Ex-secretário da Receita diz que projeto liberal está ‘fortemente ameaçado’
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CNN Brasil
Ex-secretário da Receita Federal, Marcos Cintra afirma que o projeto liberal anunciado na campanha e defendido pelo ministro Paulo Guedes está “fortemente ameaçado”. À CNN, ele diz que o motivo é o presidente Jair Bolsonaro, que agora só mira a reeleição.
“A saída de Salim Mattar é emblemática, porque as privatizações compunham eixo fundamental do programa de governo. Paulo Uebel se viu diante de enorme frustração: parece que o presidente só fala em reeleição e o padrão é como os projetos vão afetar a reeleição”, afirma Cintra.
Ele se refere ao pedido de demissão de dois secretários de Guedes, movimento que foi classificado pelo ministro como “uma debandada” de sua pasta. Mattar comandava a venda de estatais, um programa que não decolou. Uebel formatou a reforma administrativa, que pretendia mexer nos salários de servidores e nas regras do funcionalismo. O projeto, porém, foi engavetado por Bolsonaro, que teme os impactos políticos da medida.
“A equipe de Paulo está então demandando dele como consequência dessa frustração. A grande frustração é o presidente não segurar o discurso de campanha, que o elegeu, e não segurar o ressurgimento de um ideal liberal e de alternância de poder”, diz.
Para Cintra, o ministro da Economia está neste momento “encalacrado”.
“Situação muito difícil, onde ele tem de servir a dois senhores: a visão da manutenção do status quo e as demandas populistas, que a pandemia agrava de fato. Mas, se ceder à ala mais gastadora, isso o desgasta muito e o deixa em muita dificuldade”, afirma.
“Se por um lado ele quer mostrar que deseja estar junto com o presidente, por outro lado, ele está se alinhando com uma ala política-eleitoral. O ministro está dedicado hoje a encontrar apoio no Congresso para avançar as reformas e não dentro do governo”.
Cintra participou, ainda 2018, das reuniões capitaneadas por Guedes no Rio de Janeiro para construir o programa de governo de Jair Bolsonaro. Foi um dos principais atores da transição e assumiu a Receita Federal em janeiro de 2019. Acabou demitido em setembro do ano passado após defender publicamente a criação de um imposto digital, ideia que foi comparada à antiga CPMF e que incomodou Bolsonaro.
A criação do tributo em substituição a outros impostos compunha o projeto desenhado pelo grupo de Guedes desde o início e passou agora a ser defendida abertamente pela equipe econômica.