Art. 78, § 2º do ADCT: Uma Nova Modalidade de Compensação Tributária.
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Helton Kramer Lustoza
João Paulo Souza Carneiro
I – Da Compensação do Direito Civil à Compensação com Precatórios
A compensação é um instituto tradicional do Direito das Obrigações, sendo que seu locus original está pautado no Direito Civil, que lhe deu identidade e as notas caracterizadoras.
Nesse sentido, Sílvio Rodrigues identifica esse instituto "como um meio de extinção das obrigações e opera pelo encontro de dois créditos recíprocos entre as mesmas partes. Se os créditos forem de igual valor, ambos desaparecem integralmente; se forem de valores diferentes, o maior se reduz à importância correspondente ao menor"(1).
Em outras palavras, é uma forma de pagamento, através do qual haverá a extinção da obrigação entre duas pessoas pelo encontro de créditos e débitos, limitado o efeito extintivo à menor das obrigações.
Do Direito Civil, o instituto da compensação foi transplantado para o Direito Tributário, dentro do qual assumiu feições próprias, compatíveis com um caráter publicístico – não à toa, para diferenciá-la da disciplina dada pela legislação civil, Sacha Calmon chama-a de compensação fiscal.
O que mais evidencia a especificidade dada a essa extinção obrigacional no âmbito tributário é que essa matéria está disciplinada pela Carta Magna, sendo que o artigo 146, III, b da Constituição Federal previu caber somente a lei complementar regular as normas gerais sobre a obrigação e crédito tributário(2).
Seguindo essas diretrizes constitucionais, a compensação tributária atualmente é regulamentada pelo artigo 170 do Código Tributário Nacional (legislação recepcionada com força de Lei Complementar), a qual fixou algumas particularidades:
Art. 170 A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.(Grifos nossos)
Esse dispositivo legal estabelece três premissas para que esse instituto seja operado no Direito Tributário: 1) a existência de uma lei disciplinadora; 2) a utilização de créditos tributários; e 3) a presença da Fazenda Pública.
Desenhadas essas distinções, observa-se a existência de uma nova possibilidade de pagamento de débitos tributários, estabelecida pelo artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com modificação feita pela Emenda Constitucional nº 30, de 2000, introduziu-se no ordenamento jurídico brasileiro uma nova espécie de extinção de obrigações, podendo este instituto ser qualificado como compensação constitucional, vez que seus contornos foram delineados de forma suficiente na Carta Magna. Assim dispõe esse dispositivo constitucional:
Art. 78. Ressalvados os créditos definidos em lei como de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os de que trata o art. 33 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e suas complementações e os que já tiverem os seus respectivos recursos liberados ou depositados em juízo, os precatórios pendentes na data de promulgação desta Emenda e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos, permitida a cessão dos créditos.
(…)
§ 2º As prestações anuais a que se refere o caput deste artigo terão, se não liquidadas até o final do exercício a que se referem, poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora.
O dispositivo supratranscrito reza que os entes federativos deverão quitar as quantias referentes a precatórios pendentes até 13 de setembro de 2000 (data de promulgação da Emenda) e de ações ajuizadas até 31 de dezembro de 1999, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo de 10 anos. Caso tal obrigação seja descumprida, os valores referentes às prestações inadimplidas poderão ser abatidos com débitos junto àquela entidade devedora.
Afigura-se com clareza que a Constituição Federal institui uma hipótese de compensação, em enunciado que não está vinculado ao procedimento prescrito pelo art. 170 do Código Tributário Nacional.
Enquanto que a compensação prevista pelo CTN é uma norma de competência(3), que confere ao legislador infraconstitucional a possibilidade de editar uma norma autorizadora de compensação mediante a utilização de créditos tributários, o dispositivo constitucional acima citado encerra uma norma sancionatória(4), dirigida ao Estado-devedor que descumpre a norma de conduta(5) inscrita no caput do mesmo enunciado.
Em outras palavras, o art. 78, caput, impõe um comportamento ao Estado (um modal deôntico "obrigatório"): liquidar precatórios. Diante do descumprimento dessa obrigação, emerge a sanção: liberação dos valores desse precatório para pagamento com débitos perante a mesma entidade devedora.
Surge, assim, uma conduta substitutiva reparatória em favor do contribuinte-credor, em face da inadimplência do Estado-devedor, sendo que essa sanção será operacionalizada através da compensação.
Diante do descumprimento da norma de conduta a sanção incide de forma automática e infalível, não requerendo normatividade ulterior, pois contém em si todos os elementos necessários à plena eficácia(6). Ao Estado-devedor (qualificado no dispositivo como "entidade devedora") só resta submeter-se à norma punitiva e todos os seus preceitos, sob pena de violar a legitimidade do ordenamento jurídico, segundo entendimento de Hans Kelsen(7).
Para que a referida norma contenha o necessário efeito sancionador, é fundamental que seja dotada de plena eficácia, para o fim de proteger o núcleo normativo da norma de conduta. Ora, ao se conceber que essa norma exige normatividade ulterior, está-se retirando dela o timbre sancionatório e a idoneidade de proteger a comportamento regulado, seria uma interpretação que defrauda a normatividade constitucional.
Além disso, há outro fator que demonstra a auto-aplicabilidade do art. 78, § 2º, do ADCT: a sua localização topográfica. Tendo como pressuposto que o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias faz parte do texto constitucional, o artigo em foco é dotado de força normativa constitucional, sendo que ao criá-lo através da Emenda Constitucional 30/2000, colocou-o a salvo de qualquer legislação infraconstitucional que poderia restringir o seu alcance, imunizou-o, inclusive, da incidência do art. 146, III, "b", da Constituição Federal, que exige Lei Complementar para disciplinar as normas gerais sobre obrigação e crédito tributário.
Cabe salientar que a norma em questão é de cunho constitucional, o que segundo a doutrina de J. J. Gomes Canotilho(8) deverá ser interpretada na busca da concretização do princípio da máxima efetividade dos preceitos, o que leva o operador jurídico a encontrar a interpretação que mais atenda ao interesse constitucional.
Demonstra-se, assim, que o art. 78, § 2º, do ADCT prevê uma compensação de caráter constitucional, longe de expressar a necessidade de intermediação legislativa, revela o contrário: essa espécie de extinção de obrigações está protegida pela força normativa da Carta Magna contra interferências do legislador ordinário.
Portanto, do exposto extrai-se a conclusão de que o ADCT estatui uma espécie de compensação constitucional auto-aplicável, que se diferencia da compensação fiscal do Direito Tributário por não requerer qualquer intermediação legislativa, criando uma estrutura sintática que estabelece uma relação de causa e efeito automática, infalível e perfeita.
II – Da Quitação de Tributos por Meio de Créditos Oriundos de Precatórios e Algumas Limitações Feitas Pela Legislação Infra-Constitucional:
Atualmente é comum o contribuinte buscar mecanismos para tentar minimizar seus gastos com tributos, barrando assim a sanha arrecadadora do Estado. Como bem afirma Albert Hensel: "É aspiração naturalíssima e intimamente ligada à vida econômica, a de se procurar determinado resultado econômico com a maior economia, isto é, com a menor despesa (e os tributos que incidirão sobre os atos e fatos necessários à obtenção daquele resultado econômico, são parcelas que integrarão a despesa"(9). É nesse panorama que surgiram meios alternativos e menos onerosos para pagamento de tributos.
Em face da notória inadimplência dos Estados, muito se discutia acerca da possibilidade de utilização dos precatórios não pagos para abater com créditos tributários, o que fez surgir uma alternativa interessante para as empresas.
Para se ter uma Idéia a situação de não cumprimento de ordens de pagamento por parte da Fazenda Pública é tão grave, que no dia 26 de abril de 2006 o Desembargador Genaro José Baroni Borges propôs junto à 21ª Câmara Cível do TJRS que fosse noticiado ao Ministério Público descumprimento de ordem judicial para pagamento de precatório, para que este órgão ministerial deliberasse sobre o oferecimento de denúncia do administrador por improbidade administrativa. No voto encaminhado, destaca-se que o descumprimento pelo agente público desatende ao princípio da legalidade e o expõe à responsabilidade por infringir o art. 37 "caput", art. 100, parágrafo 1º, da Constituição Federal e do art. 11, "caput", da Lei 8.429/92(10).
É nesse cenário que foi promulgada a Emenda Constitucional n. 30 de 2000, a qual atribuiu poder liberatório às parcelas do precatório vencidas e não pagas (chamados de "décimos vencidos"), para pagamentos de débitos junto a entidade devedora, ressalvados os créditos de pequeno valor ou de natureza alimentícia. Também é possível que o titular transfira o crédito advindo de precatórios a terceiros interessados.
Para a efetivação dessa compensação constitucional foi necessário que os entes federativos criassem uma normatização interna para disciplinar o procedimento a ser seguido, desde que não extrapolando os limites, nem inovando nos postulados estatuídos pelo dispositivo constitucional. Pois, diante da auto-aplicabilidade da norma constitucional em voga, tem-se que a legislação infraconstitucional a respeito do tema tem um caráter eminentemente regulamentar(11).
No Estado do Paraná o procedimento administrativo da compensação constitucional (art. 78, § 2º do ADCT) encontra-se atualmente disciplinado pelo Decreto 5154/2001(12) (14), o qual estabelece as rotinas a serem obedecidas pelo contribuinte-credor que visa a imputação de valores de precatório judicial à Fazenda Pública Estadual.
Ocorre que esse decreto estadual prescreveu que a compensação somente será reconhecida pela Fazenda Pública se dentre outras formalidades o débito a ser abatido estiver inscrito em Dívida Ativa e, que a cessão de créditos do precatório tenha sido homologada pelo Juízo competente com a conseqüente comunicação ao Tribunal responsável por meio de ofício.
Tal diploma legal ao disciplinar as condições desse procedimento compensatório, acabou criando restrições ao próprio direito da compensação constitucional, constituindo-se numa flagrante inconstitucionalidade por extravasar os preceitos estatuídos pelo art. 78 do ADCT.
No âmbito federal, a Secretaria da Receita Federal em reiteradas decisões tem rejeitado os procedimentos de compensações tributárias utilizando-se dos preceitos do § 12 do artigo 74 da Lei 9430/96(13). Esse dispositivo legal faz uma vedação expressa da utilização créditos de precatórios oriundos de cessão para compensação com débitos tributários, o que ofende diretamente a Carta Magna, eis que a norma constitucional supracitada possibilita "a cessão dos créditos".
Diante desse quadro, os contribuintes viram-se impedidos de realizarem a compensação com tais valores, uma vez que os entes federativos criaram uma série de requisitos e condições que não estavam previstos na Constituição Federal. Não poderia a legislação infraconstitucional inovar no ordenamento, limitando o direito que estava expressa e suficientemente garantido pela Carta da República, sendo que diante dessa situação Luís Roberto Barroso defende que todas "as leis, atos normativos e atos jurídicos em geral não poderão existir validamente se incompatíveis com alguma norma constitucional"(14). Em outras palavras, ao legislador ordinário somente estaria permitido regulamentar a liturgia a ser seguida para operacionalizar o direito estabelecido no artigo 78 do ADCT, sendo vedado a interferência nos elementos intrínsecos do mandamento constitucional, quais sejam: origem, natureza e poder liberatório das ordens judiciais de pagamento.
Compartilhando com essa tese, o professor Luciano Amaro ensina que diante da existência de uma permissão para compensação tributária feita pela norma jurídica, onde estão delineados os principais elementos desse procedimento, esse direito produziria efeitos ipso jure, eliminando a discricionariedade do Poder Público(15).
Frente aos impedimentos criados ao procedimento administrativo dessa compensação constitucional pela legislação infraconstitucional, a jurisprudência se mostra bem favorável a legalidade da cessão dos créditos de precatórios oriundos de terceiros com a finalidade de extinguir débitos tributários, tornado desnecessária a homologação da mesma. Eis a decisão do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 687761, in verbis:
"PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO DE SENTENÇA – CESSÃO DE CRÉDITO – PRECATÓRIO – PEDIDO DE HABILITAÇÃO DO NOVO CREDOR – DESNECESSIDADE DA ANUÊNCIA DO DEVEDOR. 1. Os arts. 41 e 42 do CPC, que dizem respeito ao processo de conhecimento, impuseram como regra a estabilidade da relação processual e, havendo cessão da coisa ou do direito litigioso, o adquirente ou o cessionário somente poderão ingressar em juízo com a anuência da parte contrária. 2. No processo de execução, diferentemente, o direito material já está certificado e o cessionário pode dar início à execução ou nela prosseguir sem que tenha que consentir o devedor. 3. Os dispositivos do Código Civil (art. 290 do CC/2002 e 1069 do CC/1916), que regulam genericamente a cessão de crédito como modalidade de transmissão das obrigações, não se aplicam à espécie, mas o Código de Processo Civil, que é norma especial e dispôs diversamente quando se trata de cessão de crédito sub judice. 4. Recurso especial provido. (STJ – Resp 687761/RS – Rel: Min. Eliana Calmon. Segunda Turma. Julg. 06/12/2005 – DJ 19/12/2005 p. 345)
Em outras ocasiões o Superior Tribunal de Justiça tem decidido reiteradamente que a homologação das cessões de créditos judiciais é desnecessária, deixando claro que são inválidas as restrições impostas pela legislação infraconstitucional(16), confirmando cada vez mais o entendimento da auto-aplicabilidade do artigo 78 do ADCT.
Nesse sentido, a ministra Eliana Calmon quando proferiu seu voto no Recurso Especial n. 687761/RS, entendeu que: "em se tratando de créditos provenientes de condenações judiciais, existe permissão constitucional expressa, assegurando a cessão dos créditos traduzidos em precatórios (ADCT Art. 78). Se assim acontece, não faz sentido condicionar a cessão ao consentimento do devedor – tanto mais, quando o devedor é o Estado, vinculado constitucionalmente ao princípio da impessoalidade(17)".
Por outro lado, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, num entendimento mais cauteloso, tem decidido pela necessidade da homologação da cessão realizada pelo Juízo competente para a execução da sentença(18). Ainda assim, tem-se que esse posicionamento foi adotado baseado no princípio da segurança jurídica, ou seja, numa presunção de que sem a homologação das cessões poderiam ocorrer fraudes ou simulações nesse negócio jurídico, de maneira alguma, está induzindo que essa Corte Jurisdicional tenha acatado a tese de que o artigo do ADCT não seria norma de eficácia plena (auto-aplicabilidade). Essa situação ficou mais clara quando do julgamento do Agravo de Instrumento n. 3702514, no qual ficou expresso o posicionamento dos Desembargadores pela auto-aplicabilidade do dispositivo em questão(19), no entanto mantiveram a exigência de homologação judicial das cessões.
Dessa maneira, sobre qualquer prisma que se analise, é de se confirmar o entendimento de que essa compensação constitucional é prevista por uma norma de eficácia plena, não podendo prevalecer as restrições e limitações impostas pela legislação infraconstitucional.
Essa modalidade de compensação, ao contrário da compensação tributária convencional, não está adstrita a conveniência e oportunidade da Administração Pública, já que àquela decorre de uma norma constitucional sancionatória, tornando os valores das parcelas não liquidadas do precatório do correspondente período passíveis de serem imputados como pagamento à vista em face da entidade devedora para quitação de todo e qualquer débito (seja ele corrente, inscrito em divida ativa ou parcelado), esse foi o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná no julgamento do mandado de segurança n. 158.999-1(20), sendo que na ocasião essa Corte Jurisdicional entendeu ser possível a quitação de parcelamento com valores dos "décimos vencidos".
Ao criar impedimentos à compensação com créditos de precatórios judiciais de décimos vencidos, a Fazenda Pública está descumprindo disposição constitucional, a qual não traz essas limitações ao procedimento, o que denota a inconstitucionalidade da normatização infraconstitucional(21), assim é o entendimento da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.
Saliente-se que em se tratando de discussão acerca de aplicação de norma constitucional, essa matéria será de competência de julgamento do Supremo Tribunal Federal. Esta Corte Jurisdicional já se manifestou favoravelmente ao reconhecimento como válido do direito à compensação constitucional, desde que preservado o limite das parcelas vencidas e obedecida a ordem cronológica prevista no artigo 100 da Constituição Federal(22).
Os direitos dos contribuintes estão espalhados por todo o texto constitucional, do qual o artigo 5º, § 2º(23), não exclui outros direitos que possam embasar a relação entre cidadão e Estado. Assim sendo, é evidente que o artigo que trata da compensação ora discutida (§ 2º art. 78 ADCT) não se resume em uma forma de quitação das dívidas do poder público, mas sim num direito constitucionalmente assegurado ao titular dos créditos de precatório.
Por essa razão e considerando a auto-aplicabilidade desse dispositivo constitucional, esse direito à compensação somente poderia ser restringido ou limitado por uma norma do próprio texto constitucional ou por valores que tenham uma significância constitucional(24), mas jamais pela legislação hierarquicamente inferior.
Notas
(1) RODRIGUES, Sílvio. RODRIGUES, Sílvio. Direito civil – v. 2. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 220
(2) Art. 146. Cabe à lei complementar:
(…)
III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
(…)
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;
(3) Sobre as normas de competência, leciona Sacha Calmon Navarro Coelho: "Conferindo potestades aos sujeitos públicos e privados para produzir normas de comportamento, interpretá-las e aplicá-las voluntariamente, ex officio ou contenciosamente. Estabeleceriam como deveriam ser exercidas tais potestades, sua extensão e limites. Deste tipo são as normas que outorgam competência aos órgãos dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para a produção de atos funcionais legislativos, administrativos e jurisdicionais. De igual modo as normas que investem os particulares de capacidade para praticar e para celebrar atos jurídicos constitutivos (testar, votar, contratar, etc.)". (COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 23)
(4) Valendo-se das palavras de Sacha Calmon, as normas sancionantes ou punitivas "são as normas que estatuem sanções para certas condutas", e mais adiante: "Não praticar um comportamento tem dois sinais: positivo e negativo. Quando um comportamento é punível, é porque o seu contrário é obrigatório. Se se age quando o dever é uma omissão (por exemplo: não matar), a ação de matar é que é a hipótese de punição. Se não se age quando o dever é agir (por exemplo: pagar tributo), o comportamento consistente em não pagar – comportamento omissivo – é que é a hipótese de punição" (Idem, p. 23-24)
(5) "São as normas que obrigam comportamentos, campo de eleição da lógica jurídica. Destinam-se às autoridades e aos particulares. Desse tipo são as normas que estatuem comportamentos positivos e negativos, desde que ocorrentes certos pressupostos. São nucleares, no sentido de posicionar à sua volta o sistema jurídico. Se o Direito teleologicamente busca o controle do meio social, é claro que indica quais são os comportamentos desejáveis" (Idem, p. 23)
(6) Para José Afonso da Silva normas constitucionais de eficácia plena são "aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular" (SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, p. 98-91)
(7) "O indivíduo que cumpre o dever que lhe é imposto por uma norma jurídica, observa a norma jurídica; o indivíduo que, em caso de violação do Direito, efetiva a sanção estatuída na norma jurídica, aplica a norma. Tanto a observância da norma jurídica como a sua aplicação representam uma conduta conforme à norma. Se, por eficácia de uma ordem jurídica, se entende o fato de os indivíduos – cuja conduta ela regula enquanto liga a uma conduta por ela determinada um ato coercitivo, igualmente por ela determinado, a título de sanção – se conduzirem em conformidade com suas normas, então essa eficácia manifesta-se tanto na efetiva observância das normas jurídicas, isto é, no cumprimento dos deveres jurídicos por elas estatuídos, como na aplicação das normas jurídicas, isto é, na efetivação das sanções por elas estatuídas" (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 130)
(8) Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 5 ed. Coimbra: Almedina, 1992, p.232-246
(9) In Diritto Tributario, Milano, 1956 (trad. Italiana da 3ª edição alemã de 1933), pág. 143, apud BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 1972.
(10) Disponível na Internet: http://www.conjur.com.br – Acesso em 20/08/2006
(11) Cf. MELLO, Celso Antonio bandeira. Curso de direito administrativo. 17 ed. 2004, P. 319.
(12) Art. 1º O pedido para a compensação de precatórios próprios ou objeto de cessão, com créditos tributários ou não tributários do Estado do Paraná inscritos em divida ativa, deverá ser preenchido em formulário próprio, conforme modelo constante do Anexo Único deste decreto, e protocolado na Secretaria de Estado da Fazenda, devidamente instruído com: I – prova de homologação judicial do crédito, seja por precatório próprio ou por cessão; II – oficio original expedido pelo Tribunal competente (Tribunal de Justiça, Tribunal Regional do Trabalho ou Tribunal Regional Federal), comprobatório de que a homologação judicial foi inscrita no precatório correspondente; III – cópia atualizada do instrumento constitutivo da empresa que pretende a compensação, assim como outras informações necessárias à formalização do ato. …
§ 2º Somente serão aceitos para imputação no pagamento de tributos inscritos em dívida ativa os precatórios que estiverem registrados em nome do sujeito passivo interessado na imputação, ou que por instrumento público a ele tenham sido cedidos – mesmo que sob a condição de realizar-se a imputação – pelo titular, e que não tiverem recursos pendentes de julgamento com ou sem efeito suspensivo em favor da Fazenda Pública
(13) Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.
…
§ 12. Será considerada não declarada a compensação nas hipóteses:…
II – em que o crédito:
a) seja de terceiros
(14) BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 6 ed. São Paulo: Saraiva. 2006, p. 370
(15) Cf. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 389
(16) "A cessão de créditos é disciplinada pelos artigos 1.065 e seguintes do Código Civil. A teor de tais dispositivos, o credor é livre para ceder seus créditos, "se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei ou a convenção com o devedor." Em se tratando de créditos provenientes de condenações judiciais, existe permissão constitucional expressa, assegurando a cessão dos créditos traduzidos em precatórios (ADCT, Art. 78). Se assim acontece, não faz sentido condicionar a cessão ao consentimento do devedor – tanto mais, quando o devedor é o Estado, vinculado constitucionalmente ao princípio da impessoalidade. II – "O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária." (Súmula 213/STJ) (ROMS Nº 12.735/RO – RELATOR : MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS.)
(17) Voto da Ministra Eliana Calmon no Resp 687761/RS – Rel: Min. Eliana Calmon. Segunda Turma. Julg. 06/12/2005 – DJ 19/12/2005 p. 345 – STJ
(18) EXECUÇÃO FISCAL. PEDIDO DE EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. COMPENSAÇÃO. AUSÊNCIA DE HOMOLOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A compensação tributária é possível, desde que haja estrita observância dos dispositivos legais que a autorizam. 2. A compensação tributária com base em precatórios somente tem lugar se devidamente homologado o crédito, por decisão judicial. 3. Inexistindo esta homologação, obstaculizada está a compensação tributária." (TJPR Agravo de Instrumento nº. 0174075-6 Rel. Des. Rosene Arão de Cristo Pereira. DJ 16/09/2005).
(19) "Não se diga que os decretos são inconstitucionais, por não haver lei a ser regulamentada que autorize a compensação. Isso porque a norma contida no art. 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias é de aplicação imediata e de eficácia plena, sendo desnecessária sua previsão em lei". 5º Câmara Cível – (Agravo de Instrumento n. 3702514 – relator: Leonel Cunha – Julg. 23/08/2006 – DJ: 7194)
(20) No mesmo processo, o Desembargador Sergio Rodrigues, ora relator designado, proferiu seu voto favorável a concessão da segurança, argumentando que "o pagamento de tributos, mediante a utilização de precatórios revestidos do poder liberatório, como aqui se registra, não se identifica como modalidade de compensação, é pagamento à vista, substituindo a moeda circulante pelos precatórios, tanto que um vocábulo, como o outro, deve ser tomado na significação da extinção da obrigação" (TJ-PR – MS Nº 158.999-1, DA COMARCA DE CURITIBA. IMPETRANTE : VIAÇÃO OURO BRANCO S/A. IMPETRADO : SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA. LITIS. PASSIVO : ESTADO DO PARANÁ. RELATOR : DES. SERGIO RODRIGUES).
(21) "Neste caso, se a norma constitucional não impôs qualquer restrição a tal compensação, de forma a atrelá-la a débitos inscritos em dívida ativa, não vejo como se possa admitir que a administração pública queira restringir o alcance do dispositivo legal, a ponto de criar um pressuposto que a Emenda Constitucional não trouxe."(TJ-PR. MANDADO DE SEGURANÇA Nº 125.289-9)
(22) EMENTA: Constitucional. Precatório. Compensação de crédito tributário com débito do estado decorrente de precatório. CF, art. 100, artigo 78, ADCT, introduzido pela EC 30 de 2002. I. Constitucionalidade da Lei 1.142, de 2002, do Estado de Rondônia, que autoriza a compensação de crédito tributário com débito da Fazenda do Estado decorrente de precatório judicial pendente de pagamento, no limite das parcelas vencidas a que se refere o artigo 78 do ADCT/CF, introduzido pela EC 30, de 2000. II. ADI julgada procedente. (ADI 2851-1 rel. Min. Carlos Velloso – 03.12.2004)
(23) CF – Art. 5º…§ 2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
(24) ALEXY, Robert. Colisão de direitos fundamentais e realização de direitos fundamentais no Estado de direito democrático. In Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Renovar, nº 217, p. 67/79, jul/set, 1999.
Helton Kramer Lustoza*
João Paulo Souza Carneiro*