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As duas faces da receita

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Portal Exame

Ela é uma máquina na arte de arrecadar, mas uma tortura para o cidadão. A Super Receita pode melhorar o lado ruim

Por Alexa Salomão

exame

Nos últimos anos, a Receita Federal transformou-se em um dos mais intrigantes paradoxos do Estado brasileiro. Na contramão da inoperância reinante na maioria dos órgãos públicos, é um caso exemplar de eficiência quando se trata de cumprir sua principal função, arrecadar impostos. Quase todo mês anuncia um novo recorde na coleta — no ano passado recolheu a cifra inédita de 393 bilhões de reais para os cofres do governo. Seus auditores estão entre os funcionários públicos mais bem formados e, quando menos se espera, aparecem ao lado de esquadrões da Polícia Federal em operações espetaculares contra supostos sonegadores. A vitrine mais luminosa da eficiência do órgão é o sistema de entrega de declarações do imposto de renda pela internet, capaz de assimilar 3 000 declarações por segundo, um caso raro de inovação que colocou o país à frente do resto do mundo.

No extremo oposto, a mesma Receita vira exemplo crasso de descaso quando precisa cumprir outra função essencial, a de sanar as dúvidas e as queixas do contribuinte. Nos grandes centros urbanos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, as longas filas diante de seus guichês viraram cartões-postais da inépcia em servir a população. Mais estafante é conviver com seus trâmites burocráticos. Os detalhes para preencher a papelada exigida são tantos e mudam com tanta rapidez que se transformaram em armadilhas. Estima-se que mais de 80% das empresas brasileiras têm hoje alguma pendência com o Fisco por causa de erros tolos no preenchimento dos documentos ou por divergências na interpretação da legislação tributária. Questioná-las rende longas discussões administrativas com o órgão e, não raro, processos judiciais que levam anos para ser decididos. "Nos últimos anos, o Brasil convive com duas Receitas", diz Tércio Chiavassas, advogado tributarista e sócio do escritório Pinheiro Neto. "A Receita que arrecada é um organismo moderno e competente. A que atende o contribuinte vive no século 19."