A desoneração da folha de salários, em estudo no governo federal, pode ser feita com a criação de um novo tributo que vai incidir sobre o faturamento das empresas e pode ter alíquota de cerca de 4%. Esse imposto, cuja implementação seria gradativa ao longo de três anos, substituiria metade da contribuição previdenciária patronal – que cairia, também de forma gradual, dos atuais 20% sobre a folha para até 10%. "A alíquota pode ser de até 4% sobre o faturamento, mas estamos tentando algo mais reduzido", revelou o coordenador-geral de Política Tributária da Receita Federal, Ronaldo Medina, ontem ao Valor.
Essa é a opção mais plausível, hoje, para viabilizar a desoneração da folha de pagamentos prometida há alguns meses pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Medina ponderou que ainda não há decisão política do governo e os estudos da Receita prosseguem, mas o objetivo, com esse novo tributo, é arrecadar cerca de R$ 60 bilhões anuais, cifra equivalente à perda estimada de de arrecadação com a desoneração parcial da folha.
Um aspecto delicado da medida ainda está sob avaliação: como fazer com que esse tributo incida sobre as instituições financeiras, que alegam que banco não paga imposto sobre faturamento porque simplesmente não têm faturamento, mas sim receita bruta operacional, que é um conceito distinto. Uma longa disputa vem sendo travada na justiça sobre isso e o Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não se pronunciou.
A Receita não considera viável a alternativa de apenas aumentar as contribuições do PIS e da Cofins, tributos que já incidem sobre o faturamento, atualmente com alíquota de 9,25%. Segundo Medina, isso seria muito complicado, dado que as exportações são isentas e diversos outros grupos de produtos têm reduções de alíquota, como os da cesta básica, medicamentos e ônibus para transporte escolar.
Além desse problema, PIS, Cofins e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) devem ser absorvidos, na reforma tributária, pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA). E o IVA tem regime de débito e crédito, com compensações, o que não serve para financiar uma despesa fixa como a da Previdência. Portanto, para a Receita, a melhor proposta é a de se criar esse novo tributo, ainda sem nome.
"Tem de ser algo mais baixo para que todos paguem e a carga tributária não seja elevada. Pensamos no faturamento como base desse novo tributo porque é a mais ampla que existe e permite a cobrança de uma alíquota mais baixa", explicou.
No novo modelo, a contribuição paga atualmente pelo empregado seria mantida e as pessoas jurídicas sem fins lucrativos também continuariam pagando a atual contribuição previdenciária patronal de 20% sobre a folha. Esse é o caso, por exemplo, de clubes, associações, sindicatos e da administração pública. "Nesses casos, não há outra base tributável. Mas não é ruim para a economia porque não há concorrência entre esses contribuintes", ponderou Medina.
Outro aspecto importante para a definição da alíquota em torno de 4% é, segundo Medina, a aplicação gradual que deve demorar aproximadamente três anos. A implementação da redução da contribuição previdenciária sobre a folha será feita em três etapas, simultaneamente à gradação da alíquota do novo tributo, sendo que a alíquota definitiva será adotada apenas no último período. "Estamos fazendo simulações para verificar qual o impacto desse novo tributo sobre os preços", informou.
Medina admitiu que o maior "nó" tem sido medir as consequências dessas medidas sobre os setores que mais investiram em tecnologia e reduziram seus custos com mão-de-obra. Nessa análise é preciso separar o que é redução efetiva – substituição de pessoas por máquinas -, e o que é mera terceirização de mão-de-obra. Ele ressaltou que será reduzido o custo de contratação de trabalhadores, o que melhora a competitividade do país. "O sistema atual é enviesado contra o emprego formal. E R$ 60 bilhões é uma quantia pequena para a economia do país", disse.
Mantega terá reunião com o ministro da Previdência, Luiz Marinho, para discutir esse assunto. No último encontro do Fórum Nacional da Previdência Social, Marinho comentou que, para preservar o equilíbrio das contas do INSS, a desoneração da folha de pagamento tem de ser compensada com a migração da carga para o faturamento das empresas. Outro compromisso reiterado pelo fórum é não aumentar a carga tributária.
O secretário de Políticas de Previdência, Helmut Schwarzer, disse recentemente que um caminho que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá escolher é o da redução imediata de cinco pontos percentuais na contribuição patronal, atualmente de 20% sobre a folha de pagamento, ainda este ano. Nos anos seguintes, a diminuição da alíquota seria gradual até chegar aos 10%. Com esse alívio, espera-se mais formalização e criação de empregos.