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Análise: À espera do pacote para substituir CPMF

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O Globo Online

Valor Online

SÃO PAULO – Mesmo nesta última semana antes das festas de Natal e de Ano Novo, o mercado financeiro não terá sossego. Nos EUA, o cenário monetário parece dado, o que não é, porém, fator de tranqüilidade: confrontado pelos últimos índices de inflação, o Federal Reserve (Fed) não poderá mais reduzir o juro básico americano para aliviar a crise de crédito. O Índice de Preços ao Consumidor (CPI) subiu 0,8% em novembro e acumula nos últimos 12 meses alta de 4,3%. Ou seja, a taxa básica dos EUA, de 4,25%, paga juro real negativo. E a economia real não se adequa ao figurino recessivo desenhado pelos analistas. Muito pelo contrário, os últimos indicadores relativos a trabalho, produtividade, vendas no varejo e produção industrial revelam uma economia em crescimento moderado. A crise de crédito terá de ser combatida por leilões de liquidez e ajudas emergenciais, não por política de juros. Ou seja, como a solução não é geral nem homogênea, a perspectiva é de prolongamento da volatilidade. No Brasil, além de receber os estilhaços da volatilidade externa, os mercados têm razões domésticas para se inquietar nesse resto de ano.

O principal evento dessa semana será o pacote de ajuste fiscal prometido pelo governo para fechar o Orçamento de 2008 sem a receita da CPMF. Mas não poderá ser qualquer pacote. As medidas compensatórias terão de ser muito inteligentes, tecnicamente irrepreensíveis e contemplar os dois lados da balança fiscal: não basta aumentar impostos. O mercado espera um plano que restaure a credibilidade fiscal perdida, já que há muito em jogo. Dele depende os rumos da política monetária, a concessão do grau de investimento e a aceitação externa dos ativos brasileiros. O pacote terá de reverter o pessimismo instaurado a partir de quinta-feira. O fim da CPMF escancarou a má qualidade da política fiscal brasileira, executada em todas as esferas governamentais (união, estados e municípios), e coloca um ponto final na redução dos juros, na probabilidade de adoção do grau de investimento e no ciclo de alta dos ativos brasileiros , diz o economista-chefe da Gradual Corretora, Pedro Paulo Silveira.

As medidas destinadas a cobrir a perda de receita proveniente da CPMF precisam anular aquilo que o Banco Central chama de impulso fiscal . A frouxidão fiscal aumenta a renda privada. É por isso que os governos cortam impostos quando querem debelar um quadro recessivo. Se a sociedade optar pelo consumo e não pela poupança, a renda extra produz inflação. Um governo fiscalmente frágil anula o esforço para obtenção do grau de investimento. Isso pode prejudicar o aporte de dólares. Para combater a inflação em alta e o câmbio depreciado, o BC terá de se valer de uma política monetária mais firme.

O governo terá de cortar, em suas despesas, tudo o que não conseguir trazer de volta, via aumento de outros impostos, para compensar a perda da CPMF. Se não fizer isso, estará dando um incentivo adicional a uma expansão econômica já tida como preocupante pelo BC. Isso porque, em uma comparação numérica feita por Silveira, um corte de impostos de 0,7% do PIB irá levar a um aumento superior a isso no consumo total (consumo das famílias e investimentos das empresas). É de se esperar que o fim da CPMF acrescente à taxa de crescimento de 2008 algo ao redor de 1,2% , prevê o economista. Para um Copom zeloso de sua reputação monetária, tal impulso fiscal é uma afronta.

O cenário que combina impulso fiscal, adiamento do grau de investimento e eternização da crise de crédito americana já faz estragos. O dólar fechou sexta-feira cotado a R$ 1,7970, com valorização de 0,78%. Na semana acumulou alta de 2,04%. Na mão contrária, a Bovespa perdeu 4,87%. Os contratos de juros futuros devolveram, na sexta-feira, parte das exageradas altas sofridas na véspera, mas a curva futura mantém-se positivamente inclinada. Considerando-se os CDIs previstos para as próximas cinco viradas de ano, a taxa avança sucessivamente de 11,12% para 11,93%, 12,61%, 12,86% e 12,87%.

No Brasil, a agenda da semana está carregada de indicadores sobre inflação, o principal dos quais, o IPCA-15, será divulgado na quinta-feira. Será uma prévia do índice oficial de inflação do último mês do ano. A expectativa é de que suba de 0,23% para 0,55%. Nos EUA, além de novos dados sobre o crítico setor imobiliário, um índice de inflação muito observado pelo Fed será conhecido na sexta-feira. Trata-se do PCE, o índice dos gastos pessoais dos consumidores americanos. A previsão é de um núcleo em alta acomodada de 0,20%.

(Luiz Sérgio Guimarães | Valor Econômico)