STJ ordena seqüestro de receita
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Fernando Teixeira
Em um precedente inédito, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou o seqüestro de R$ 3 milhões das contas do Estado do Paraná. Com isso, o governo local, até então protegido pelo entendimento do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) contrário ao seqüestro, fica ameaçado por um passivo de R$ 6 bilhões. A construtora CR Almeida conseguiu o seqüestro como parte de um precatório de R$ 32 milhões devido a ela pelo governo. Mas a empresa possui outro precatório bem maior: de R$ 3 bilhões, referente à obra de construção da Ferrovia Central do Paraná. O precedente também é ameaça a outros Estados, assombrados por uma dívida estimada em até R$ 100 bilhões.
O procurador-chefe do Estado do Paraná, Sérgio Boto de Lacerda, ressalta que o processo ainda não transitou em julgado e que recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF) assim que a decisão, tomada pela primeira turma do STJ, for publicada. A decisão é o primeiro precedente do STJ em favor da aplicação do artigo nº 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), segundo o qual cabe o seqüestro de rendas no caso de atraso no pagamento dos décimos – precatórios parcelados em dez anos pela Emenda Constitucional nº 30, de 2000.
Segundo o advogado responsável pela cobrança dos precatórios da CR Almeida, Rafael Mello, não havia ainda pronunciamento do STJ sobre o seqüestro no caso de atraso nos décimos. Os únicos precedentes sobre o tema tratavam da quebra da ordem cronológica, única hipótese tradicionalmente aceita para ordenar o seqüestro. De acordo com o advogado, o precedente é importante porque o STJ é a instância natural para questionar os pedidos de seqüestro negados pelos tribunais locais. Isso porque o responsável por fazer cumprir o pagamento dos precatórios na Justiça local é o presidente do tribunal estadual. E a instância prevista para questionar atos do presidente do tribunal local é, por sua vez, o STJ. Ao Supremo, diz o advogado, cabem recursos de decisões do STJ.
De acordo com o procurador-geral do Paraná, ao determinar o seqüestro devido ao atraso dos décimos, o STJ entra em contradição com o princípio da ordem cronológica, pois há vários estados que ainda estão inadimplentes com os “oitavos” – parcelas remanescentes da moratória de oito anos decretada pela Constituição Federal de 1988. Ainda segundo Sérgio Lacerda, no Supremo o caso do seqüestro ainda está pendente no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) nº 2.362, proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), onde há três votos contra o artigo nº 78 do ADCT.
Segundo o economista Vivaldo Curi, especialista na intermediação e compensação de precatórios vencidos, em São Paulo vários municípios já estão sendo penalizados pela ordem de seqüestro no caso de atraso no pagamento dos décimos. As decisões são comuns no Tribunal de Justiça (TJSP) e a própria capital, inadimplente com as parcelas desde 2003, começa a enfrentar problemas. Contudo, ele avalia que as ações de compensação dos precatórios vencidos deverão manter espaço, pois mesmo pedidos de seqüestro levam de três a quatro anos para serem bem sucedidos.
No Supremo ainda não há decisão do plenário sobre a questão do seqüestro no atraso dos décimos, mas há várias decisões monocráticas que reconhecem essa possibilidade Ela é afastada apenas porque se alega o risco que o efeito multiplicador dessa medida pode ter sobre os cofres públicos. A posição é endossada também pela Procuradoria Geral da República (PGR).
No caso dos precatórios alimentares, este ano também foi de novidades quando à possibilidade de seqüestro. Esse tipo de crédito nunca foi parcelado, tampouco há previsão constitucional de seqüestro. Ainda assim, STJ e Supremo entenderam que é possível bloquear as contas públicas em casos extremos, como para fornecer remédios ou pagar tratamentos. O problema é que estima-se que até 70% dos credores de precatórios alimentares são idosos.