Expansão do SIMPLES cria ineficiência, diz especialista
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Valor Econômico
O projeto de lei que eleva o teto do Simples de R$ 3,6 milhões para R$ 14,4 milhões não divide opiniões apenas entre os órgãos do governo.
Apesar dos argumentos de que os sistema de tributação direcionado às micro e pequenas empresas possibilita desburocratização e formalização dos pequenos empreendedores, o economista Bernard Appy, ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda e diretor do Centro de Cidadania Fiscal, afirma que a maior abrangência do Simples acentua distorções, fere a isonomia e cria ineficiência econômica.
Appy destaca que é a favor da desburocratização e de um sistema de tributação que proteja os pequenos negócios, principalmente da concorrência com empresas informais. Ele acredita, porém, que a cobrança de tributos diversos calculados sobre o faturamento que acontece no Simples e também no lucro presumido gera distorções.
“É um sistema que trata os desiguais de forma igual, o que cria uma iniquidade distributiva”, diz Appy. Como a base de cálculo do Simples é a receita, diz o economista, ele traz a mesma carga tributária para empresas com margens diferentes. Quem tem uma margem de lucro alta, argumenta, tem o mesmo desembolso de IR de quem tem margens mais apertadas. Pelo Simples, as micro e pequenas empresas pagam tributos federais IR, CSLL, PIS e Cofins com base numa alíquota única calculada sobre o faturamento.
Appy exemplifica com duas empresas comerciais que têm o mesmo faturamento, de R$ 15 mil por mês. A primeira, diz ele, é uma padaria com alto giro, mas com altos custos e margem apertada, de 20%. Ou seja, a renda gerada, apropriada como salários e lucros, é de R$ 3 mil ao mês.
A segunda empresa, diz ele, é uma loja de roupas de grife com igual faturamento, mas margem de 50%. Ou seja, gera renda de R$ 7,5 mil. Mesmo com margens tão distintas, as duas empresas pagam tributos federais da mesma forma: 4% calculados sobre os R$ 15 mil, ou seja, R$ 600 em tributos federais mensais que, para a padaria, representam 20% da renda gerada. No caso da loja de roupas, os tributos somam apenas 8%. Essa distorção, diz Appy, faz profissionais de alta renda e com baixos custos migrarem para sistemas de tributação como Simples ou lucro presumido, em busca de carga tributária menor.
Ele exemplifica com um eletricista com receita de R$ 3 mil mensais. Se for empregado de uma empresa que paga IR pelo lucro presumido, a carga tributária global do eletricista e do empregador será de 40%, levando em conta o (ISS e a contribuição previdenciária (INSS), além de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins.
Como sócio de uma empresa do Simples, a carga tributária cai para no máximo 24,8% e no mínimo 11,3%, dependendo da opção em relação à contribuição previdenciária, segundo cálculos de Appy. O lucro distribuído aos proprietários das empresas é isento na pessoa física, diz ele. “Isso permite que pessoas de alta renda, que são proprietários de empresas, paguem muito pouco IR.”
Como a tributação será menor, a renda líquida do eletricista será maior, o que não estimula o profissional a fazer mais atendimentos, por exemplo.
“Isso reduz a produtividade da economia”. A distorção, diz o economista, já existe hoje com os limites em vigor. “Se houver uma elevação do teto do Simples para R$ 14,4 milhões de receita ao ano o impacto para o crescimento da economia será muito maior.”
O economista lembra que atualmente o teto para o Simples já é muito alto na comparação com os regimes simplificados de tributação para micro e pequenas empresas de outros países. No Brasil, diz Appy, o limite do Simples já corresponde a US$ 1 milhão ao ano. Na Argentina, indica ele, o teto equivale a US$ 48,76 mil para serviços e a US$ 73,14 mil para o comércio. No México, equivale a US$ 148,62 mil.
Para Appy, as distorções existem em razão do modelo adotado, que tem como referência a receita das empresas. Ele defende que o regime deveria levar em conta o valor adicionado, que é a diferença entre o faturamento da empresa e o custo do insumos usados na produção ou das mercadorias revendidas, no caso do comércio. Segundo Appy, a implementação da nota fiscal eletrônica irá permitir o controle dos dados da empresa, que não teria dificuldades para calcular o valor adicionado. O economista também defende que os dividendos passem a ser submetidos ao IR na pessoa física. “Se o lucro for reinvestido, não. Mas se for distribuído, o imposto deve ser pago.”
Fonte: Valor Econômico – Por Marta Watanabe