Nota eletrônica preocupa pequenas empresas
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Sergio Lamucci
O projeto de lei que cria a nota fiscal eletrônica no Estado de São Paulo tem enfrentado críticas de deputados e de representantes de micro e pequenas empresas. Há reclamações quanto às regras para a devolução de até 30% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago pelos consumidores, ainda que a iniciativa seja considerada positiva. Em alguns casos, o consumidor poderá não receber nada, o que acontecerá se o estabelecimento tiver mais créditos do que débitos de ICMS referentes ao mês em que tiverem ocorrido as compras.
Também há quem aponte o risco de o projeto prejudicar os pequenos estabelecimentos e beneficiar os grandes. A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo rebate as críticas. “O projeto reduz a carga tributária na prática, não é discurso”, diz o secretário-adjunto da Fazenda, George Hermann Tormin.
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O deputado estadual Mário Reali (PT) se diz preocupado com os pequenos estabelecimentos, caso o projeto seja aprovado com a atual redação. Ele teme que a iniciativa leve o consumidor a concentrar as compras em grandes lojas, para ter direito a devolução maior do imposto. Para Reali, o risco está implícito no artigo 3º do projeto, que prevê que o valor correspondente a até 30% do ICMS será atribuído como crédito aos consumidores “na proporção do valor de suas aquisições em relação ao valor total das operações e prestações realizadas pelo estabelecimento fornecedor no período”.
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Segundo Tormin, poderá haver casos em que o consumidor terá direito a créditos maiores num grande estabelecimento do que num pequeno, mas o inverso também poderá ser verdadeiro. Ele explica que o Estado devolverá 30% do valor do ICMS que o estabelecimento recolher, distribuídos proporcionalmente aos consumidores de acordo com o valor da compra. Se um estabelecimento comercial tiver mais créditos do que débitos de ICMS num determinado mês, o consumidor que adquiriu produtos lá não terá direito a devolução, porque o Estado não terá recebido nada referente ao período. Isso pode ocorrer, segundo ele, no caso de um grande varejista que tenha feito muitas compras num mês, para formar estoques, acumulando volume significativo de créditos de ICMS.
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Já as micro e pequenas empresas que optarem pelo Super Simples (regime tributário especial para companhias de menor porte) sempre recolherão ICMS, diz Tormin. As empresas do setor de comércio com faturamento até R$ 120 mil, por exemplo, vão pagar alíquota única de 4%, dos quais 1,25 ponto percentual se refere ao ICMS. A questão é que, como Estado vai devolver até 30% do ICMS que receber – sempre distribuindo proporcionalmente de acordo com o valor da compra -, a tendência é que o consumidor tenha direito a um crédito baixo quando comprar num estabelecimento pequeno.
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Em resumo, o crédito a ser recebido leva em conta o valor gasto pelo consumidor, mas depende de quanto imposto será recolhido pelo estabelecimento. O deputado estadual Orlando Morando (PSDB), da base de sustentação do governo na Assembléia Legislativa, também vê alguns problemas na iniciativa, embora aprove a idéia. Dada a forma de devolução do ICMS prevista no projeto, uma compra de mesmo valor realizada no mesmo estabelecimento em meses diferentes poderá dar direito a créditos de valores diferentes. “Como explicar isso ao consumidor? Isso é no mínimo preocupante”, afirma ele, que é vice-presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas).
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O deputado Vítor Sapienza (PPS) considera um problema o fato de que o consumidor pode “juntar um monte de notas fiscais” e no fim das contas ter direito a um crédito muito pequeno. “Isso pode provocar descrédito a uma iniciativa que é positiva.”
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Para que essas questões não desestimulem o consumidor a pedir a nota fiscal, o projeto prevê um modelo de premiação, em que haverá sorteios para quem exigir o documento. Casas, carros e computadores poderão ser alguns dos prêmios, diz Tormin. Ele acha que, com isso, mesmo quem comprar um produto como um CD vai pedir o comprovante fiscal, ainda que ele dê direito a um crédito de poucos centavos. “O incentivo é duplo para quem exigir a nota.”
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O presidente do Sindicato da Micro e Pequena Indústria (Simpi), Joseph Couri, critica o que considera a falta de planejamento no projeto de implementação da nota fiscal eletrônica. Segundo ele, seria importante que a secretaria ouvisse o que o setor produtivo tem a dizer sobre o assunto, uma vez que a medida deverá ter custos para os empresários. Tormin diz que, uma vez aprovado o projeto, a idéia da Secretaria da Fazenda é integrar uma média de 100 mil empresas por mês ao projeto, o que deve levar oito meses no total.
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Couri, Reali e Morando se preocupam com os custos que o projeto pode impor aos micro e pequenos empresários. O deputado tucano avalia que o empresário pode ter que gastar R$ 5 mil em equipamentos para se adequar ao sistema, incluindo computador e o emissor de cupom fiscal. “Se o valor for esse mesmo, é uma exorbitância para o micro e pequeno empresário”, diz Couri.
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Tormin rebate essa avaliação. Ele diz que o emissor de cupom fiscal custa entre R$ 1,3 mil e R$ 1,5 mil, mas o equipamento é obrigatório para a integração da empresa ao programa de nota fiscal eletrônica. Para quem tem computador, é possível emitir a nota fiscal on-line, diz. No caso de quem ainda trabalha com o bloco de notas, será possível fazer a conversão dos documentos em notas eletrônicas, registrando-as no site da Secretaria da Fazenda. “Nos postos do Acessa São Paulo, há acesso gratuito à internet. Isso tem custo zero para o empresário”, diz Tormin.
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Reali também vê problemas no valor da multa prevista para quem não emitir ou não entregar o documento fiscal ao consumidor, de R$ 500, a ser corrigida pela Unidade Fiscal do Estado de São Paulo (Ufesp). Para ele, a quantia é irrisória para um grande varejista, mas poder ser muito elevada para um estabelecimento pequeno. Tormin diz que a sonegação é crime, “independentemente de quem o comete”. “Para não pagar a multa, basta não sonegar.” Ele acrescenta que a multa não é de natureza tributária, mas de proteção ao consumidor.
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O governo pretendia aprovar o projeto antes do recesso na Assembléia, que começou na quinta-feira passada, mas não foi possível. A votação está marcada para 8 de agosto. O crédito de ICMS poderá ser usado pelo consumidor para diminuir o valor do débito do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) do exercício seguinte, ser depositado em dinheiro na conta corrente ou na poupança ou ser creditado em cartão de crédito.
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