Tributo simples é tributo justo?
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Entusiastas da simplicidade crêem na tese um tanto puída da justiça tributária com praticidade, mas há controvérsias
Fernando Zilveti
Os entusiastas da simplicidade ou praticidade sustentam tese um tanto puída da identidade conceitual da justiça tributária com praticidade. Acreditam que a tributação simples atende melhor o contribuinte que, graças ao tributo prático, passaria a se preocupar mais com a gestão de suas atividades pessoais e profissionais e menos com a relação tributária.
De fato, no campo ideológico, a tributação simples e prática seria mais igualitária sempre que sua sistemática facultasse melhor divisão da carga tributária na proporção da capacidade contributiva do cidadão. Assim, quanto mais prática fosse a tributação, melhor seria a distribuição do encargo das despesas públicas.
No Brasil, tese equivalente é sustentada por parcela da doutrina especializada em política fiscal. Segundo essa teoria, o tributo simples facilita a vida do contribuinte, evita informalidade e melhora qualitativamente a arrecadação. Além disso, o tributo simples seria responsável pelo excepcional implemento na arrecadação nos últimos 15 anos. Com efeito, após a implantação de alguns sistemas práticos de arrecadação como o Simples e o Lucro Presumido para a tributação das pessoas jurídicas, e o método de ajuste simplificado para o Imposto de Renda das pessoas físicas, a Receita Federal experimentou um salto de arrecadação sem precedentes na história recente das finanças públicas.
Alguns tecnocratas chegam a criar índices de eficiência fiscal, com base em estatísticas econômicas de arrecadação por tipo de tributo, segregados aqueles de maior e menor complexidade em relação ao objeto, como a renda, o consumo, serviços, patrimônio, etc. Estudo realizado pela Fundação Instituto de Pesquisa Econômica (FIPE), vinculada à Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo , propõe a implementação de programas de simplificação tributária. Dentre as sugestões desse respeitável instituto se destacam duas medidas: a) unir todos os impostos sobre consumo em apenas um único imposto, cuja base seria o valor adicionado total de bens e serviços nacionais e importados, com alíquota única; b) fusão de tributos sobre a renda (IR, CSLL, COFINS, etc.) num único tributo federal com alíquota única. O sistema tributário proposto, sustenta a FIPE, "além de mais simples e racional, promoveria a redução de preços, seria menos regressivo, promoveria a distribuição de renda a favor dos mais pobres e desestimularia a informalidade no mercado de produtos e de trabalho". Esse estudo ressalta, afinal, que a racionalização do sistema tributário resultaria numa redução de carga fiscal.
Contrapõe-se, porém, ao argumento da eficiência fiscal da tributação prática, a implantação da mecânica não acumulativa em relação às contribuições sociais PIS e COFINS. Sistema complexo não acumulativo de base contra base provocou significativo aumento na carga tributária relacionada a esses tributos nos últimos anos.
A observação dos dados de arrecadação divulgados pela Receita Federal não leva à conclusão da eficiência fiscal dos tributos práticos ou simplificados. Revela apenas que a implantação de instrumentos de arrecadação tem efeito no implemento da arrecadação. Em outras palavras, a tributação prática ou complexa pode trazer efeitos positivos para o Fisco que, dessa forma, aumenta seus recursos fiscais.
Verifica-se, portanto, uma confusão entre tributação prática e tributação forfetária. A segunda modalidade de arrecadação é também conhecida como planta genérica de valores, utilizada no ICMS e em outros tributos. Aquilo que se denominou tributação simples, hoje chamado de "supersimples", é apenas forma de propaganda política. Por meio da introdução dessas mecânicas tributárias, o Fisco e o contribuinte sabem antecipadamente quanto devem, respectivamente, recolher e pagar. Nada mais.
O que não se revela, afinal, são os efeitos práticos para o contribuinte da implementação da tributação simplificada forfetária. No imposto de renda das pessoas físicas, por exemplo, a simplificação do sistema de ajustes trouxe impactos negativos na regressividade desse tributo, que forçou as famílias a optar por descontos simplificados diante da limitação de deduções de despesas com saúde, escola e educação, itens de significativo peso nos custos da família. Para as empresas, a tributação simplificada limitou a gestão do micro e pequeno empresário , que paga tributos mesmo quando seu negócio não produz renda líquida para tanto.
Enquanto isso, graças à mecânica forfetária, aumenta a arrecadação e, em igual proporção, o gasto público. A pressão fiscal conduz a tributação à crescente forfetização do sistema. Conclui-se portanto, que nem sempre o tributo simples é prático, tampouco é justo.
O filósofo alemão Jürgen Habermas disse que o Brasil vive vários séculos ao mesmo tempo. Embora não seja totalmente industrializado, já sente a pressão das idéias geradas pelos primórdios da sociedade pós-industrial. Sofre a influência dos desencantos com Prometeu e o princípio do desempenho.
Entusiastas da simplicidade crêem na tese um tanto puída da justiça tributária com praticidade, mas há controvérsias.