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“Briga” entre governo e contribuinte por pagamento de tributos cresce e chega a 75% do PIB

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Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal - STF

GAZETA DO POVO

 

 

 

 

 

Segundo o Insper, a discussão sobre tributos, na esfera administrativa e na Justiça, envolve mais de R$ 5,4 trilhões. Valor equivale a 75% de todas as riquezas geradas pelo país em um ano.

A “briga” pelo pagamento de tributos no Brasil já responde por, pelo menos, o equivalente a 75% do PIB brasileiro, segundo cálculos do Núcleo de Estudos da Tributação do Insper. Em 2019, contribuintes e os entes da federação disputavam, nas esferas administrativa e judicial, o destino de pelo menos R$ 5,44 trilhões. Mais da metade desse valor se refere a tributos federais.

O contencioso tributário cresceu em comparação com 2018, ano da pesquisa anterior, quando foi calculado em 73% do PIB. E a expectativa é de que tenha avançado novamente em 2020, em proporção do PIB, já que a economia brasileira se retraiu no ano passado. Estimativas do mercado e do governo federal apontam para uma queda de mais de 4% na geração de riquezas.

A disputa entre contribuintes e Estado não é grande apenas na comparação com o tamanho da economia brasileira. Também é desproporcional em relação ao que ocorre em outros países. Somente o contencioso administrativo federal corresponde a 15,9% do PIB brasileiro. Nos países pertencentes à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), esse percentual é de 0,28%, em média. Em países da América Latina, de apenas 0,19%.

“O tamanho do contencioso tributário pode ser visto como uma medida indireta da qualidade do sistema tributário de um país, o que produz efeitos sobre a economia, em particular, sobre os investimentos, a segurança jurídica e a posição competitiva do país em relação ao resto do mundo”, apontam os pesquisadores.

Segundo o professor Gustavo Fossatti, da Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV Direito Rio), há no Brasil uma cultura do contencioso tributário. Que, na avaliação dele, é favorecida por uma postura não cooperativa por parte do Fisco. “Na dúvida, ele autua.”

Outros fatores que pesam, de acordo com ele, são a elevada concentração tributária por parte da União, o que faz com que Estados e municípios tenham de “correr atrás do dinheiro”, e a existência de um duplo sistema de julgamento – administrativo e judicial –, sendo que, no primeiro, há uma tendência maior de vitória do Fisco.
Contencioso do IRPJ corresponde a mais de oito anos de arrecadação

Um dos tributos que mais contribui para o contencioso tributário é o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ). A briga é grande: em 2019, correspondia a mais de oito anos de arrecadação.

“É um tributo muito antigo e há discussões que se arrastam por 20, 30 anos”, explica Lorreine Silva Messias, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Tributação do Insper.

O principal fator que explica as divergências entre governo e contribuintes é a legislação complexa. “E há discussões bilionárias no STF sobre o assunto”, complementa Lorreine.

Outro tributo que tem um peso relevante no contencioso é a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Nesse caso, a disputa corresponde a mais de três anos de arrecadação. A legislação é extensa e complexa e tem mudanças frequentes, explica a pesquisadora: “São muitas exceções”.
Diferenças regionais também pesam

Tributos mais presentes no dia a dia dos consumidores e dos prestadores de serviços também têm parcela significativa no contencioso tributário. O equivalente a 136,2% do que se recolhe todo ano em Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), cobrado pelos estados e sua principal fonte de arrecadação, é questionado administrativa e judicialmente. O grau de litígio é ainda maior no caso do Imposto sobre Serviços (ISS), de competência dos municípios: corresponde a 144,2% da arrecadação anual.

“São impostos cujas mudanças são difíceis de serem acompanhadas. Legislação e alíquotas mudam com muita frequência, o que afeta o pagamento dos tributos”, destaca Lorreine.

Outra dificuldade é que são cobrados por entes descentralizados: são 27 unidades da federação e mais de 5,5 mil municípios. “Essas diferenças regionais favorecem o contencioso tributário”, explica Fossatti, da FGV Direito Rio.

Os números sobre o ICMS e ISS são ainda maiores que os apontados pelo estudo, reconhece o Núcleo de Estudos de Tributação do Insper. Isso porque os números referentes ao tributo estadual abrangem 18 das 27 unidades da federação. E os do ISS correspondem a 10 das 26 capitais dos estados.