renda tributável é calculada, ou em decorrência de incentivos fiscais específicos, a carga tributária efetiva pode acabar sendo muito baixa. Apenas alguns exemplos de tais países são: Suíça, Holanda, México e Cingapura. O que torna um país atraente do ponto de vista tributário não é apenas a alíquota praticada. Um importante elemento a ser analisado é a existência de tratado para evitar a bitributação entre dois países. Com a inexistência de tal tratado, impostos adicionais sobre a renda podem ser devidos ou o país da empresa matriz pode tributar os lucros dos acionistas.

Gazeta Mercantil – Então as tributações internacionais estão levando investimentos que poderiam ser aplicados no Brasil para o exterior?
Com relação aos investimentos que as empresas brasileiras estão fazendo, deve-se considerar que apesar de estarmos gerando empregos, por exemplo, lá fora e não aqui, não há como ser um "global player" operando estritamente dentro do seu país. Ou seja, é preciso estar próximo ao mercado consumidor europeu, asiático ou americano para se conquistar essas economias. Esta decisão e processo, portanto, não são direcionados primeiramente por questões fiscais. Todavia, é claro que se pode concluir que é mais barato ter uma fábrica no México ou na China do que no Brasil quando o componente tributo é levado em conta. Assim, o nível de atividades que as multinacionais brasileiras deixam no Brasil ou transferem para o exterior pode sim ser influenciado pela carga tributária de cada país.

Gazeta Mercantil – E em relação às multinacionais?
No tocante às multinacionais estrangeiras, há, de fato, atualmente uma competição muito grande entre os países na atração de investimentos, os quais geram empregos, transferem tecnologia ao país, aumentam as reservas de moedas estrangeiras, etc. Vários países têm utilizado redução da alíquota do imposto de renda, maior número de tratados internacionais para evitar a dupla tributação, concessão de incentivos fiscais e maior proximidade e transparência na relação fisco-contribuinte para serem mais competitivos na atração de investimentos. Este último item, por exemplo, tem se mostrado muito eficiente, pois ao investir uma valor significativo em um determinado país, os investidores precisam ter mais clareza quanto às regras tributárias a que estarão sujeitos. Além disto, as empresas querem ter a possibilidade de participar de discussões relacionadas com reformas tributárias para que seus pleitos sejam considerados e, surpreendentemente, nem sempre o que se pede ou espera é uma redução drástica da carga tributária.

Gazeta Mercantil – Quais as tendências mundiais em relação ao transfer pricing?
Com as empresas realizando mais negócios em escala global, o número de transações entre empresas vinculadas aumentou rapidamente nos últimos 15 anos. As autoridades fiscais em todos os estados estão cada vez mais focadas nestas transações, a fim de se certificarem de que estão recebendo o que eles pensam ser a parcela correta dos lucros. Esta é a razão pela qual os preços de transferência estão se tornando tão importantes.

Gazeta Mercantil – E quais são as tendências com relação aos preços de transferência?
Primeiro, as empresas são solicitadas a documentarem o modo pelo qual elas organizaram e precificaram suas transações intragroup. Sem documentação, o ônus da prova pode mudar e recair sobre o contribuinte. Segundo, as autoridades fiscais ao redor do mundo começaram a aplicar regras comuns de preços de transferência, intercambiar informações e trabalhar juntas. Terceiro, há uma crescente divergência relacionada com os preços de transferência, sobretudo nos mercados emergentes, por exemplo na Índia, China e Brasil. E, finalmente, mais empresas estão celebrando "acordos prévios de preços de transferência" com as autoridades fiscais. Ao fazerem isso, as empresas têm a oportunidade de negociar diretamente com as autoridades fiscais quais serão os preços de transferência a serem adotados, o que gera muito mais confiança e segurança com partes relacionadas.
Gazeta Mercantil – O Brasil deveria firmar um volume maior de tratados bi ou multilaterais relacionados à tributação? Os que já vigoram precisam ser reformulados?
Certamente, o número de tratados firmados por um país é importante para identificar o quanto ele está aberto a negociações para incentivar investimentos. Todavia, é importante também avaliar o conteúdo do tratado e, mais ainda, como essas regras serão posteriormente aplicadas. Como o Brasil não é membro da OCDE, não é raro que os investidores brasileiros e estrangeiros assumam uma determinada carga tributária para seus investimentos levando em conta incentivos previstos no tratado que posteriormente não são confirmados pelas autoridades fiscais brasileiras. Isso ocorre, porque enquanto a maioria dos países seguem regras internacionais de interpretação dos tratados, a maioria discutidas e acordadas no âmbito da OCDE, o Brasil adota interpretações diferentes. Este foi, por exemplo, o motivo da denúncia (rescisão) do tratado Brasil-Alemanha.

(Gazeta Mercantil/Caderno A – Pág. 14)(Laura Ignacio)